David Thomas, lendário vocalista do Pere Ubu, morre aos 71 anos

Ícone do pós-punk, Thomas faleceu em sua casa na Inglaterra após longa doença. Músicos prometem finalizar último álbum e autobiografia

Abr 29, 2025 - 00:17
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David Thomas, lendário vocalista do Pere Ubu, morre aos 71 anos

O pós-punk perde uma de suas figuras mais singulares. David Thomas, o icônico vocalista da banda Pere Ubu, faleceu na quarta-feira (23/4) aos 71 anos em sua casa em Brighton, Inglaterra, após uma longa batalha contra a doença. A notícia foi confirmada por seus companheiros de banda, que compartilharam uma mensagem carregada de emoção e com uma pitada do humor peculiar de Thomas,

“O MC5 estava tocando no rádio. Ele será levado de volta para sua casa, a fazenda na Pensilvânia, onde insistiu que deveria ser ‘jogado no celeiro’.”

Do underground de Cleveland ao som experimental do Pere Ubu

Nascido em Miami, mas com sua identidade musical forjada no cenário industrial de Cleveland, Thomas deixou sua marca ao formar o efêmero grupo proto-punk Rocket from the Tombs em 1974. No ano seguinte, das cinzas do Rocket, emergiu o Pere Ubu, uma banda seminal e ruidosa, fruto da parceria entre David Thomas e Peter Laughner. Inspirado pela peça “Ubu Rei” de Alfred Jarry, o grupo logo se tornou sinônimo de uma sonoridade dissonante e provocadora.

“Era um nome que não significaria nada para 95% do público”, refletiu Thomas certa vez. “Eu queria criar uma banda na qual Herman Melville, William Faulkner ou Raymond Chandler gostariam de estar.” Em outra ocasião, declarou: “Minha ambição para o Pere Ubu era ser descoberto em uma caixa de discos usados em 30 anos.”

O Pere Ubu cunhou para seu som o termo “avant-garage”, uma fusão de ruídos, batidas metálicas e um canto áspero característico, permeado por sintetizadores, guitarras distorcidas e a voz inconfundível de Thomas. O álbum “The Modern Dance”, de 1978, impactou profundamente o underground, lançando sementes que influenciaram bandas como Joy Division, Gang of Four e Bauhaus logo em seguida, mas também Pixies, Interpol e Primus.

A visão de Thomas sobre o punk e o legado do Pere Ubu

Apesar de sua proximidade com o punk, Thomas rejeitava rótulos, explorando desde riffs agressivos até o avant-garde esotérico e canções folclóricas marítimas.

“Ou tudo que eu fiz é punk ou nada é”, ironizou Thomas. “’Punk’ não significa nada. É uma dessas palavras para as quais cada um tem sua própria definição. Para mim, ‘punk’ era um clichê insípido projetado para vender mercadoria para caipiras crédulos em culturas confusas e decadentes. Isso é o que ‘punk’ é para mim. Pere Ubu e Rocket: nós éramos bandas de rock.”

Mais do que um simples vocalista, Thomas era uma figura intensa e peculiar, cujas letras abordavam temas como desilusão amorosa, os horrores da guerra e a desobediência deliberada. Ele realizou palestras, conduziu óperas e percorreu palcos ao lado de músicos talentosos e excêntricos. A influência do Pere Ubu é inegável em bandas contemporâneas, fazendo com seu seu legado permaneça marcante, desafiador e deliciosamente fora do comum.

Projetos paralelos e o derradeiro álbum

Mente inquieta e multifacetada, Thomas mantinha diversos projetos em paralelo, incluindo palestras em universidades, com o tema “A Geografia do Som na Era Magnética”, a ópera “Mirror Man” e a produção teatral “Shockheaded Peter”.

O prolífico artista também lançou inúmeros álbuns solo, incluindo um trabalho inédito que ele sabia ser o seu último.

Banda promete honrar o legado com lançamentos póstumos

“Nós nos dedicaremos a continuar mixando e finalizando o [último] álbum para que sua música derradeira esteja disponível para todos”, comunicou a banda. “Além disso, ele deixou instruções para que o trabalho de catalogação de todas as gravações de shows ao vivo continue através da página oficial do Bandcamp. Sua autobiografia estava quase concluída e nós a finalizaremos por ele.”