Dos porcos aos drones nas vinhas, o que andam os viticultores a fazer na Bairrada
Nas vinhas velhas de Filipa Pato, na Mealhada, assistimos a uns quantos porcos a “focinhar a terra”, que poupam trabalho árduo, ou as ovelhas a comer erva e a ajudar a adubar os solos sem uso de herbicidas. Há ainda um drone a pulverizar preparados de infusões “para proteger as videiras dos fungos e evitar […]



Nas vinhas velhas de Filipa Pato, na Mealhada, assistimos a uns quantos porcos a “focinhar a terra”, que poupam trabalho árduo, ou as ovelhas a comer erva e a ajudar a adubar os solos sem uso de herbicidas. Há ainda um drone a pulverizar preparados de infusões “para proteger as videiras dos fungos e evitar doenças, em vez de o fazermos à mão ou com recurso a um trator”, detalha Filipa que não é única a praticar a viticultura biodinâmica nesta região vitivinícola da Bairrada e que é possível conhecer a 3 de maio, Dia Internacional da Baga.
Filha do conceituado produtor Luís Pato – produziu em 1980 o seu primeiro vinho, um monovarietal de Baga, ainda hoje de grande procura –, Filipa Pato junta-se ao pai e aos restantes Baga Friends: Mário Sérgio (Quinta das Bágeiras), François Chasans (Quinta da Vacariça), Dirk Niepoort (Quinta de Baixo), Paulo Sousa (Sidónio de Sousa), Luís Patrão (Vadio) e o estreante Luís Gomes (Giz).
Sob o lema “A Baga nas suas 8 Quintas”, os oito produtores mostram, a 3 de maio, como a Baga, em tempos uma casta mal-amada, anda agora nas bocas do mundo com vinhos aromáticos, ricos em taninos e elevada acidez. Com uma panóplia de referências de base espumante, rosé e tintos. Mas já lá vamos.
Começamos o nosso périplo pelas vinhas velhas de Filipa Pato (Filipa Pato & William Wouters), enquanto nos descreve como casa técnicas ancestrais com tecnologia moderna na viticultura biodinâmica, aproveitando toda biodiversidade que o ecossistema proporciona. A sua mais recente aquisição foi um drone que tem acoplado um depósito de 22 litros para pulverizar as videiras e que, assegura, só lhe traz vantagens: “É a solução perfeita porque não é poluente e não compacta o solo como o trator”.
Primeiro foi preciso fazer um mapeamento da área das parcelas de vinhas num total de 20 hectares, entre as freguesias de Casal Comba e Óis do Bairro, na Mealhada. Mas depois tudo se tornou muito mais fácil. “Usamos o drone para pulverizar um preparado feito com infusões –como cavalinha, funcho ou aloé vera — misturadas com água da chuva, e outras vezes utilizamos fermentações de plantas”, descreve Filipa Pato ao volante do jipe que nos conduz entre caminhos enlameados em terra batida, em direção a uma vinha velha datada de 1864, batizada de Missão.
Chegaríamos depois a outras parcelas de vinhas com a viticultora a perguntar: “Estão a ver à esquerda os porcos?”; para logo de seguida contar, entusiasmada: “Comem a erva, focinham e trabalham o solo, e acabam por purificar a terra muito mais rápido”.
Usamos o drone para pulverizar um preparado feito com infusões, como cavalinha, funcho, aloé vera, misturados com água da chuva, e outras vezes utilizamos fermentações de plantas.
Além dos porcos, Filipa Pato também tem outros animais nas vinhas como as ovelhas que comem erva e ajudam a adubar as terras. Há ainda por ali uma burra que assume o papel de espécie de pastor ao “conduzir e pôr a circular as ovelhas na vinha, além de as proteger dos predadores”, relata a produtora de vinhos de Baga tintos e espumantes.
Filipa Pato leva a biodinâmica tão à risca que inclui uma prática que, à primeira vista, pode parecer bizarra: encher com bosta de vaca os cornos deste animal e enterrá-los na terra no outono para os retirar depois na primavera. O resultado é diluído em água e aplicado nas videiras ou usado num composto. Também fomos encontrar esta prática biodinâmica na Quinta de Baixo, de Nirk Niepoort, como nos explica depois o enólogo Miguel Silva, responsável pela viticultura e pelos vinhos desta propriedade no lugar da Cordinhã, Cantanhede, a que soma as misturas de plantas, tal como Filipa Pato faz.
“Fazemos infusões de cavalinha – que é antifúngico –, camomila, alfazema, funcho ou dente-de-leão para depois pulverizarmos nas videiras”, nota Miguel Silva enquanto nos mostra os produtos armazenados numa sala toda ela aromatizada. “Não vão matar o fungo, mas vão criar biodiversidade, criar o equilíbrio. O objetivo é reduzir a utilização de cobre usado na agricultura biológica”, explana o enólogo antes de dar a provar alguns vinhos na adega e nos conduzir numa viagem pelos vários tipos de calcário dos solos da região que depois interferem na cor ou no tanino dos vinhos que a marca produz.
Já na aldeia de Poutena, Anadia, fomos encontrar Luís Patrão, da marca Vadio, que fundou com o pai há duas décadas, e que aposta na viticultura biológica nos dez hectares de vinha de que é proprietário nesta região. As uvas que planta nestes solos argilocalcários dão para encher 50 mil garrafas de vinho e vender por esse mundo fora. “No próximo ano já temos vinhos com certificação biológica”, assegura Luís Patrão enquanto aponta para as videiras trabalhadas com base na sustentabilidade de modo a proteger a biodiversidade do território.
Diz que 60% da produção da empresa é feita a partir da casta Baga. A 3 de maio, no Dia Internacional da Baga, deverá abrir algumas das 300 garrafas do novo Vinho Branco Finuum produzido a partir desta casta identitária da região vinhateira da Bairrada.
Só na edição de 2024, o evento atraiu 500 pessoas para ver e provar o que os produtores bairradinos têm de melhor; todos eles com vinhos feitos a partir da mesma casta mas com perfis tão diferentes quanto eles. Este ano o programa inclui diversas iniciativas, nomeadamente na Quinta das Bágeiras, de Mário Sérgio, será possível, por exemplo, visitar a cave de generosas dimensões com uma enorme quantidade de espumantes armazenados; não fosse o caso deste ser um grande produtor da região.
Já no espaço da marca Sidónio de Sousa, de Paulo Sousa, em Ancas, destaque para o lançamento do Reserva 2019; e na Quinta da Vacariça os visitantes podem ficar a par das práticas biodinâmicas na vinha e na adega. Também Luís Pato tem desenhadas visitas à vinha para mostrar algumas práticas de agricultura sustentável, entre outras iniciativas em torno dos vinhos Baga que, considera, “são produzidos com cada vez mais qualidade” e ganham maior notoriedade.