Punk is Coming Festival: Offspring brilha com seu cirquinho punk enquanto Sublime tortura fãs

Festival reuniu uma banda explosiva prestes a estourar, um trio de irmãs barulhentas, vovôs punks estilosos, punk rock honesto e um dos piores shows gringos recentes no país

Mar 13, 2025 - 04:22
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Punk is Coming Festival: Offspring brilha com seu cirquinho punk enquanto Sublime tortura fãs

texto por Marcelo Costa
fotos por Douglas Mosh

Paul McCartney que se cuide. Com a passagem da turnê “SUPERCHARGED Worldwide in ’25” pelo Brasil, o Offspring soma nada menos que 34 shows em território brasileiro contra 39 do ex-beatle (relembre a mais recente). Desde a primeira vez que pisou em solo brasileiro, no século passado, com dois shows no Olympia, em São Paulo, Dexter Holland, o único membro da formação original que fundou a banda em 1984, já trouxe cinco bateristas diferentes para “passear” pelo Brasil nas 12 turnês que a banda fez pelo país desde 1997, e esse começo de texto com jeitão de nariz de cera tem a função de reforçar o óbvio: Offspring no Brasil é sucesso.

Sucesso é bom demais, mas a “gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e” um som bom, algo que infelizmente faltou no Allianz Parque no sábado (8) – mas a queima de fogos estava divina, vale assinalar (se o público vai a um show de [punk] rock para ver fogos é um outro assunto). Pontuado isso, a maratona do OffspringFest (aka Punk is Coming Festival), que começou ao meio dia e terminou próximo das 23h – reuniu uma banda explosiva prestes a decolar no cenário mundial, um trio de irmãs barulhentas, vovôs punks estilosos, punk rock honesto e um dos piores shows de um artista perante o público desde o vexame de Amy Winehouse na Arenha Anhembi, em 2011. E, claro, o cirquinho punk dos donos.

 

Escalados para dar o pontapé inicial no festival (tanto em São Paulo quanto em Curitiba, quando abririam a maratona com um show antes do almoço!), a Amyl and The Sniffers repetiu no Allianz a apresentação matadora que fez no Cine Joia, dois dias antes. Curiosidade: se o som na quinta estava um lixo, algo que até combina com o pub rock podre do grupo, nesta abertura de festival estava alto e estridente, uma delícia que não duraria para os shows seguintes. Os australianos estavam mais à vontade e menos tímidos também, e o show (mais curto, 14 canções contra 21 no Cine Joia, mas não menos divertido) passou voando. Quem chegou cedo se esbaldou.

Sem DJ set pra distrair o público nos intervalos, o jeito foi pegar uma sombra enquanto arrumavam o palco para a próxima atração, isso, claro, se você não tivesse com balões vermelhos nas mãos e não fosse do fã clube das Warning, trio formado pelas irmãs Daniela (guitarra), Paulina (bateria) e Alejandra (baixo). Com o gargarejo tomado pelos fãs, as mexicanas (que pareciam peixe fora d’agua no line-up “punk” com seu hard rock adolescente) foram recebidas com carinho e atenção pelo público. O som, já mais baixo, se não permitiu lapadas boas nos ouvidos, também não atrapalhou o trio, que fez uma apresentação certeira e correta em sua estreia no Brasil. Pode anotar: a estrada do sucesso está aberta para elas, e elas ainda vão voltar muito ao país.

 

Hora da trivia: você sabia que “Damned Damned Damned”, o álbum de estreia do The Damned, é um dos primeiros álbuns do punk rock a serem lançados (antes mesmo das estreias do Clash e do Sex Pistols)? E que Brian James, o cara que compôs quase todas as canções dos dois primeiros discos do Damned (incluindo os hits “New Rose” e “Neat Neat Neat”), e estava fora da banda desde 2022, morreu na véspera do show da banda no Cine Joia? Um amigo deu a triste notícia a eles na mesa do jantar, e a bad foi geral, com boas memórias e sentimentos de receio (todo mundo ali está na mesma faixa etária de Brian)…

O parágrafo anterior poderia ser dispensável, mas soa necessário para reforçar a importância de ver uma banda lendária fodaça como o Damned em ação. No dia anterior, e com um som muito melhor, eles levaram rosas ao palco do Cine Joia para celebrar o amigo que partiu num set de 22 canções que fez muito punk véio marejar os olhos. No calor do Allianz, o set list diminuiu para 15 canções, e mesmo assim o vocalista David Vanian (um dos três membros originais – junto ao guitarrista Captain Sensible e ao baterista Rat Scabies – que montou a banda em 1976 ainda na ativa) não retirou as luvas, mantendo o estilo cool. A plateia parecia dispersa, mas foda-se: o show (com imagens de Brian no telão em “Fan Club” e “New Rose”) foi bonito.

