Faltam 49 dias para o Rali de Portugal: Delecour e a magia de 1993, o sabor da primeira vitória no WRC

Há 32 anos, François Delecour conquistava, nas duras e míticas classificativas de terra do Rali de Portugal, a sua primeira vitória no Campeonato do Mundo de Ralis. Um triunfo que surpreendeu muitos e que marcou o início de uma nova etapa na carreira do talentoso piloto francês, ao volante do Ford Escort Cosworth. Na altura, […] The post Faltam 49 dias para o Rali de Portugal: Delecour e a magia de 1993, o sabor da primeira vitória no WRC first appeared on AutoSport.

Mar 27, 2025 - 10:49
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Faltam 49 dias para o Rali de Portugal: Delecour e a magia de 1993, o sabor da primeira vitória no WRC

Há 32 anos, François Delecour conquistava, nas duras e míticas classificativas de terra do Rali de Portugal, a sua primeira vitória no Campeonato do Mundo de Ralis. Um triunfo que surpreendeu muitos e que marcou o início de uma nova etapa na carreira do talentoso piloto francês, ao volante do Ford Escort Cosworth.

Na altura, em plena euforia pela conquista, Delecour aceitou o desafio de escrever uma crónica exclusiva para o nosso jornal, onde, com a sinceridade e emoção que lhe eram características, relatou na primeira pessoa todos os momentos marcantes daquela semana inesquecível. Da incerteza nas especiais portuguesas ao alívio da vitória final, passando pelas dificuldades sentidas em Arganil e pelas emoções de cruzar a linha de meta com a vitória garantida.

Hoje, três décadas depois, relembramos essas palavras com o mesmo entusiasmo com que foram lidas em 1993.

Um testemunho genuíno que nos transporta para o ambiente único de um Rali de Portugal repleto de desafios, público vibrante e histórias que ficaram para sempre gravadas na memória dos adeptos.

Releia, a seguir, a crónica completa de François Delecour — como se o tempo não tivesse passado.

A crónica de François Delecour, Rali de Portugal 1993

A palavra que mais me ocorreu na ligação entre o final do último troço e a chegada do rali foi ‘finalmente’.

Porque chegara a hora de ganhar uma prova do Mundial de Ralis, Já podia ter sucedido no passado, mas por esta ou aquela razão nunca tivera a sorte a bafejar-me para poder saborear mais do que nunca delicioso champanhe, apesar de eu não ingerir qualquer género de bebida alcoólica.

Confesso que não estava à espera deste triunfo e isto por vários motivos: em primeiro lugar, o comportamento do carro na terra era uma autêntica incógnita e tínhamos trabalhado muito pouco, pois só fizemos seis dias de testes – três eu e três o Miki; por outro lado, estava um pouco receoso da minha inexperiência nas classificativas de terra portuguesas, sabendo que os meus adversários tinham uma preparação bem diferente.

Devo dizer que preparei bem o rali, sobretudo a zona de Arganil, tradicionalmente a decisiva da prova portuguesa e isso acabou por se revelar da máxima importância, pois deu-me outra confiança para a última etapa, mesmo apesar de já saber que havia conselhos de Colin Dobinson para a manutenção de posições A primeira etapa começou bastante bem e os dois Ford foram de imediato para a frente: comandar o Rali de Portugal não era uma sensação

nova e, tal como esperávamos, os Lancia revelavam-se os principais adversários.

Importante era não cometer qualquer erro, mantendo sempre uma cadência muito viva. Foi o que aconteceu, tal como no ano passado cheguei em primeiro à Póvoa.

Muito se especulou acerca do que se passou no Caramulo, mas creio que não se trata de uma questão prioritária nesta prova. Penso que este tipo de controlos são necessários e que se devem manter. Creio, no entanto, que jamais poderia ter partido para o troço naquelas condições e a organização esteve muito bem, ao anular a classificativa.

Quero, no entanto, deixar bem claro que jamais atravessei o carro, como me chegaram acusar, tendo aguardado tranquilamente pelo desenrolar dos acontecimentos.

Ao terminar Lousada, fui invadido por uma sensação estranha: e agora como se iriam passar as coisas? Como conseguiria bater a maior experiência dos meus adversários? Confesso que fiquei surpreendido, muito embora não deixasse de correr alguns riscos. Uma coisa é treinar, outra é passar nos troços a sério.

