Abstenção entre os jovens é elevada, mas há quem contrarie a tendência

A baixa participação eleitoral dos jovens em eleições em Portugal é um alerta recorrente, mas há quem contrarie a tendência. Os jovens ouvidos pelo ECO recusam qualquer cansaço pela ida às urnas, mesmo com três eleições à vista em menos de um ano (legislativas, autárquicas e presidenciais), mas avisam os líderes partidários que há temas […]

Mai 18, 2025 - 03:24
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Abstenção entre os jovens é elevada, mas há quem contrarie a tendência

A baixa participação eleitoral dos jovens em eleições em Portugal é um alerta recorrente, mas há quem contrarie a tendência. Os jovens ouvidos pelo ECO recusam qualquer cansaço pela ida às urnas, mesmo com três eleições à vista em menos de um ano (legislativas, autárquicas e presidenciais), mas avisam os líderes partidários que há temas que querem ver mais explorados: habitação, educação, saúde e emprego lideram.

Tal como em qualquer democracia, os jovens em Portugal votam menos que os mais velhos. Esse menor interesse manifesta-se em todo o tipo de eleições. Contudo, nas últimas eleições, a relação entre a idade e a participação eleitoral tem vindo a diminuir consideravelmente“, destaca Pedro Magalhães, investigador coordenador do ICS-ULisboa, em declarações ao ECO.

Um inquérito levado a cabo pelo projeto de investigação “50 Anos de Democracia em Portugal – Aspirações e Práticas Democráticas Continuidades e Mudanças Geracionais” do Instituto Superior de Ciências Sociais e Politicas da Universidade de Lisboa, revela que, nas legislativas de 2022, apenas 9% dos jovens votou, contra 57,3% dos eleitores com idade compreendida entre 35 e 64 anos e 33,7% dos mais velhos.

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A participação eleitoral tende a aumentar com a idade pelo que a abstenção mais elevada entre os jovens não é algo de extraordinário. No caso específico português, o envelhecimento do eleitorado e o facto de as campanhas serem cada vez mais concentradas na tentativa de captar o voto dos pensionistas pode acentuar o desinteresse de muitos jovens“, assinala André Azevedo Alves, professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa, em declarações ao ECO.

Pedro Magalhães atribui parte do fenómeno ao facto de as eleições ganharem “máxima importância para quem tem máxima autonomia e responsabilidades pessoais e familiares: emprego, família, pagar impostos“.

“Na medida em que parte dos jovens ainda não estará nessa fase do seu ciclo de vida, é natural que aquilo que se discute numa campanha eleitoral tenha menos relevância. Por outro lado, os mais velhos tiveram mais tempo para desenvolverem afinidades com as forças políticas existentes, uma identificação com os partidos que os estimula a votar“, acrescenta o politólogo.

Porém, há quem contrarie a tendência. Dos 11 jovens ouvidos pelo ECO que garantem que irão às urnas no domingo a maioria justifica com o facto de ser um exercício de cidadania. Sofia Amaral, natural de Viseu, é um desses casos. Com 18 anos irá votar pela primeira vez nestas legislativas. “Tenciono ir porque votar é um direito e um dever cívico“, afirma.

É também esta a razão que faz Mariana Quelha, com 25 anos, a colocar uma cruz no boletim de voto. “Considero que votar é um dever cívico fundamental e uma das poucas formas diretas de influenciar as decisões políticas do país. Ainda que nem sempre me identifique plenamente com os partidos ou candidatos, acredito que a abstenção representa uma delegação da minha voz aos outros”, argumenta a psicóloga de Braga.

Mais a Sul, em Portimão, mas com uma posição semelhante ouve-se Margarida Palma. “Tenciono votar porque considero que é preciso ter um papel ativo na escolha do líder do nosso país”, diz a jovem de 19 anos, a quem, o facto de existirem três eleições importantes num só ano não esmorece o interesse. “Deixa-me mais interessada na política nacional porque considero que é um momento crítico para o país e é preciso estar mais atenta ao que se passa“, aponta.

Sérgio Almeida, de 20 anos, tenciona votar porque “é um dever cívico e uma forma essencial de participar na vida democrática do país”. “Cada voto conta e pode fazer a diferença no rumo que Portugal toma nos próximos anos“, afirma o jovem de Santa Maria da Feira, que acompanhou alguns debates.

Achei que foram úteis para perceber melhor as propostas dos partidos e a forma como os candidatos pensam e comunicam. Embora nem sempre tragam novidades, ajudam a esclarecer posições e prioridades“, considera.

Por seu lado, Mariana Quelha considera que os frente-a-frente “foram úteis para compreender as posições dos partidos em relação a temas-chave, embora, por vezes, se tenham assemelhado mais a confrontos pessoais do que a verdadeiras discussões de ideias“. “Ainda assim, contribuíram para reforçar a minha intenção de voto”, assinala.

Também Gonçalo, de 20 anos, natural de Abrantes, acompanhou quase todos os debates e considerou esclarecedores os que viu. No que toca a influência na decisão de voto, manteve a mesma opinião que tinha antes dos debates.

