"Zé, então e como está aquilo em Moçambique?..." (2): um novo ciclo
(A fotografia retrata uma exposição da Magma Fotografia, na estação dos CFM de Maputo, em 2009. A fotografia exposta será de Solange dos Santos ou de Dominique Andereggen, não tenho a referência completa) "Zé / Zezé, então e como é que está aquilo em Moçambique?...", perguntam-me diariamente amigos, agora que "as coisas" de lá se afastaram um pouco dos "escaparates" da imprensa. - escrevia eu há um mês. Agora perguntam-me menos, as notícias por cá escasseiam e outras questões prementes convocam o interesse: as nossas inúmeras trapalhadas do CHEGA, às quais se seguiram as previsíveis de Montenegro. Lá fora mantém-se a desgraça de Gaza, acoplada ao patético/pateta anseio de uma Riviera ali medrada. E, agora mesmo, a ascensão final da Criatura TrumPutin. Esta tanto animando essa execrável mescla, vigente desde a invasão da Ucrânia, fez ontem três anos (!), dos nossos comunistas - das versões III e IV Internacionais - e fascistas - entre estes em especial os que estiveram estas décadas travestidos de "sociais-democratas" pêessedistas ou "demo-cristãos". Os quais andam agora, eufóricos pois "saídos do armário", quais "bichas loucas" em histriónica "parata fascista". Enfim, olhando a História, percebemos que a revivemos. Pois a oriente temos hordas de guerreiros norte-coreanos rumo a Viena, os boiardos russos vão sendo defenestrados em massa, o pretendente Navalny foi morto há um ano (cumpriu-se há pouco). Entretanto, a oeste Drake vagueia pelas nossas costas, reforçado por frota de mercenários vikings, convertidos ao calvinismo africano. E há dias, arrogante, mandou-nos como emissário um puritano de Salem, para exigir "tributo". E esta nossa gentalha rejubila. Porquê? Por não gostar que "Roma" imponha alguns limites às superstições locais... São uns labregos, já o referi. Neste ambiente como atentar nas coisas de Moçambique? Mesmo assim ainda há quem me pergunte novidades sobre o país. Faço então um curto resumo, para não cansar os (um pouco) interessados. O candidato presidencial Venâncio Mondlane, autoproclamado "presidente do povo", continua as suas sortidas, colhendo impressionantes e espontâneos banhos de multidão: agora em Vilanculos, há dias em zonas populares de Maputo e em localidades da sulista província de Gaza (a Gaza moçambicana, não a mediterrânica, como julgou o ex-viking Musk). Alguns dos seus seguidores mais próximos continuam a sofrer tentativas de assassinato, ditos como praticadas pelos consabidos "esquadrões da morte". A isso reage a população, destruindo algumas instalações estatais e do partido do poder, fenómenos mais correntes no Sul do país, algo relevante pois em zonas de tradicional adesão maioritária ao Frelimo. E continuam a grassar bloqueios rodoviários e em torno de zonas comerciais, sinalizando a imprevisibilidade do rumo nacional e a atrapalhação da "ordem pública". Como detalhe, verdadeira minudência, lembro que algumas rádios de Nampula viram-se impedidas de transmitir, tendo regressado algum tempo depois, decerto que tendo tomado em conta o "aviso à navegação" recebido. Bastante preocupantes são as notícias da disseminação de grupos amotinados (agora ditos "namparamas", num uso inovador do termo, que vem substituir os anteriores "bandidos armados" ou "insurgentes"), os quais alastram, principalmente nos distritos da Zambézia. E diante dessa epidemia de "jacqueries" temo que se venha a tornar em pandemia. Entretanto há dias houve a ansiada reunião do Comité Central do Frelimo, sobre a qual muitos diziam ser o momento da passagem do testemunho, efectivando uma maior autonomia política do actual presidente Chapo, abrindo assim o "novo ciclo" de poder - este por cá já há tempos "anunciado na tv" pelos comentadores lóbistas Paulo Portas e Miguel Relvas -, e concomitantes novas práticas de exercício governativo. E alguns dias após essa reunião magna houve pronunciamentos dos próceres moçambicanos, delineando o conteúdo desse "novo ciclo". O antigo presidente Guebuza deu uma conferência na semana passada, explicitando que "o colono trouxe a ideia que o africano é corrupto". Entenda-se, que a premente acusação de corrupção generalizada do regime se deve ... à maldade