Evento raro revela buraco negro fora do normal devorando estrela

Buracos negros supermassivos costumam ocupar o centro das galáxias, mas este é diferente – ele foi visto se banqueteando muito longe do núcleo galáctico O post Evento raro revela buraco negro fora do normal devorando estrela apareceu primeiro em Olhar Digital.

Mai 14, 2025 - 00:14
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Evento raro revela buraco negro fora do normal devorando estrela

Um artigo aceito para publicação pelo periódico científico The Astrophysical Journal Letters descreve uma descoberta inédita no Universo: um buraco negro supermassivo devorando uma estrela longe do centro da galáxia hospedeira.

Buracos negros supermassivos costumam ocupar a região central das galáxias, onde exercem forte influência gravitacional sobre tudo ao redor. Neste caso, no entanto, o buraco negro estava “fora do lugar” – cerca de 2.600 anos-luz distante do núcleo da galáxia que habita.

De acordo com um comunicado da NASA, a presença desse monstro cósmico só foi revelada por causa de um fenômeno raro e violento: um evento de perturbação por maré (TDE, na sigla em inglês). Nele, uma estrela foi destruída pela força gravitacional do buraco negro, gerando uma explosão de luz visível da Terra.

Essa luz foi tão intensa quanto a de uma supernova, mas com características diferentes. Foi isso que permitiu aos cientistas perceber que não se tratava da morte de uma estrela comum, mas sim da ação de um buraco negro devorando uma estrela azarada.

Seis capturas de um evento de ruptura de maré em torno de um buraco negro supermassivo mostram o seguinte: 1) um buraco negro supermassivo à deriva dentro de uma galáxia, cuja presença só é detectável por lentes gravitacionais; 2) uma estrela rebelde é varrida pela intensa atração gravitacional do buraco negro; 3) a estrela é “espaguetificada” por efeitos de maré gravitacional; 4) os restos da estrela formam um disco ao redor do buraco negro; 5) há um período de acreção de buracos negros, derramando radiação em todo o espectro eletromagnético, de raios-X a comprimentos de onda de rádio; e 6) a galáxia hospedeira, vista de longe, contém um flash brilhante de energia que é deslocado do núcleo da galáxia, onde habita um buraco negro ainda mais massivo. Crédito: NASA, ESA, STScI, Ralf Crawford (STScI)

Denominado AT2024tvd, o evento foi observado por vários equipamentos em órbita, como o Telescópio Espacial Hubble e o Observatório de Raios-X Chandra, ambos da NASA. Também participaram o Very Large Array (VLZ) e o Zwicky Transient Facility (ZTF), telescópios em solo do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech).

Essas observações mostraram que o buraco negro responsável pela destruição da estrela não está localizado no centro da galáxia, como seria esperado. Essa é a primeira vez que um TDE é registrado em um buraco negro deslocado, também chamado de “errante”.

A galáxia onde tudo isso aconteceu fica a 600 milhões de anos-luz da Terra. E o buraco negro envolvido tem uma massa equivalente a um milhão de sóis. Mesmo assim, ele passou despercebido até este evento chamar a atenção dos astrônomos.

Galáxia também tem buraco negro central

Na mesma galáxia, no entanto, há outro buraco negro muito maior – com 100 milhões de vezes a massa do Sol – posicionado no centro, como se espera. Ou seja, há dois buracos negros supermassivos na mesma galáxia, mas em posições diferentes. O maior está ativo, consumindo gás e liberando energia. Já o menor, que causou o TDE, estava “adormecido” até capturar a estrela. Quando isso aconteceu, ele liberou uma enorme quantidade de radiação visível e ultravioleta.

Para a a pesquisadora Yuhan Yao, da Universidade da Califórnia em Berkeley, líder do estudo, esse evento abre uma nova janela para localizar buracos negros ocultos no Universo. 

