Liberdade de imprensa em situação crítica devido à pressão económica
A liberdade mundial de imprensa está numa situação crítica, com o indicador económico sob pressão e no nível mais baixo da sua história, alertou hoje a organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF) No relatório anual, a RSF indicou que o Índice de Liberdade de Imprensa atingiu, em 2024, um nível crítico sem precedentes e alerta que […]


A liberdade mundial de imprensa está numa situação crítica, com o indicador económico sob pressão e no nível mais baixo da sua história, alertou hoje a organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF)
No relatório anual, a RSF indicou que o Índice de Liberdade de Imprensa atingiu, em 2024, um nível crítico sem precedentes e alerta que o declínio continua em 2025, pelo que o estado global da liberdade de imprensa é agora classificado como “situação difícil”.
De acordo com a RSF, grande parte da situação deve-se “à concentração da propriedade [das empresas de comunicação social], à pressão dos anunciantes e financiadores e à ajuda pública restrita, ausente ou alocada de forma opaca”.
Segundo dados recolhidos pela RSF, em 160 dos 180 países avaliados (88,9%), os meios de comunicação social só alcançam resultados financeiros estáveis “com dificuldade” e muitos nem sequer os conseguem.
“Pior ainda, os meios de comunicação social estão a fechar devido a dificuldades económicas em quase um terço dos países de todo o mundo”, como é o caso dos Estados Unidos, da Tunísia ou da Argentina, segundo a análise.
Os dados medidos pelo indicador económico mostram “claramente que os meios de comunicação social estão divididos entre preservar a sua independência editorial e garantir a sua sobrevivência económica”, lamentaram os RSF.
“Quando os meios de comunicação social enfrentam dificuldades financeiras, entram numa corrida para atrair audiências em detrimento de reportagens de qualidade e pode ser vítimas de oligarcas e autoridades públicas que procuram explorá-los”, acrescentou a organização.
A diretora editorial da RSF, Anne Bocande, citada no relatório, apontou que “quando os jornalistas estão empobrecidos, não têm meios para resistir aos inimigos da imprensa, os que defendem a desinformação e a propaganda”.
Segundo o relatório, em 34 países verificaram-se encerramentos em massa dos seus meios de comunicação, o que levou ao exílio de muitos jornalistas.
Isto aconteceu sobretudo na Nicarágua, na Bielorrússia, no Irão, em Myanmar, no Sudão, no Azerbaijão e no Afeganistão, onde as dificuldades económicas agravam os efeitos da pressão política.
Nos Estados Unidos, onde o indicador económico tem vindo a descer nos últimos dois anos, vastas regiões estão a transformar-se em desertos noticiosos.
Apesar de ter começado apenas em janeiro, o segundo mandato do Presidente norte-americano, Donald Trump, já intensificou esta tendência, com falsas previsões económicas que são utilizadas para colocar a imprensa sob pressão.
O fim abrupto do financiamento da Agência dos Estados Unidos para os Media Globais (USAGM), que afetou várias redações — incluindo a Voice of América e a Rádio Europa Livre/Rádio Liberdade — levou mais de 400 milhões de pessoas em todo o mundo a ficarem subitamente privadas de acesso a informação fidedigna.
Da mesma forma, o congelamento do financiamento da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID) interrompeu a cooperação internacional dos EUA, lançando centenas de meios de comunicação num estado crítico de instabilidade económica e obrigando alguns a fechar — sobretudo na Ucrânia.
Estes graves cortes no financiamento constituem um golpe adicional numa economia já enfraquecida pelo domínio que gigantes tecnológicos como a Google, a Apple, o Facebook, a Amazon e a Microsoft têm sobre a divulgação de informação.
Estas plataformas, em grande parte não regulamentadas, estão a absorver uma fatia cada vez maior das receitas publicitárias que normalmente apoiariam o jornalismo.
O gasto total com publicidade nas redes sociais atingiu os 247,3 mil milhões de dólares (cerca de 217 mil milhões de euros) no ano passado, um aumento de 14% em relação a 2023.
Além da perda de receitas publicitárias, que limitou severamente a economia dos media, a concentração da propriedade dos meios de comunicação social é outro fator-chave na deterioração do indicador económico do Índice de Liberdade de Imprensa e representa uma séria ameaça à pluralidade dos media.
O índice mostra que, em 46 países, a propriedade dos meios de comunicação está altamente concentrada e, em alguns casos, é totalmente controlada pelo Estado.
Isto é evidente sobretudo na Rússia, onde a imprensa é dominada pelo Estado ou por oligarcas ligados ao Kremlin, e na Hungria, onde o Governo controla os meios de comunicação através da distribuição desigual de publicidade estatal, referiu a RSF.
Também é evidente nos países onde as leis de “influência estrangeira” são utilizadas para reprimir o jornalismo independente, como a Geórgia, a Tunísia, o Peru e Hong Kong.
Mesmo em países com classificações elevadas de liberdade de imprensa, como a Austrália, o Canadá, a República Checa ou a França, a concentração dos media é motivo de preocupação, porque suscita preocupações sobre a independência das redações.
Em mais de metade dos países e territórios avaliados pelo Índice (92 em 180), a maioria dos entrevistados referiram que os proprietários dos meios de comunicação social limitavam “sempre” ou “frequentemente” a produção editorial.
No Líbano, Índia, Arménia e Bulgária, muitos media devem a sua sobrevivência ao financiamento por indivíduos próximos do mundo político ou empresarial e, em 21 países, incluindo Ruanda, Emirados Árabes Unidos e Vietname, a maioria dos inquiridos disseram que os proprietários dos meios de comunicação sempre interferiram na parte editorial das publicações.