Melinda French Gates: “Sabedoria Vem da Mudança”
Forbes, a mais conceituada revista de negócios e economia do mundo. Em entrevista à Forbes, filantropa fala sobre seu novo livro "The Next Day", em que aborda o poder das mudanças, reflete sobre sua infância, carreira na Microsoft, maternidade e liderança feminina O post Melinda French Gates: “Sabedoria Vem da Mudança” apareceu primeiro em Forbes Brasil.

Forbes, a mais conceituada revista de negócios e economia do mundo.
Para a empresária e filantropa Melinda French Gates, muitos dos momentos mais marcantes de sua vida aconteceram sob os olhos do público: o divórcio do ex-marido Bill Gates, sua saída da Fundação Bill & Melinda Gates após 25 anos e o compromisso de doar US$ 1 bilhão (R$ 5,8 bilhões) em prol da igualdade de gênero ao iniciar um novo capítulo em sua jornada filantrópica.
Em seu novo livro de memórias, “The Next Day” (“O Próximo Dia”, em tradução do inglês), lançado nesta semana, French Gates oferece um olhar franco sobre esses pontos de virada, além de outros momentos mais pessoais de sua trajetória.
A filantropa compartilha histórias inéditas no livro que, segundo ela, pode ajudar outras pessoas a lidar melhor com os períodos de transição da vida. “Completei 60 anos no ano passado e percebi que adquiri muita sabedoria ao longo desses anos — e que essa sabedoria surgiu justamente nos momentos de transição”, diz em entrevista à Forbes.
Em “The Next Day”, Melinda French Gates abre uma rara janela para sua vida: reflete sobre a infância, a carreira na Microsoft, a maternidade, o fim do casamento, a perda de uma amiga próxima, a decisão de deixar a fundação que ajudou a construir — tudo isso enquanto compartilha aprendizados sobre abrir mão do perfeccionismo, desacelerar, ouvir a própria intuição, enfrentar crises, abraçar mudanças e muito mais.
“Quando as mudanças chegam — e elas vão chegar — precisamos estar prontos para passar um tempo nos espaços de clareza que elas criam. Afinal, as mudanças são disruptivas e desorientadoras. Elas destroem todo o nosso planejamento e nos obrigam a questionar nossas suposições, ambições e até mesmo nossa identidade. Mas isso, eu aprendi, faz parte da magia delas.”
Melinda French Gates no livro “The Next Day”
French Gates é há muito tempo uma grande defensora dos direitos das mulheres e meninas. Em 2015, fundou a Pivotal Ventures, uma organização que trabalha para promover o progresso social e ampliar o poder e a influência das mulheres nos EUA e ao redor do mundo. Em 2019, anunciou que iria doar US$ 1 bilhão (R$ 5,8 bilhões) para promover a igualdade de gênero nos Estados Unidos — e, em 2024, destinou mais US$ 1 bilhão (R$ 5,8 bilhões) para o mesmo objetivo, ampliando o foco para ações globais.
A filantropa é a décima mulher mais rica do mundo na lista de Bilionários da Forbes de 2025, com uma fortuna de US$ 30,4 bilhões (R$ 173,4 bilhões).
Em entrevista à Forbes, Melinda French Gates fala sobre sua atuação filantrópica, explica por que é tão importante investir no avanço das mulheres e destaca o impacto transformador da liderança feminina. Também compartilha o que a motivou a escrever “The Next Day”, como cada pessoa pode fazer a diferença e qual mensagem quer deixar para o mundo.
Forbes: Por que você decidiu escrever este livro agora, neste momento da sua vida?
Melinda French Gates: Completei 60 anos em 2024, e há algo em fazer 60 — você não pode mais se enganar achando que ainda é jovem [risos]. No entanto, eu me sinto jovem. Percebi que adquiri muita sabedoria ao longo desses anos, e que essa sabedoria realmente veio por meio dos períodos de mudanças. Algumas você espera, outras não, algumas são mais fáceis, outras mais difíceis. Senti que havia aprendizados que queria compartilhar, conselhos que recebi ao longo do caminho de amigos ou autores que eu recorria à estante para reler.