No entanto, há quem não tenha sintonizado a televisão para isso. “Não, por causa dos trabalhos da faculdade e porque dão mais destaque aos confrontos, em vez de ideias“, assinala Beatriz Sales, com 21 anos, de Lisboa. Na mesma linha, Afonso Ferreira, natural de Ansião, com 21 anos, considera que “apesar do conceito ser interessante e gerar conversas entre as famílias e a população geral, muitas vezes não são focados nas medidas de cada partido e mais no ataque de um partido ao outro, o que acaba por diminuir a possibilidade de dar mais informações importantes aos espectadores“.

“Em geral, não acho que influenciem muito a minha decisão de voto”, afirma. A mesma posição posição tem Hugo Gomes, natural da capital portuguesa. “Acompanhei alguns. Não achei assim muito esclarecedor acerca do que iriam fazer mas mais sobre o que os outros fizeram de mal. A minha decisão continuou a mesma“, diz o jovem de 18 anos, que vai votar pela primeira vez este domingo.

Mais de 333 mil eleitores pediram para votar para as legislativas a 11 de maio, o maior número de sempre a decidir exercer o seu direito de voto antecipadamente desde que essa modalidade foi instituída. TIAGO PETINGA/LUSATIAGO PETINGA/LUSA

Ainda assim, são vários os temas sobre os quais os jovens querem que os políticos lhes falem mais. Habitação, educação, saúde e emprego são as respostas mais ouvidas pelo ECO. “O futuro dos jovens e a educação”, aponta, Cátia Aresta, de 20 anos, natural de Moura. “Gostaria de ver abordados mais temas sobre habitação com medidas concretas”, acrescenta Afonso Ferreira. ⁠

“Mais propostas sobre habitação acessível, emprego jovem, saúde mental e medidas concretas para combater as alterações climáticas”, é a resposta de Beatriz Sales. Por seu lado, Joaquina Abreu, de 24 anos e natural de Braga, como jovem que iniciou há pouco tempo o percurso profissional, preocupa-lhe, essencialmente, temas que afetam diretamente a sua geração e o futuro: “as condições de trabalho e necessidade de qualificação constante; o acesso realista à habitação, alinhada com a capacidade financeira; a maior valorização da saúde mental e bem-estar“, elenca.

O politólogo Pedro Magalhães realça que “independentemente da tendência positiva de diminuição da abstenção dos últimos anos, a repetição de eleições num curto espaço de tempo gera fadiga e desinteresse“. Por sua vez, André Azevedo Alves tem uma posição ligeiramente distinta. “Não necessariamente porque são âmbitos eleitorais distintos. Mas a elevada frequência de eleições e em particular a repetição de legislativas em tão pouco tempo pode gerar saturação em alguns segmentos do eleitorado”, refere.

Habitação, educação, saúde e emprego são os temas sobre os quais os jovens ouvidos pelo ECO mais querem que os políticos lhes falem.

Entre os jovens ouvidos pelo ECO, Hugo Gomes nega que três eleições em menos de um ano (legislativas, autárquicas e presidenciais) lhe provoquem desinteresse. “Isso e facto de eu me ter tornado maior de idade fizeram-me despertar um maior interesse na política”, indica.

Joaquina Abreu também garante que fica “mais interessada” em acompanhar os temas. “Espero que esta frequência de eleições represente uma oportunidade para envolver mais os cidadãos, especialmente os jovens, na medida em que estimula uma maior reflexão. Por outro lado, reconheço que o excesso de ciclos eleitorais, se aliado à falta de mudanças concretas, possa causar alguma desmotivação e desilusão“, aponta.

Uma posição partilhada por Sérgio Almeida. “Deixa-me, se calhar, até mais interessado. Este ciclo intenso de eleições obriga-nos a estar mais atentos e envolvidos. Mesmo que por vezes pareça cansativo, é uma oportunidade para refletir sobre o país que temos e o país que queremos construir“, responde.

Apesar dos jovens ouvidos pelo ECO contrariarem a tendência de abstenção entre os jovens, o politólogo André Azevedo Alves assinala que esta “deve ser uma preocupação, sim, até porque os jovens de hoje serão o eleitorado maduro de amanhã – ainda que saibamos também que a orientação de voto muda frequentemente com a idade“.

Para o politólogo Pedro Magalhães, autor do estudo “A Participação Política da Juventude em Portugal“, como os últimos anos mostram, “a abstenção dos jovens pode acabar por ser contrariada pelo próprio sistema partidário“.

Se permanecer congelado ao longo do tempo, é natural que os jovens se afastem. Se se transformar, dando lugar a novos partidos com novas propostas, é natural que os jovens se revejam mais na oferta política. É o que tem acontecido nos últimos anos“, adverte.

O estudo de que o investigador do ICS é autor e cuja análise se debruça entre os anos de 2022 e 2019, concluiu que os jovens em geral têm participado menos do que outros jovens da Europa nas eleições em Portugal. “Há menos portugueses entre os 15 (18 para o voto) e os 24 anos a participarem politicamente, na comparação com os seus congéneres europeus“, pode ler-se no documento sobre a comparação que é feita com Alemanha, Bélgica, Eslovénia, Espanha, Finlândia, França, Hungria, Irlanda, Noruega, Países Baixos, Polónia, Reino Unido, Suécia, Suíça e Portugal.