Em Fafe, cada vez que levantava voo e olhava o céu, não sabia como aquilo iria terminar. Felizmente que foi sempre bem. Mas o Ford Escort revelou-se um carro muito fácil de guiar na terra, muito equilibrado, potência ideal, permitindo dar uma certa tranquilidade quer a mim, quer ao Miki. O meu único receio era o de guiar o primeiro carro na estrada, o que, nos troços de Fafe, acaba sempre por ser penalizante, mas apesar de todas estas questões, a verdade é que consegui regressar à Póvoa no comando.

A coisa começava a tornar-se interessante! Quando soube, logo no início da terceira etapa, que Carlos Sainz tinha desistido, percebi logo que a maior ameaça para as minhas pretensões passava a vir do meu próprio colega de equipa, pois tinha a certeza de que Aghini teria de baixar o ritmo para não correr riscos e levar o carro à chegada. Devo confessar que o meu relacionamento com Miki é perfeito: para mim, ele é ainda o melhor, pois não já não sendo talvez tão rápido como eu, o Didier ou o Carlos, tem a grande vantagem de não cometer erros, terminando sempre bem classificado. E é bom não esquecer que estamos a falar de um piloto que foi por duas vezes campeão do Mundo.

Foi na terceira etapa que vivi o momento mais difícil de todo o rali, com o motor a ceder repentinamente no troço de Viseu: momentaneamente fui-me abaixo, pois temi que, uma vez mais, a sorte me abandonasse, e que pudesse perder mais uma prova que estava mais do que ao meu alcance. Quando. Cheguei à assistência e os mecânicos descobriram o que se passava, posso dizer que ganhei uma nova alma!

Mesmo com a vantagem que dispunha, Arganil mete sempre respeito a qualquer piloto e por isso temia o que iria descobrir na última etapa, para mais em classificativas quase todas disputadas de noite.

Devo confessar que me deliciei com a primeira grande experiência daquelas grandes ‘clássicas’ do rali de Portugal, numa sensação única e quase indescritível.

Só quando saí de Arganil fiquei com a sensação de que tinha finalmente a vitória garantida e nem podem imaginar a minha emoção ao longo dos últimos quilómetros do troço de Coruche. Pessoalmente, esta vitória e importantíssima, por várias razões: em primeiro lugar porque dizem que a que custa mais é, precisamente, a primeira e que depois as outras surgem normalmente; depois, porque a equipa precisava deste tónico, já que há vários anos que a Ford não ganhava qualquer prova do Mundial e mesmo o último êxito foi conseguido por uma equipa semi-oficial; finalmente porque venci uma prova em que nem sequer era favorito.

Na verdade, se ganhasse Monte Carlo ou a Córsega, todos diriam que era natural, face ao meu conhecimento do terreno, mas em Portugal e depois das minhas experiências anteriores, creio que o meu triunfo confirmou o que sempre disse, e que é o gostar muito de andar em terra.

Agora que pude observar em pormenor toda a prova portuguesa, devo confessar que fiquei espantado com o público, mais numeroso do que em Monte Carlo, e, apesar de tudo quanto se disse anteriormente, não tive grandes problemas, apesar de ser o primeiro piloto a passar na estrada.

Não quero, contudo, deixar de dar uma palavra de parabéns para o assombroso dispositivo policial montado e que foi de uma eficiência como nunca vi.

Cooperantes, eficazes, são o oposto do que se passa na Finlândia e enquanto, no meu caso, só faço os 1000 Lagos porque sou obrigado, em Portugal é sempre um prazer voltar.

A festa foi grande para os homens da Ford e na noite de sábado todos tivemos de fazer um discurso: depois calculam o que foi a alegria da vitória, os ingleses e a cerveja. Felizmente que não bebo. Regressei a casa e era o delírio: o meu atendedor de chamadas quase encravou. Mas a minha principal preocupação foi rever a minha mulher e a minha filha de 18 meses. Neste fim de semana houve também um rali na minha região que, apesar de não ter muitos praticantes, se interessa muito pelos ralis, e não se falava de outra coisa.

Já tenho entrevistas marcadas para a televisão, rádios e imprensa local. É tão bom ganhar!

Agora uns escassos dias de repouso e eis-me na Córsega para os primeiros testes de pneus para uma prova em que a minha confiança à partida será bem maior, tal como as responsabilidades.

E agora que já cheirei perfume da vitória, que tal habituar-me a ele?

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