Perdido reflete sobre amores, TV e temas tão mundanos quanto revolucionários

Leia o faixa a faixa do álbum "Inacreditável Resto de Nossas Vidas", com participação do Pullovers. The post Perdido reflete sobre amores, TV e temas tão mundanos quanto revolucionários appeared first on NOIZE | Música do site à revista.

Abr 22, 2025 - 13:49
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Perdido reflete sobre amores, TV e temas tão mundanos quanto revolucionários

Perdido é a alcunha de Marcelo, que desde 2022 abriu mão do nome de batismo para se lançar ao mundo como sua persona artística. O carioca, que já conta com sete álbuns na discografia, é o que se pode chamar de multi-artista. Sua arte e o que se produz dela são de autoria própria: ele compõe, produz, grava, masteriza, filma, roteriza, edita, finaliza — foi dele a ideia de um resumo do faixa a faixa em vídeo, algo inédito aqui na Noize. “Eu entendi que me produzir era a única forma dele ser feito, já que eu não teria como pagar os custos de um disco. Da parte criativa, foi maravilhoso”, conta.


Desde março, promove o álbum Inacreditável Resto de Nossas Vidas, lançado pela dobra discos e Altafonte. Segundo ele, o disco versa sobre experiências pessoais que soam comuns a muita gente: migrar para São Paulo, ver-se diante de mudanças desafiadoras, se apaixonar por alguém, ficar entediado com as redes sociais ou zapeando a TV, da Globo à MTV. Uma das canções mais singelas, “cachorro pequeno”, é dedicada ao seu fiel companheiro há 12 anos. Todos esses temas são permeados por participações que vão de Danilo Andrade e Lucca Francisco ao Pullovers, banda que recém voltou à ativa.

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O disco vem sendo maturado desde 2023, justamente com o single “Trabalhar na MTV”, que leva a participação da banda paulistana e tem todo aquele tom da geração que aprendeu música vidrado nos programas da emissora. No embalo, vem “30+”, na melhor sequência do disco, refletindo sobre o amadurecimento e o fim de alguns sonhos. Um processo coletivo, afinal de contas, como muitas experiências confessionais neste disco.

“O título [do disco] leva ‘nossas vidas’, pois entendi que não era só sobre o que eu vivo. Eu saquei que, apesar de fazer música, a minha vida é bem comum, provavelmente muito parecida com a sua. Eu trabalho, pago aluguel, assisto TV, e nos fins de semana gosto de ir na praia”, conta Perdido. Leia o faixa a faixa abaixo:

“exatamente bem”: O disco começa com eu conversando comigo mesmo e reconhecendo numa frase, em um mantra que não estou “exatamente bem da cabeça”, sentimento que me assombrou nos últimos tempos e sentimento que permeia várias canções do disco. Adoro a sonoridade que vai da simples voz e violão para um final apoteótico com uma parede sonora. A produção dela foi bem libertadora pois gravei tudo eu mesmo e em casa, “aceitei” inclusive tocar o baixo pela primeira vez, instrumento que eu nunca tinha gravado ainda.


“GLOBO”: Esse canal é a cara do brasil, esse biscoito é a cara do Rio. A gente vive em um tempo “resumista”, consumindo apenas o resumo das coisas: a versão editada, muitas vezes deturpada. Eu vivo em uma cidade muito complexa mas que é conhecida como CIDADE MARAVILHOSA, e ela é, mas não o tempo todo e não para todo mundo. O Danilo Andrade (tecladista do Gil, Jorge Ben) transformou uma canção punk de violão num desbunde de piano elétrico swiguado e que acho muito carioca.


“a gente diz que tá aprendendo a amar”: Escrevi essa canção quando tinha 20 e poucos anos e ela foi gravada pela minha primeira banda (a Hidrocor). A canção ia se chamar “baixo gávea” no tempo em que o baixo gávea era o point da paquera da galera, mas achei muito bairrista na época. Hoje tenho 40 anos, já aprendi uma coisa ou outra sobre amor e tenho orgulho de ser bairrista. Violão com papel higiênico na ponte para abafar o som e deixar os versos soarem bonitos e tristinhos.

“cachorro pequeno”: Na minha cabeça meu cachorro é meu melhor amigo. “Como um cachorro pequeno assim é meu grande amigo?”, são 12 anos dividindo a vida, topando todas, mesmo agora tendo de carregá-lo depois de alguns quilômetros de caminhada. Meu amigo Felipe Parra gravou uma guitarra, percussão e baixo nessa. E, dessa canção, veio o nome do disco, um pedaço do convite: Bora comigo para o inacreditável resto de nossas vidas.

“TRABALHAR NA MTV”: Cresci assistindo MTV, alucinado por videoclipes. Quem inventou juntar música e vídeo? Dei sorte na vida, pude trabalhar no lugar que sempre sonhei. Como esse disco é um grande apanhado de tudo que vivi, chamei meus amigos da Pullovers para gravarem essa comigo. A banda estava ensaiando voltar, entrou no estúdio para fazer essa e não saiu mais de lá, gravaram um disco novo e vou fazer um clipe para eles. Será que vai passar na MTV?

“30+”: Essa música foi um dos singles que vieram antes do lançamento do disco, sobre passar a barreira dos trinta anos. Existe na nossa cultura o termo “30+” para qualificar um filme, uma balada, uma turma como algo para “gente mais velha” mas a real é que você passa dos 30 e provavelmente não tem casa própria, grana ou a vida minimamente arrumada. É aquela sensação de que você foi enganado, que podia ser um jovem porra louca pois ao 30 anos tudo se resolveria. Foi a primeira que produzi do disco.