exploratória dos colonialistas. Para os alheados das questões moçambicanas (e africanas) esta formulação tem de ser esmiuçada, pois não é apenas uma diatribe. As elites políticas que ascenderam ao poder após as independências sempre se legitimaram pelo seu papel anticolonial. E o Frelimo sempre insistiu nesse tópico. Agora, 50 anos depois da independência, com o país naquele estado, face a uma população cuja esmagadora maioria tem menos de 35 anos - netos e bisnetos dos colonizados -, tentar insistir neste tópico (certeiro ou errado, pouco importa) é evidência de que a elite política (na qual Guebuza é importantíssimo) não compreende o real, não reflecte sobre ele. E assim nunca assumirá um qualquer "novo ciclo" (apesar do que por cá dizem os comentadores televisivos Miguel Relvas e Paulo Portas...). Logo de seguida o

(A fotografia retrata uma exposição da Magma Fotografia, na estação dos CFM de Maputo, em 2009. A fotografia exposta será de Solange dos Santos ou de Dominique Andereggen, não tenho a referência completa)
"Zé / Zezé, então e como é que está aquilo em Moçambique?...", perguntam-me diariamente amigos, agora que "as coisas" de lá se afastaram um pouco dos "escaparates" da imprensa. - escrevia eu há um mês. Agora perguntam-me menos, as notícias por cá escasseiam e outras questões prementes convocam o interesse: as nossas inúmeras trapalhadas do CHEGA, às quais se seguiram as previsíveis de Montenegro. Lá fora mantém-se a desgraça de Gaza, acoplada ao patético/pateta anseio de uma Riviera ali medrada. E, agora mesmo, a ascensão final da Criatura TrumPutin. Esta tanto animando essa execrável mescla, vigente desde a invasão da Ucrânia, fez ontem três anos (!), dos nossos comunistas - das versões III e IV Internacionais - e fascistas - entre estes em especial os que estiveram estas décadas travestidos de "sociais-democratas" pêessedistas ou "demo-cristãos". Os quais andam agora, eufóricos pois "saídos do armário", quais "bichas loucas" em histriónica "parata fascista".
Enfim, olhando a História, percebemos que a revivemos. Pois a oriente temos hordas de guerreiros norte-coreanos rumo a Viena, os boiardos russos vão sendo defenestrados em massa, o pretendente Navalny foi morto há um ano (cumpriu-se há pouco). Entretanto, a oeste Drake vagueia pelas nossas costas, reforçado por frota de mercenários vikings, convertidos ao calvinismo africano. E há dias, arrogante, mandou-nos como emissário um puritano de Salem, para exigir "tributo". E esta nossa gentalha rejubila. Porquê? Por não gostar que "Roma" imponha alguns limites às superstições locais... São uns labregos, já o referi.
Neste ambiente como atentar nas coisas de Moçambique? Mesmo assim ainda há quem me pergunte novidades sobre o país. Faço então um curto resumo, para não cansar os (um pouco) interessados. O candidato presidencial Venâncio Mondlane, autoproclamado "presidente do povo", continua as suas sortidas, colhendo impressionantes e espontâneos banhos de multidão: agora em Vilanculos, há dias em zonas populares de Maputo e em localidades da sulista província de Gaza (a Gaza moçambicana, não a mediterrânica, como julgou o ex-viking Musk). Alguns dos seus seguidores mais próximos continuam a sofrer tentativas de assassinato, ditos como praticadas pelos consabidos "esquadrões da morte". A isso reage a população, destruindo algumas instalações estatais e do partido do poder, fenómenos mais correntes no Sul do país, algo relevante pois em zonas de tradicional adesão maioritária ao Frelimo. E continuam a grassar bloqueios rodoviários e em torno de zonas comerciais, sinalizando a imprevisibilidade do rumo nacional e a atrapalhação da "ordem pública". Como detalhe, verdadeira minudência, lembro que algumas rádios de Nampula viram-se impedidas de transmitir, tendo regressado algum tempo depois, decerto que tendo tomado em conta o "aviso à navegação" recebido. Bastante preocupantes são as notícias da disseminação de grupos amotinados (agora ditos "namparamas", num uso inovador do termo, que vem substituir os anteriores "bandidos armados" ou "insurgentes"), os quais alastram, principalmente nos distritos da Zambézia. E diante dessa epidemia de "jacqueries" temo que se venha a tornar em pandemia.