Imagem registrada pelo Telescópio Espacial Hubble de uma galáxia localizada a 600 milhões de anos-luz de distância que abriga a assinatura reveladora de um buraco negro supermassivo itinerante. Crédito: NASA, ESA, STScI, Yuhan Yao (UC Berkeley); Processamento de imagem: Joseph DePasquale (STScI)

Segundo ela, os cientistas podem estar diante de uma nova classe de buracos negros. “Este é o primeiro TDE de deslocamento detectado por levantamentos ópticos do céu. Isso mostra que há uma população escondida de buracos negros errantes, e que agora temos um jeito de encontrá-los”.

Durante o TDE, a estrela foi esticada até se despedaçar – processo conhecido informalmente como “espaguetificação”. Os pedaços foram puxados para uma órbita ao redor do buraco negro, gerando calor e luz visíveis para nossos telescópios.

A análise da explosão mostrou sinais claros de elementos como hidrogênio, hélio, carbono, nitrogênio e silício. Esses padrões ajudaram os pesquisadores a confirmar que o brilho não veio de uma supernova, mas sim de um buraco negro devorando uma estrela.

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Como foi confirmada a descoberta

O primeiro a registrar o evento foi o ZTF, com seu telescópio de 1,2 metro no Observatório Palomar, que varre todo o céu do hemisfério norte a cada dois dias em busca de fenômenos passageiros como esse.

Para verificar se o buraco negro estava mesmo fora do centro da galáxia, os cientistas usaram dados dos bancos de pesquisa Pan-STARRS, Sloan Digital Sky Survey e DESI Legacy Imaging Survey. Todos indicaram que a explosão estava deslocada.

Depois, o Chandra confirmou que os raios-X da explosão vinham da mesma região. E, por fim, o Hubble conseguiu localizar o ponto exato da emissão, com precisão suficiente para eliminar dúvidas sobre sua posição.

A luz do TDE era mais azul que o restante da galáxia, indicando temperaturas muito altas. Isso também ajudou a identificar sua origem. A resolução do Hubble foi essencial para separar esse brilho do fundo da galáxia.

Concepção artística de um evento de interrupção das marés (TDE), uma estrela sendo despedaçada pela poderosa gravidade de um buraco negro supermassivo. Crédito: Sophia Dagnello – NRAO/AUI/NSF

Fenômeno revela população invisível de buracos negros errantes

Mas, como esse buraco negro foi parar fora do centro da galáxia? Uma hipótese é que ele tenha sido expulso durante uma interação com outros dois buracos negros – um fenômeno conhecido como “interação de três corpos”.

Nesse tipo de colisão, o buraco negro com menor massa pode ser lançado para fora do núcleo. É possível que o buraco negro deslocado esteja apenas orbitando o centro, sem estar preso gravitacionalmente ao buraco negro maior.

Outra possibilidade é que ele seja o remanescente de uma galáxia menor que se fundiu com a galáxia atual há bilhões de anos. Essa fusão teria deixado para trás o buraco negro menor, que só agora deu sinais de vida.

A pesquisadora Erica Hammerstein, também da UC Berkeley, analisou imagens do Hubble em busca de vestígios de fusão galáctica. Ela não encontrou evidências claras, mas disse que a presença de dois buracos negros na mesma galáxia sugere uma fusão passada.

Fusões entre galáxias são eventos comuns no Universo e costumam aumentar a frequência de TDEs. Isso porque elas perturbam a trajetória das estrelas, empurrando algumas para perto dos buracos negros.

O que torna esse evento especial é que ele revela uma população invisível de buracos negros errantes, que até agora eram apenas teóricos. Eles não emitem luz por conta própria e só podem ser descobertos quando interagem com algo, como uma estrela.

Futuros observatórios, como o telescópio Vera C. Rubin, em construção no Chile, e o Telescópio Espacial Nancy Grace Roman, devem ajudar a encontrar mais eventos assim. Juntos com o Hubble e o Chandra, eles vão permitir estudar melhor esses buracos negros escondidos.

Essas descobertas podem mudar o modo como entendemos a evolução das galáxias e o papel dos buracos negros no Universo. E tudo começou com um clarão inesperado vindo de uma estrela que foi longe demais.

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