Então você quer ter um site…?

Tenho pensado na hipotética pessoa comum, insatisfeita com o Instagram e/ou o TikTok, que decide criar um site. Por onde ela começa? Quais dificuldades enfrentará? Quanto terá que gastar? Vai conseguir publicar seu primeiro “Olá, mundo!” antes de desistir e voltar com o rabo entre as pernas ao Instagram?

Mar 20, 2025 - 12:11
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Então você quer ter um site…?

Para quem passa algum tempo em cantos esquisitos da internet, como o Mastodon ou este Manual do Usuário, exaltar a web é prática recorrente. “Saia do Instagram, faça um site”, alardeamos a quem nos dá ouvidos, com aquela esperança que não sei se de alguém ingênuo ou que se sabe iludido.

Tenho pensado na hipotética pessoa comum, insatisfeita com o Instagram e/ou o TikTok, que decide seguir o conselho. “Certo, é isso que eu quero: vou fazer um site!”

Por onde ela começa? Quais dificuldades enfrentará? Quanto terá que gastar? Vai conseguir publicar seu primeiro “Olá, mundo!” antes de desistir e voltar com o rabo entre as pernas ao Instagram?

Sinto que estamos gastando muita energia na promoção da web e nos esquecendo de como viabilizá-la a pessoas que não sabem o que é git ou HTML e nem querem saber. Abrir uma conta no Instagram é grátis e exige três cliques — bilhões de pessoas conseguem, literalmente.

Como faz para criar um site, ou um blog?

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É possível fazer um recorte de dois tipos de sites, os dinâmicos e os estáticos.

O do Manual é o chamado dinâmico, com um sistema complexo (WordPress) que faz… coisas no servidor (o computador onde ficam os arquivos), o que me permite atualizá-lo dentro do próprio site, em uma área restrita, em uma espécie de Google Docs, só que (ainda) mais feio.

Ninguém (ou quase ninguém) cria um site desses do zero. Seria reinventar não apenas uma roda, mas uma roda super complexa. Além disso, o WordPress é gratuito e tem o código aberto.

É preciso, porém, instalar e gerenciar o WordPress. É bem mais fácil fazer isso do que ~inventar um sistema desses, mas tais tarefas estão longe de serem óbvias, ou simples. A título de comparação, é um trabalho que as redes sociais comerciais abstraem dos usuários.

Felizmente, dá para terceirizar a instalação e o gerenciamento de um site. (Se dependesse de mim, aliás, o Manual provavelmente já teria tido uma falha catastrófica.) Existem hospedagens gerenciadas, que lidam com toda essa parte mais técnica. No meu caso, uso o WordPress.com da Automattic.

Aí é só escrever, certo? Sim. Pode ser no WordPress ou em um dos vários rivais da Automattic — Squarespace, Wix, Ghost, Webflow, mmm.page…

O “porém” desse caminho é que você terá que botar a mão no bolso para ter uma experiência decente. Em serviços que oferecem plano gratuito, como o WordPress.com, era melhor que não oferecessem: há anúncios em excesso e funcionalidades de menos.

Quanto custa? Em março de 2025, o plano mais básico do WordPress.com custa R$ 31/mês ou R$ 12/mês em um contrato anual, pago em uma parcela (R$ 144). Considere, ainda, o gasto em um domínio próprio (R$ 40/ano para os .br), o que é importante pela apresentação e para não ficar preso ao serviço. Ter um domínio te garante autonomia para “trocar o motor” do seu site sem perder os links e o tráfego que você conquistou.

É barato, sim, mas talvez os ~R$ 20 mensais saia caro para alguém que ainda não tem certeza de que se comprometerá com o site, que só queira experimentar ou ter um blog como hobby.

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O outro tipo de site é o chamado estático. Tem esse nome porque, ao contrário do dinâmico, não acontecem… coisas no lado do servidor — este só entrega arquivos do jeito que são a quem acessa o site, sem processá-los, sem eventos definidos pela programação do site.

É tão barato e descomplicado (do lado do servidor) que não é difícil encontrar boas hospedagens gratuitas. GitHub e Cloudflare são dois exemplos. (Meu site pessoal está hospedado na Cloudflare.)

A fim de facilitar atualizações e alterações em sites estáticos, existem aplicações que automatizam a geração do mesmo. Jekyll, Hugo, Eleventy… Eles criam algo parecido com regras pré-definidas (este cabeçalho vai em todas as páginas, por exemplo) que são executadas ao rodar um comando no terminal (a tela preta com letrinhas brancas dos ~hackers) para gerar um diretório com o site inteiro, pronto para ser enviado à hospedagem.

Os já citados GitHub Pages e Cloudflare Pages funcionam melhor se o seu site estiver conectado a um repositório do git. Não entrarei em detalhes do git porque na maior parte do tempo eu não sei muito bem o que estou fazendo, só sei que no fim dá certo.

Se você nunca escreveu uma tag de HTML, tenho certeza que eu te perdi há uns dois ou três parágrafos, muito antes do git.

E esse é um grande problema.

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Fazer um site não é tão difícil. Um site simples, “meio capenga? Diria que é fácil. Dá para fazer com o Bloco de notas, até.

Quando a internet ainda era movida a manivelas, a web era rainha e nela predominava o texto escrito. Mesmo com a chegada dos sites interativos da “web 2.0”, no início dos anos 2000, o texto escrito ainda prevalecia porque vídeos eram (e ainda são) bem mais pesados.

Foi nesse contexto que muita gente aprendeu a criar sites, mesmo sem saber que estava aprendendo. Gente que queria personalizar seus perfis no MySpace, blogs no Blogger; que queria homenagear suas bandas favoritas e expressar interesses pessoais no Geocities, no hpG.

Havia incentivo (vontade de se expressar) e circunstâncias favoráveis (tempo livre e falta de alternativas mais atraentes e/ou fáceis). Hoje a molecada só quer saber de Roblox, Fortnite e TikTok. *Levanta o punho e brada impropérios a nuvens inocentes no céu*

Não as culpo; longe disso. Porque, convenhamos: transformaram a web em um lixão. Sites limpinhos e escritos por pessoas, como este Manual, são exceções. De um jeito infeliz, a web é o metaverso que deu certo, um ambiente virtual saturado pela sanha extrativista do capital, uma vitrine de anúncios ou funil de vendas, e só.

Apesar disso, eu ainda gosto daqui, da web. E continuo incentivando as pessoas a criarem sites pessoais. Amadores, esquisitos, talvez um site seja o “conteúdo” mais humano que um “criador” possa fazer no digital.

A imagem do topo é do primeiro site publicado por Tim Berners-Lee. Ainda está no ar.

Fonte