Entretanto há dias houve a ansiada reunião do Comité Central do Frelimo, sobre a qual muitos diziam ser o momento da passagem do testemunho, efectivando uma maior autonomia política do actual presidente Chapo, abrindo assim o "novo ciclo" de poder - este por cá já há tempos "anunciado na tv" pelos comentadores lóbistas Paulo Portas e Miguel Relvas -, e concomitantes novas práticas de exercício governativo.
E alguns dias após essa reunião magna houve pronunciamentos dos próceres moçambicanos, delineando o conteúdo desse "novo ciclo". O antigo presidente Guebuza deu uma conferência na semana passada, explicitando que "o colono trouxe a ideia que o africano é corrupto". Entenda-se, que a premente acusação de corrupção generalizada do regime se deve ... à maldade exploratória dos colonialistas. Para os alheados das questões moçambicanas (e africanas) esta formulação tem de ser esmiuçada, pois não é apenas uma diatribe. As elites políticas que ascenderam ao poder após as independências sempre se legitimaram pelo seu papel anticolonial. E o Frelimo sempre insistiu nesse tópico. Agora, 50 anos depois da independência, com o país naquele estado, face a uma população cuja esmagadora maioria tem menos de 35 anos - netos e bisnetos dos colonizados -, tentar insistir neste tópico (certeiro ou errado, pouco importa) é evidência de que a elite política (na qual Guebuza é importantíssimo) não compreende o real, não reflecte sobre ele. E assim nunca assumirá um qualquer "novo ciclo" (apesar do que por cá dizem os comentadores televisivos Miguel Relvas e Paulo Portas...).
Logo de seguida o novo presidente Chapo foi mais longe no sistematizar do conteúdo desse "novo ciclo": primeiro que a luta contra as "manifestações é a continuidade da guerra dos 16 anos". A expressão é um programa político: por um lado, o epíteto "guerra dos 16 anos" é um lema dos frelimistas (ladeado por outro "título", o de "conflito armado"), que nega a referência a uma "guerra civil", forma de então - e ainda agora - negar a realidade social da Renamo, reduzindo-a a marioneta de agressão estrangeira. E, por arrasto, afixando essa "inexistência" ao que se passa agora. Por outro lado, Chapo - mais novo que Guebuza - ao afirmar isto não só procura reduzir os manifestantes a agressores (externos) como busca a legitimação do poder na invocação da pacificação de uma guerra terminada há... 30 anos. E um discurso autolegitimador que, como o anterior, não colhe diante desta pirâmide etária. Ou seja, tanto pela negação sociológica como pela retórica autolegitimadora, a via do actual presidente sublinha que a elite política - e nesta caso a das fracções vigentes - não compreende o real, não reflecte sobre ele. E assim, repito, nunca assumirá um qualquer "novo ciclo"...
Depois, e para que não restem dúvidas sobre as suas intenções e as do poder instituído, foi a Pemba discursar e anunciou ontem que "Vamos derramar sangue para combater as manifestações", enfatizando ainda que "vamos fazer jorrar sangue"...
Enfim, "Zé/Zezé, então e como está aquilo em Moçambique?...", perguntam-me os amigos, diante da imperial do fim da tarde. "Não sei", respondo, entristecido.