Recebi o impulso para o livro quando fui convidada para fazer o discurso de formatura em Stanford, em junho do ano passado. Ao conversar com os presidentes da turma alguns meses antes do discurso, perguntei: “Sobre o que vocês gostariam que eu falasse?” E um dos jovens disse: “Sinto que muitas pessoas aqui em Stanford que estão prestes a se formar estão presas à ideia de que suas vidas estão em um único caminho e que precisam seguir esse caminho. Se você puder nos dar algum conselho sobre não se prender a isso e deixar espaço para mudanças.” A partir disso, fiz o discurso com esse foco e, depois, pensei: “Quero fazer um livro sobre esse tema.”
Quais mensagens você espera que os leitores tirem do livro?
O livro se chama “The Next Day” porque fala sobre transições na vida. Quero que as pessoas entendam que todos nós passamos por isso. Elas podem ser assustadoras ou empolgantes.
Se você está saindo de um ambiente de trabalho e vai fazer a transição para um novo emprego ou decidir sobre um novo caminho, não saia simplesmente e pule para a próxima jornada. Reserve um tempo no “dia seguinte”, o dia depois da transição, para realmente pensar, sentir e aprender, porque há muito crescimento que pode acontecer nesse momento.
Falo no livro sobre deixar espaço para mudar seus planos, conhecer novas pessoas e ouvir. Há todo tipo de pessoas e situações que entrarão na sua vida, e, se você puder ser flexível e adaptável, a mudança não precisa ser assustadora.
Quais são os aprendizados de passar por um período de transição? O que as pessoas podem aprender com a sua história?
Para mim, alguns dos aprendizados foram perceber o quanto meus amigos eram importantes e aprender a ser muito vulnerável. Quando você está passando por transições difíceis, precisa ser vulnerável com as pessoas. Aprendi que é possível crescer muito nesse período.
Quando algo está desconfortável, significa que você está crescendo — então, abrace isso. Tente não ter medo. Eu literalmente me dou um “coaching” mental: “Ok, isso está difícil, mas devo estar crescendo. Vai ficar tudo bem.” No fim das contas, você se torna muito mais resiliente.
No livro, falo sobre conceitos como se conectar com a sua voz interior, desacelerar e escutá-la, porque todos nós temos sabedoria. Falo sobre procurar os amigos, ir até a estante buscar um autor que já te tocou antes. Existem muitas lições por aí para aprendermos, e às vezes só precisamos desacelerar e escutar.
Há mais de 25 anos, você tem trabalhado na filantropia para criar um futuro mais saudável e igualitário. O que realmente é necessário para avançar na igualdade de gênero?
O que aprendi nesses 25 anos de filantropia na Fundação Gates é que, quando as mulheres têm pleno poder — voz, capacidade de decisão, seus próprios recursos — elas prosperam, suas famílias prosperam e a sociedade é mais saudável. Vi isso repetidas vezes, tanto em pequenas vilas locais quanto em parlamentos de países, com primeiros-ministros e presidentes. Por isso, estou determinada a fazer com que as mulheres avancem mais na sociedade.
Neste momento, com todas as ameaças atuais à igualdade de gênero, como podemos continuar avançando individual e coletivamente?
Todos nós temos algo a contribuir, seja com recursos ou tempo. Para quem acredita que uma sociedade é melhor quando homens e mulheres são iguais, você pode usar sua voz para dizer ao seu representante: “Acredito neste projeto de lei” ou “discordo do seu voto sobre este assunto.”
