Adolescência digital e algoritmos: os riscos do futuro conectado

A série Adolescência, que fez sucesso recentemente na Netflix ao tratar da espécie de vida paralela que crianças e, principalmente, jovens levam nas redes sociais, colocou holofote sobre problemas que nem sempre os pais e a sociedade como um todo veem. Sob esse cenário, João Archegas, coordenador do Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS Rio) e professor de direito na FAE, abordou o tema “Impacto do algoritmo – reflexões sobre adolescência digital”, em sua palestra... O post Adolescência digital e algoritmos: os riscos do futuro conectado apareceu primeiro em Meio e Mensagem - Marketing, Mídia e Comunicação.

Mai 18, 2025 - 03:11
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Adolescência digital e algoritmos: os riscos do futuro conectado

Com seus cérebros ainda em formação, adolescentes não devem ser tratados como adultos no mundo digital, alertou Archegas (Crédito: Eduardo Lopes/ maquinadafoto)

A série Adolescência, que fez sucesso recentemente na Netflix ao tratar da espécie de vida paralela que crianças e, principalmente, jovens levam nas redes sociais, colocou holofote sobre problemas que nem sempre os pais e a sociedade como um todo veem. Sob esse cenário, João Archegas, coordenador do Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS Rio) e professor de direito na FAE, abordou o tema “Impacto do algoritmo – reflexões sobre adolescência digital”, em sua palestra no MNB.

Ele diz ter começado a perceber a gravidade do problema em sala de aula, quando, há dois anos, foi abordado por uma aluna adolescente que lhe confessou só conseguir prestar atenção à aula se estivesse, ao mesmo tempo, dando scroll em vídeos. O palestrante também chamou atenção ao fato de que dos presentes no auditório do Tivoli Ecoresort, em 40 minutos de palestra, 50% das pessoas em algum momento iriam olhar o celular.

A competição pela atenção que esse tipo de aparelho provoca foi descrita pelo professor como um “buraco negro mental”. Ele citou pesquisa da Universidade do Texas em que um teste era aplicado para três grupos de pessoas, sendo que um poderia deixar o celular sobre a mesa, outro, no bolso e o terceiro, somente em outra sala, e os resultados mostraram que a simples presença ou não do aparelho mudou o desempenho nas provas. Os que estavam com ele no bolso tiveram nota média e os que deixaram em outra sala foram os que tiveram melhor desempenho.

“A janela de atenção das pessoas vem diminuindo. Na geração dos meus pais, era de um minuto e meio. Na minha, de 40 segundos, e na da minha irmã, com 11 anos de idade, de apenas 15 segundos”, ressaltou.

Formação ou deformação

O problema na relação dos jovens com a tecnologia, alerta Archegas é que o córtex pré-frontal – área do cérebro responsável por controlar impulsos, organização e planejamento – ainda está em fase de desenvolvimento até os 21, 25 anos. Logo, adolescentes não têm os mecanismos de controle e julgamento para lidar com determinados conteúdos.

E o problema maior por trás do celular, pontua o especialista, é o algoritmo, que é sujeito a objetivos econômicos, de marketing etc, e manipulam o engajamento nas redes.

Apresentando dados de 2024, o professor disse que 93% das pessoas entre nove e 17 anos usam internet no Brasil (em 2014 – eram 77%) e 76% delas estão em redes sociais, sendo que psicólogos, baseados em estudos, não recomendam a presença de jovens nas redes sociais antes dos 16 anos.

Outro ponto a que Archegas chamou atenção é que 24% das crianças e adolescentes conectados no Brasil já tentaram ficar menos tempo na internet, mas disseram não ter conseguido e 22% admitiram já ficaram vendo conteúdo pelo qual, no fundo, nem tinham interesse.

“Menores não são adultos”, foi uma frase repetida mais de uma vez pelo pesquisador, para alertar ao fato de que tecnologias que ajudam os cidadãos adultos em suas vidas cotidianas podem prejudicar o desenvolvimento saudável de crianças e adolescentes.

Assim, para ele, os desafios se apresentam em três camadas: verificação de idade (facilmente burlável), controle parental e design de plataforma.

Apesar de as próprias redes sociais terem estabelecido o limite mínimo de 13 anos, 23% das crianças de nove e dez anos têm conta no Instagram, por exemplo. E depois que entram é que o problema começa. E para combater a insegurança no ambiente virtual, um freio é o controle parental (filtros de conteúdo, apps e site), limite de tempo, restrição publicidade e controle de solicitação de contato.  Mas isso ainda gera debates sobre privacidade.

Outro ponto que para Archegas é altamente importante é o design de plataforma, que deveria ser específico para a faixa etária, pois impacta diretamente no comportamento do usuário, especialmente por recursos como autoplay e o scroll infinito. Esses mecanismos, definidos como “modelo de anzol”, alertou, trabalham com um gatilho externo (como uma notificação), que leva a uma ação (entrar no app ou plataforma, que promete uma recompensa variável (só quando clicar acontece algo e, com isso, gera hábito) e investimentos, que perpetuam o ciclo.

Riscos atuais e futuros

Além de problemas já em curso, o professor também alertou para “riscos do futuro”, principalmente, jovens interagindo com chatbots, numa espécie de dependência emocional, no nível de substituir as interações humanas. O problema é que os interlocutores digitais “sob medida” para preencher o vazio emocional de quem tem poucos vínculos reais, oferecidos por plataformas como a Character.ai, não têm discernimento. Quando um adolescente na Florida que vinha se comunicando com um chatbot que simulava um personagem de série de TV passou a mostrar tendências de depressão e desejo de suicídio, as respostas que recebeu não foram de alerta, ajuda ou prevenção do ato, mas de conformidade e reforço a algo que ele, efetivamente, realizou, lembrou o professor do ITS. Por isso, hoje, a mãe do adolescente trava batalha contra esse tipo de tecnologia que trabalha com métricas de engajamento e não de bem-estar.

“Não estou aqui para demonizar a tecnologia, mas para falar que menores não são adultos. E vocês precisam voltar para seus trabalhos com isso na cabeça”, incentivou Archegas, ao final de sua palestra. Segundo ele, isso precisa ser levado em consideração pelo simples motivo de que a tecnologia trouxe muitas coisas boas para nossas vidas, mas a questão é qual tecnologia apresentar a qual público. “Menores, por não serem adultos, não deveriam ter acesso às mesmas tecnologias que nós temos. Esse é o debate da nossa geração e precisamos discutir cada vez mais”, concluiu.

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