Helmet entrega tudo e mais um pouco em noite inspirada e barulhenta em São Paulo

Banda privilegiou clássicos “Betty” (1994) e “Meantime” (1992) em seu único show no Brasil. Page Hamilton brincou que estava pensando em pedir cidadania brasileira em meio à ótima resposta do público no show,

Mai 3, 2025 - 04:49
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Helmet entrega tudo e mais um pouco em noite inspirada e barulhenta em São Paulo

texto de Luiz Mazetto
fotos de Doug Mosh

O Helmet abriu sua passagem pela América do Sul com um show intenso e pesado para fazer a alegria do público que compareceu em peso ao Carioca Club, na zona oeste de Pinheiros, numa noite fria em plena véspera do feriado de 1 de maio. E não tinha como ser de outra forma: a apresentação na capital paulista era a única da banda no Brasil em sua atual turnê, que celebra os 30 anos do disco “Betty” (1994).

O clássico álbum foi tocado na íntegra e em sua ordem original na primeira parte do show, como costuma acontecer em tours do tipo. Desde a abertura com a dobradinha “Wilma’s Rainbow” e “I Know” até o fim caótico com “Sam Hell”, em que a guitarra de Page soa como um banjo dos infernos, passando pelo hit “Milquetoast”, pelas pauladas “Tic”, “Overrated” e “Rollo” e pela dispensável “The Silver Hawaian”, o que se viu foi uma banda extremamente afiada e focada em recriar “Betty” da melhor forma possível em 2025. Foi um som atrás do outro, sem grandes comunicações com o público. Mas podemos dizer que o objetivo foi alcançado com louvor, tanto em performance quanto em timbres.

Apesar de obviamente não terem gravado o disco, Jimmy Thompson (guitarra), Kyle Stevenson (bateria) e Dave Case (baixo) possuem uma sintonia perfeita no palco com o líder da banda, Page Hamilton. “A gente com certeza tem uma conexão forte”, havia adiantado Page em conversa com o site, algo visível e audível para qualquer pessoa que tenha a chance de ver o quarteto “esmurrar” seus instrumentos em uma comunhão. Juntos há cerca de 15 anos, quase o dobro do tempo que a formação original durou nos anos 1990, o lineup atual soa como uma maquinário pesado extremamente bem regulado, um paralelo que também se encaixa bem com o som repetitivo da banda de metal/hardcore, que eventualmente flerta com o industrial.

Após “Betty” ser devidamente homenageado, Page iniciou uma série de interações com os presentes, dizendo, entre outras coisas, que gostava mais de fazer shows solo do que tocar em festivais e chegando até a brincar que estava pensando em pedir cidadania brasileira em meio à ótima resposta do público no show, com letras e até riffs de guitarras cantados a plenos pulmões. Vale lembrar que essa foi a quinta passagem do Helmet pelo Brasil: as outras aconteceram em 1994 (com shows no festival M2000 e no saudoso Olympia em SP), 2008 (no Goiânia Noise Fest e SP Noise Fest), 2011 (com shows no Porão do Rock e nas unidades do Beco 203 em SP e Porto Alegre) e 2022 (como atração do Oxigênio Festival e um show solo em Brasília).

A segunda parte do show trouxe foco especial nos dois primeiros discos da banda, “Strap It On” (1990) e “Meantime” (1992), que tiveram, somados, um total de sete músicas tocadas, com destaque para as obrigatórias “Unsung”, “Iron Head” e “In the Meantime”, além de sons mais, digamos, inesperados, mas não menos necessários, como “Bad Mood”, “Give It” e “Turned Out”. O setlist ainda contou com a quase radiofônica “Driving Nowhere”, do subestimado último disco da formação original, “Aftertaste” (1997), e o clássico absoluto “Just Another Victim”, gravado pelo Helmet com o House of Pain para a trilha-sonora do filme “Judgment Night” (1993), que reúne outras parcerias históricas entre grandes nomes do rock/metal e do hip hop, incluindo Slayer, Cypress Hill, Sonic Youth, Biohazard, De La Soul, Living Colour e Run DMC. Da fase pós-2000 apenas dois sons marcaram presença, “Swallowing Everything” e “Dislocated”, que se não animaram tanto quanto os clássicos, não fizeram a energia e o clima do show caírem em nenhum momento.

Para além do entrosamento dos quatro integrantes como uma unidade extremamente sólida para entregar barulho em forma de música, fica o destaque para o carisma e presença de Page Hamilton à frente do Helmet, banda que fundou e em que se mantém como único integrante constante desde 1989 (com uma pausa de alguns anos entre o fim dos 1990 e início dos 2000). Se a voz não é mais a mesma de 30 anos atrás, e nem haveria de ser, o nível da intensidade e entrega do vocalista/guitarrista em cima do palco nos faz pensar que ainda veremos a banda na ativa por um bom tempo. Sorte a nossa.

–  Luiz Mazetto é autor dos livros “Nós Somos a Tempestade – Conversas Sobre o Metal Alternativo dos EUA” e “Nós Somos a Tempestade, Vol 2 – Conversas Sobre o Metal Alternativo pelo Mundo”, ambos pela Edições Ideal. Também colabora coma a Vice Brasil, o CVLT Nation e a Loud! 
– Doug Mosh é fotógrafo, produtor executivo e roadie. Acompanhe seu trabalho: instagram.com/dougmosh.prod