Averiguação da Ordem dos Advogados à Spinumviva não devia ter sido pública, diz Bastonário
João Massano, que toma posse como bastonário dos advogados a 8 de maio, em entrevista à Lusa defendeu que o processo de averiguações deveria ter sido aberto, como foi, “mas não deveria ter sido dado conhecimento público” da investigação relacionada com a ilicitude da atividade da empresa familiar de Luís Montenegro, a Spinumviva.


O bastonário dos advogados eleito não teria comunicado publicamente a abertura de um processo de averiguações por eventual procuradoria ilícita à empresa do primeiro-ministro sem qualquer confirmação de suspeitas, acusando a bastonária cessante de aproveitamento eleitoral.
João Massano, que toma posse como bastonário dos advogados a 8 de maio, em entrevista à Lusa defendeu que o processo de averiguações deveria ter sido aberto, como foi, “mas não deveria ter sido dado conhecimento público” da investigação relacionada com a ilicitude da atividade da empresa familiar de Luís Montenegro, a Spinumviva.
“Nós não podemos entrar na campanha política, nem podemos tomar esse partido, exceto se houver confirmação do facto. Aí já digo quase como o senhor Procurador-Geral da República, se tiver que ser naquele momento a busca, porque há um inconveniente ou uma desvantagem qualquer, tem que ser feita, seja em período eleitoral ou fora dele. Agora, se há uma mera suspeita que não é confirmada e que até temos um outro órgão da Ordem a dizer que não vê indícios, se calhar o bom senso aconselha a que nada se diga publicamente, se espere pelo fim do processo e só depois se diga alguma coisa”, disse.
Para João Massano houve nesta situação, em que a bastonária cessante, Fernanda de Almeida Pinheiro, decidiu anunciar a abertura de um processo de averiguações na Ordem dos Advogados (OA) “um aproveitamento” eleitoral na campanha para a OA, que considera prejudicial aos interesses da classe.
Rejeitou ainda que a decisão de não comunicar a abertura de uma averiguação pudesse ser entendida como uma proteção ao processo e ao próprio primeiro-ministro, estabelecendo um paralelo com o caso do parágrafo no comunicado da Procuradoria-Geral da República que implicou o então primeiro-ministro António Costa na Operação Influencer.
“Acho que nós temos que ter isenção e objetividade no que fazemos. Sabendo nós as consequências dos atos que praticamos, temos que os ponderar”, disse.
João Massano considerou “um perigo” a ideia constante do programa eleitoral do PS para criação de um novo órgão fiscalização das escutas judiciais, composto por elementos da OA e dos conselhos superiores da magistratura, recordando que o sistema já prevê que as escutas sejam fiscalizadas e rejeitando a criação de “órgãos e mais órgãos” assentes na ideia de fiscalizar quem fiscaliza ou do “polícia do polícia”.
“Isto parece-me um bocadinho perigoso. Acho que não é por aí o caminho. Acho que o caminho é verificar o que é que falha no sistema, porque, muitas das vezes, nós tomamos decisões, quer em matéria legislativa quer até na criação de órgãos, sem perceber o que falha”, disse, defendendo que mais do que novos órgãos para fiscalizar juízes, o poder político devia preocupar-se em perceber porque é que “quem fiscalizou não fiscalizou, ou fiscalizou de forma deficiente”.
João Massano manifestou-se ainda contra alterações legislativas na base de um único processo, a Operação Marquês, como as propostas para aumentar a celeridade judicial vindas do Conselho Superior da Magistratura (CSM), questionando se não se está “a criar legislação que crie uma diferença entre os processos de primeira, que são os que aparecem nos telejornais e na comunicação, e os processos de segunda, que são os do cidadão comum”.
“Eu não quero caminhar para uma justiça para ricos, que já existe na prática muitas das vezes, mas não deve ser a própria legislação a criar essa distinção e isso é que muitas vezes me parece que é a tentação de muitos legisladores”, disse.
Sobre o processo de regulamentação do ‘lobbying’, que ficou pendente com a queda do Governo e dissolução do parlamento, João Massano espera que se avance rapidamente, por uma questão de transparência, manifestando-se “um bocadinho perplexo” que as pessoas fiquem admiradas por saberem que “as pessoas falam umas com as outras” para agilizar procedimentos, sobretudo em projetos e investimentos de potencial interesse nacional.
“A única forma de avançar em termos éticos e de transparência é criar um regime de ‘lobbying’ claro, em que toda a gente saiba que o advogado A fala com o ministro B por causa do projeto. Até para as pessoas poderem ver como é que foram os licenciamentos e tudo mais e verificar se houve alguma situação anómala. Acho que isso é muito mais claro do que o que temos hoje em dia. Porque não é expectável que as pessoas não falem”, afirmou.