“bateria social”: Eu sou uma pessoa que tenta ser engraçado para cativar as pessoas. Também tento ser carismático, empático, educado, prestativo, bom ouvinte, já disse engraçado? Tudo isso é bem cansativo. Principalmente se esperam isso de você. Além desse enredo, acho que é a canção com mais sonoridade The Flaming Lips e Pato Fu (as duas grandes referências do som do disco).


“Parati”: Nesse disco trajetória coube essa canção sobre as minhas lembranças com meu pai. Ele foi diagnosticado com Alzheimer em estado inicial e numa inversão de papéis, desta vez, eu quis contar uma historinha para ele dormir: a nossa história, trazendo como herói, o carro que ele teve na minha infância. Gravei todos os instrumentos, editei os samples e fiz um vídeo lúdico com uma parati de brinquedo.

“casal praia”: Tanto eu, quanto a fabi, amamos muito o mar e morar do lado da praia foi um presente para nós. Eu adoro entrar no prédio pelo portão escrito “banhistas”, sendo que descemos um hora atrás só de sunga e chinelo para um mergulho. O cheiro de protetor solar, o cabelo salgado e a bochecha gelada que sinto quando roubo um beijo. Tive o luxuoso auxílio nesta canção, e em outras também, do meu amigo Pedro Serapicos, com suas ideias certeiras e esse baixo lindo.

“neném”: No meio do processo de fazer um disco, engravidamos. Caramba, que alegria. É difícil explicar, tudo muda, as prioridades, o peso das coisas. Escrevi essa canção totalmente imerso nesse amor. Depois de um tempo perdemos a gravidez e eu não sabia mais o que acreditar. Nunca ouvi tanto uma música minha, me ajudou muito a atravessar um luto muito doloroso e que às vezes me engole de novo. O verso: eu te encontro no ano que vem e todos os outros por vir… O que antes era uma certeza se tornou uma esperança. Nessa canção temos baixo do Habacuque Lima e violoncelo do Bruno Serroni.

“castelo de areia”: Única canção não biográfica do disco, a única historinha paralela mas que se passa no mesmo universo. Duas pessoas tentando ficar juntas em meio a tanto estímulo. direto do passado: encontros a tarde na praia, chamadas a cobrar feitas em orelhões… e uma questão que atravessa o tempo: Não sei se te puxo ou te poupo o drama da gente outra vez ter de recomeçar esse castelo de areia.


“Instagram”: Conheci o jovem Lucca Simões num show que ele acompanhava a Lulina, e passei e esbarrar pelo instagram em sua presença em diversos projetos. Ele sempre simpático me mandava por DM um “bora fazer uma música” o que na minha idade é o famoso “vamos marcar”. Em uma dessas investidas eu me rendi e mandei o começo dessa canção para ele e ele completou os versos e arranjou tudo de um jeito muito lindo. As redes sociais e seus impactos são um personagem desse disco, aquele melhor amigo que da metade para frente vira vilão do filme.

“trilha sonora”: Uma declaração de amor hoje em dia. Você não escuta música nunca, como eu vou ser sua trilha sonora? Mas uma que sai do dia a dia aqui de casa direto para seus fones. Um casal formado por alguém que vê stories sem som e alguém que canta cada coisa que vai fazer, enquanto está fazendo. Fiz um arranjo bem minimalista completado pelo violoncelo do Serroni.


“tão galera”: Eu amo a Ludmilla e em Sintomas de Prazer tem um corinho que fica Uó-ó (Lud), eu adoro, quis ter isso nessa canção, um coro cantando meu nome, risos, para dar essa onda de uma turma. Essa “turma” seriam as pessoas que ficam esperando que eu vá nos eventos sociais quanto na verdade tô deprimido e travado em casa. É uma canção irmã de “bateria social” e fala sobre essa expectativa dos outros sobre uma pessoa “extrovertida”.

“e ai ai?”: Um questionamento sobre esse momento, em que a inteligência artificial parece ser uma ferramenta de democratização das artes, fazendo com que imagens, vídeos e músicas sejam gerados em segundos através de um comando de texto… Escrevi a letra e usei a ferramenta Suno para gerar a canção, na época não tinha sotaque do Brasil e a voz que a AI gerou parece uma gringa cantando em Português, dando um ar internacional para esse Feat. Como todo mundo, tenho muitas dúvidas sobre o uso de AI nas artes. Embarcamos todos nessa nave da Xuxa sem saber onde vai parar e nem os impactos que isso terá.

“cachos”: Se fiz música para meu pai, para não ter ciúmes, fiz uma para minha mãe. Dela herdei meus cachos, dela herdei tanta coisa. Do carinho que ela teve comigo e que pretendo ter com meus filhos, do amor que ela tem comigo e que pretendo retribuir, sempre. Arranjo minimalista e vocalização “tchuru tchuru tchutchu” inspirada no Buchecha e a turma do funk carioca que tanto ouvi.

“dia GRANDE”: Um “dia grande” não é um grande dia. escrevi no ônibus entre o Rio e São Paulo, morrendo de saudades da Fabi (minha companheira), do apoio dela, do que somos juntos, e de como eu sou quando não estamos juntos. Não me sinto inteiro, me sinto partido. Eram dias grandes, longos, eu estava indo e voltando para visitar minha avó, eu sabia que ela estava partindo e eu tinha de ir lá assim: partido. O ser humano é resiliente e atravessa dias grandes mesmo sem estar inteiro.

“aqui”: Me despeço com esta canção. minha forma de dizer que é muito legal ser hiper criativo e sensível, mas também pode ser muito difícil. Difícil de se encaixar, de não se deprimir com tanta coisa horrível, de conseguir focar em tarefas diárias, de participar da vida das outras pessoas e não se perder na sua imaginação.

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