 

Na sequência, o Rise Against reatou seus laços punks com o público brasileiro – Tim McIIrath (vocal e guitarra) repetiu diversas vezes o quanto estava feliz de estar de volta ao país. O punk honesto dos caras segue a cartilha do hardcore made in USA noventista, ou seja, é quadradinho e politizado, sem muitas invencionices. Mas, ainda assim, Tim levou “Swing Life Away” de forma acústica, sozinho ao violão, e rodas punk se abriram em números como “Give It All” e em “Savior”, que fechou o set de um show que pareceu um pouco mais longo do que deveria. E já que falamos em shows longos… o que a versão Sublime 2025 fez no Allianz é algo digno de entrar em um ranking, o das piores apresentações de artistas estrangeiros em solo brasileiro! Segue uma sugestão (pessoal) de top 3, mas fique a vontade para sugerir o seu ranking nos comentários:

1) Sublime no Allianz, 2025
2) Amy Winehouse no Ibirapuera, 2011
3) Lemonheads no Directv Music Hall, 2004

Menção honrosa: Kanye West no Tim Festival SP, 2008

 

“Mas foi tão ruim assim o Sublime?”, pergunta o leitor, incrédulo. Então, não foi apenas ruim, foi torturante. Porém, primeiro ponto: o ska reggae dos caras tinha tudo para funcionar antes do cirquinho punk do Offspring, a escalação parecia correta, afinal os gêneros conversam e o Sublime tem a seu favor ingredientes que facilitam a festa: um repertório clássico e público. Só faltou… ensaiar. O som, baixo e embolado (tinha fã cantando, sem esforço, mais alto que o som que saia pelas caixas), colaborou para o desastre, mas Jakob Nowell, que hoje tem um ano a mais do que seu pai tinha quando sofreu uma overdose de heroína em 1996, parecia desconectado do palco, cantando fora do microfone, entrando errado nas músicas e errando letras. Um espetáculo triste que nem os covers de Toots & The Maytals, Bob Marley & The Wailers e o hino “Santeria” conseguiram salvar.

 

Depois do balde de água fria, que tal um cirquinho? Com jatos de fogos na beira do palco e um show de luzes no topo do estádio, o Offspring prova por A + B que chega uma hora na carreira de quase todo rockstar que apenas as canções não bastam, por mais que elas sejam boas. No Allianz, o Offspring ofereceu um dos melhores sons de guitarra do dia, fez aquelas piadinhas dispensáveis sem abusar tanto do tempo (e encher o saco como Dave Ghrol) e, principalmente, não enfiou canções novas meia boca goela abaixo do público (foram apenas duas novas – a populista “Come To Brazil” e “Make It All Right” – entre dezenove canções). Como retribuição, Dexter e Noodles viram o público se esgoelar em “All I Want”, “Come Out and Play” e “Bad Hit”, pogar com sorriso no rosto em um cover dos Ramones (”Blitzkrieg Bop”) e fazer air guitar no momento classic rock do show (punk quem mesmo?), em que Noodles brinca com riffs de canções do Deep Purple, Black Sabbath e AC/DC. “Pretty Fly (for a White Guy)” e “The Kids Aren’t Alrighty” encerraram a primeira parte do show, e todo mundo saiu do estádio fazendo os vocais nerd bêbados de “Self Esteem”.

Tirando o som problemático, o Punk is Coming Festival lembrou muito os festivais em estádio do século passado (como Hollywood Rock e Monsters of Rock), em que as bandas se alternavam no palco e o público, sub-aproveitado, ficava jogado pelos cantos nos intervalos das apresentações esperando o barulho soar novamente. Não que seja totalmente ruim (é preferível o “silêncio” e a paz do que a poluição visual marqueteira com que certos festivais agridem o público), mas, de repente, dois palcos menores com atrações nacionais ou mesmo DJs rock and roll (em cada canto da linha de fundo contrária) já transformariam o ambiente em algo mais… acolhedor para quem irá passar mais de 10 horas ali. Ainda assim, como um todo, o Punk is Coming Festival se mostrou um festival que merece outras edições. Quem sabe, com Green Day, quem sabe…

– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne. – Douglas Mosh é fotógrafo de shows e produtor. Conheça seu trabalho em instagram.com/dougmosh.prod