Também pode contribuir com uma pequena organização filantrópica na sua comunidade ou doar para uma instituição maior que atua com uma causa na qual você acredita. Pode ensinar aos seus filhos, em casa, que meninos e meninas são iguais e mostrar como viver isso no dia a dia. Acredito que podemos usar nossa voz e nosso dinheiro para tentar fazer com que a sociedade avance no rumo que acreditamos ser o certo.
Qual seria sua mensagem de encorajamento para quem sente que não pode fazer a diferença ou não sabe por onde começar?
Muitas vezes, você nem sabe o impacto que tem sobre outra pessoa. Se você perguntar a quase qualquer adulto: “Quem teve o maior impacto na sua vida, além dos seus pais?”, frequentemente a resposta será um professor, um treinador, alguém de uma organização voluntária ou que deu uma palavra de incentivo.
Todos nós impactamos uns aos outros. Seja como voluntário em uma sala de aula, ajudando em um banco de alimentos local, treinando uma criança ou apenas dando uma mensagem encorajadora — tudo isso importa. A única coisa que muda a sociedade são indivíduos — e depois, indivíduos se unindo coletivamente. Acredito profundamente nisso: tudo o que você faz pode impactar os outros.
No livro, você fala sobre como seu pai acreditava na força que as mulheres e a diversidade trazem para qualquer equipe, e como ele te incentivou a seguir carreira nas áreas de STEM (sigla em inglês para ciência, tecnologia, engenharia e matemática). Por que é importante ter mais mulheres nesse e em outros setores?
Somos uma sociedade composta por muitos tipos diferentes de pessoas, então, quando as políticas públicas e os ambientes de trabalho refletem quem somos como indivíduos e famílias, estamos criando a sociedade que desejamos. É muito importante que todos os espaços reflitam quem somos como nação.
Uma mulher tem uma perspectiva diferente da sociedade. Ela costuma ser a principal cuidadora, então muitas vezes está equilibrando trabalho com a criação dos filhos. Não que o cônjuge ou parceiro dela não faça isso também, mas talvez não na mesma proporção.
Uma das razões pelas quais sou tão vocal e tento usar todas as ferramentas que tenho – investimentos, doações filantrópicas, minha voz e meu ativismo – em prol das mulheres na ciência e tecnologia é porque isso está moldando a nossa sociedade. Pense no setor de tecnologia, na estrutura dos nossos celulares e computadores, de onde tiramos informações. Esse conteúdo é enviesado quando é criado apenas por uma parte da sociedade, por exemplo, homens brancos jovens. E sei que será mais difícil remover esse viés se todos não estiverem representados à mesa. Precisamos de muito mais mulheres e pessoas negras e indígenas tanto na tecnologia quanto na inteligência artificial, porque essas áreas estão transformando o mundo em tempo real.
E qual a importância de ter líderes mulheres à frente de países?
Observei alguns primeiros-ministros e presidentes governarem ao longo da minha jornada. Quando esses líderes são mulheres, é diferente. Trabalhei com a chanceler [Angela] Merkel enquanto ela estava na Alemanha e com a Jacinda Ardern quando ela liderava a Nova Zelândia. Elas falavam constantemente sobre todos ao redor delas. Durante a Covid, essas mulheres estavam preocupadas não apenas com seus próprios países, mas com como ajudar quem estava em volta. E faz uma diferença enorme quando meninas podem ver uma mulher liderando um país.
Qual é a principal mensagem que você gostaria de transmitir às mulheres neste momento?
Abrace a mudança. Não tenha medo dela. A mudança às vezes é muito difícil, em outras é mais fácil e até divertida. Mas entre nela com coragem. Saiba que você tem muitas ferramentas dentro de si. Cerque-se de pessoas boas e de lições e aprendizados que estão por aí. Você vai crescer e se tornar mais resiliente. E provavelmente vai inspirar outras pessoas a fazerem o mesmo.
*Marianne Schnall é colaboradora da Forbes USA. Ela é jornalista, entrevistadora e autora, além de fundadora do Feminist.com e host do podcast ShiftMakers.
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