Plano de recuperação do grupo Vale da Rosa impõe perdas de oito milhões à banca
O plano de recuperação do grupo Vale da Rosa prevê um perdão de dívida de, pelo menos, oito milhões de euros a assumir pelos bancos. É este o esforço para assegurar o futuro da produtora de uva sem grainha fundada pelo comendador António Silvestre Ferreira, com mais de 200 trabalhadores, e que passará para as […]


O plano de recuperação do grupo Vale da Rosa prevê um perdão de dívida de, pelo menos, oito milhões de euros a assumir pelos bancos. É este o esforço para assegurar o futuro da produtora de uva sem grainha fundada pelo comendador António Silvestre Ferreira, com mais de 200 trabalhadores, e que passará para as mãos da Iberian Premium Fruits e a Sanlucar Fruits. Os espanhóis injetaram mais de 3,5 milhões para garantir a campanha da uva de 2025 e podem ficar com 85% do negócio, se houver aval dos credores.
Em causa estão, na verdade, três planos especiais de recuperação (PER): da sociedade Vale da Rosa, da Uval e do próprio empresário em nome individual António Silvestre Ferreira – os dois últimos produzem e fornecem a uva que é comprada, processada e comercializada pela primeira. Estes PER acabaram de ser apresentados em tribunal, e aos quais ECO teve acesso, com a decisão agora nas mãos dos bancos, os maiores credores do grupo.
A exposição da banca ao Vale da Rosa, com sede em Ferreira do Alentejo, supera os 26 milhões de euros, isto sem contar com a dívida comum sob condição (que inclui responsabilidade por avales prestados entre as empresas do grupo e que não serão acionados em caso de aprovação do plano). BPI, Crédito Agrícola e BCP lideram a lista dos maiores bancos credores.
O plano passa por uma reestruturação financeira que dá duas opções aos bancos (e uma terceira, a insolvência, mas com consequências mais gravosas): ou um perdão da dívida que atingirá um valor não inferior a oito milhões de euros, com o remanescente a ser liquidado nos três meses a seguir à homologação do plano; ou um alongamento dos prazos de reembolso por uma década ou mais com o pagamento integral das dívidas.
Em caso de insolvência do grupo, refere-se nos planos, os bancos receberiam substancialmente menos por conta da desvalorização dos ativos imobiliários. No caso dos créditos comuns, por exemplo, recuperariam não mais de 20% da dívida.
Joint-venture espanhola fica com 85%
Além da reestruturação financeira, o plano prevê uma reorganização societária de todo o grupo. Desde logo com a entrada de dois novos acionistas: a Iberian Premium Fruits e a Sanlucar Fruits, dois nomes que o Expresso já tinha avançado no mês passado, tendo dado conta na altura que os bancos viam com bons olhos o facto de serem dois investidores com experiência no setor.
Foi com estas duas empresas espanholas que o Vale da Rosa celebrou, em março, dois contratos de financiamento no valor global de 3,535 milhões de euros, dinheiro fresco que visa “suportar os custos operacionais” até junho e garantir que campanha da uva deste ano decorre sem constrangimentos.
A perspetiva é que a partir de julho, com o arranque das vendas, “a atividade do grupo volte a ser superavitária, deixando de necessitar de apports adicionais de capital”, segundo indica o plano.
Com a aprovação dos PER, esta dívida será convertida em capital, numa operação que fará com que 85% do grupo passe para as mãos da joint-venture espanhola, com os atuais sócios – António Silvestre Ferreira e os quatro filhos – a permanecerem na estrutura acionista com 15% do negócio.
O plano sublinha que desta forma se mitigam os riscos de sucessão (o comendador e fundador do grupo conta com 76 anos de idade), além de facultar ao grupo uma gestão mais profissional e a sua valorização.
Jerónimo Martins e Lidl ‘esmagam’ a uva sem grainha
Para este quadro de enormes dificuldades, o grupo, com mais de 200 trabalhadores, elenca vários fatores “estruturais e conjunturais” que deram origem a esta crise.
Por um lado, reconhece que a estratégia de crescimento e modernização levada a cabo nos últimos anos para a reconversão de vinhas e introdução de novas variedades de uva resultou num “aumento significativo” do endividamento do grupo, o que foi fatal para um negócio sazonal como este.
Mas houve outros fatores “inesperados” que “intensificaram as dificuldades na gestão da tesouraria”, segundo aponta. Designadamente, lamenta a perda de contratos importantes ao longo do ano passado com grandes superfícies comerciais como o “Pingo Doce, o Lidl e a Jerónimo Martins Polska”.
“Estes clientes representavam cerca de 33% do volume de negócios em 2023 e a sua perda contribuiu para um decréscimo na ordem dos oito milhões de euros no volume de negócios em 2024”, explica.
Enquanto perdia estes grandes clientes, o Vale da Rosa também se viu confrontada com a entrada no mercado nacional de produtos concorrentes a preços mais baixos, o que levou a baixar os preços e a reduzir as margens.
“O elevado endividamento, a quebra de receitas, os custos associados aos investimentos recentes e a sazonalidade do setor comprometeram a capacidade de geração de liquidez, essencial para suportar as operações e os compromissos financeiros”, resumem as devedoras.