CERN realiza o sonho dos alquimistas ao transformar chumbo em ouro

A descoberta realizada no CERN, o renomado centro europeu de pesquisa nuclear, revela uma surpreendente conexão entre os antigos sonhos da alquimia e a moderna física de partículas. Há cerca de 1.700 anos, no Egito greco-romano, nasceu a ideia de transformar chumbo em ouro utilizando a lendária pedra filosofal. Embora a alquimia não fosse propriamente […]

Mai 12, 2025 - 05:17
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CERN realiza o sonho dos alquimistas ao transformar chumbo em ouro

A descoberta realizada no CERN, o renomado centro europeu de pesquisa nuclear, revela uma surpreendente conexão entre os antigos sonhos da alquimia e a moderna física de partículas. Há cerca de 1.700 anos, no Egito greco-romano, nasceu a ideia de transformar chumbo em ouro utilizando a lendária pedra filosofal. Embora a alquimia não fosse propriamente uma ciência, ela estabeleceu as bases para o que viria a se tornar a química moderna.

De forma surpreendente, o que antes era considerado impossível tornou-se realidade com o advento da química nuclear e da física de partículas. O Grande Colisor de Hádrons (LHC) do CERN funciona hoje como uma espécie de pedra filosofal contemporânea, capaz de transformar núcleos de chumbo em núcleos de ouro durante experimentos no detector Alice.

A alquimia do século XXI

Conforme revelado em comunicado recente do CERN, durante o segundo período de operação do LHC (2015-2018), físicos observaram a produção de aproximadamente 89 mil núcleos de ouro por segundo durante colisões de íons de chumbo. No total, cerca de 86 bilhões de núcleos de ouro foram criados, equivalentes a 29 picogramas – uma quantidade minúscula que impossibilita qualquer uso prático para enriquecimento.

O fenômeno não ocorre por meio de colisões diretas entre os íons de chumbo, que contêm 82 prótons cada. Na verdade, quando dois íons de chumbo se aproximam em velocidades próximas à da luz, seus campos elétricos intensos se achatam devido a efeitos relativísticos, arrancando prótons. Isso transforma os núcleos de chumbo em núcleos de ouro, que possuem 79 prótons.

“Este esbarrão desencadeia um processo chamado dissociação eletromagnética, no qual um fóton, interagindo com um núcleo, pode provocar oscilações na estrutura interna deste, resultando na ejeção de um pequeno número de nêutrons e prótons… Os núcleos de ouro são produzidos nessas colisões a uma energia muito alta e colidem com o tubo do feixe ou com os colimadores do LHC em diversos pontos a jusante, onde se fragmentam imediatamente em prótons, nêutrons e outras partículas. O ouro existe apenas por uma fração ínfima de segundo”, segundo comunicado de imprensa do CERN.

Das ideias antigas à ciência moderna

Este avanço científico estabelece uma curiosa conexão histórica com o pensamento de Auguste Comte — sim, o mesmo que inspirou “Ordem e Progresso” na bandeira do Brasil — que há quase dois séculos reconheceu a importância das ideias alquímicas para o desenvolvimento da ciência. Como Comte afirmou em sua primeira lição: “Sem as atraentes quimeras da astrologia, sem as enérgicas decepções da alquimia, por exemplo, onde teríamos buscado a constância e o ardor necessários para reunir as longas séries de observações e experimentos que, mais tarde, serviram de fundamento para as primeiras teorias positivas de uma e outra classe de fenômenos?”

Ironicamente, a ciência positiva que Comte defendia acabou demonstrando que a transmutação de chumbo em ouro, tão buscada pelos alquimistas, é de fato possível – embora através de métodos completamente diferentes dos imaginados originalmente. Este conhecimento, documentado em um artigo científico publicado na Physical Review Journals e disponível no arXiv, representa uma fascinante convergência entre antigas aspirações e modernas capacidades tecnológicas.

O detector Alice do CERN, inicialmente projetado para investigar o plasma de quarks e glúons – um estado da matéria que teria existido logo após o Big Bang – acabou revelando esta surpreendente capacidade de realizar transmutações que os alquimistas apenas sonhavam ser possíveis.