A primeira derrota de Donald Trump

  Há quatro meses, o Partido Liberal - que dominou o panorama político do Canadá durante mais de dois terços do século XX - parecia irremediavelmente condenado ao desaire eleitoral. A 6 de Janeiro, demitiu-se o primeiro-ministro Justin Trudeau, no cargo desde 2015. Em quebra drástica de popularidade, foi substituído pelo economista Mark Carney, antigo presidente do Banco do Canadá e do Banco de Inglaterra. Já em cenário pré-eleitoral, num momento em que as sondagens atribuíam uma vantagem de 25 pontos percentuais ao Partido Conservador, histórico rival dos liberais. Os dados pareciam lançados. Até Donald Trump entrar em cena. Mal tomou posse a 20 de Janeiro, na senda do que já afirmara durante a corrida eleitoral norte-americana (quando chamava «governador Trudeau» ao chefe do Governo), ameaçou anexar a nação vizinha, transformando-a no «51.º estado dos EUA». E decretou pautas aduaneiras de 25% às importações de produtos deste país. Quebrando uma longa, estável e frutuosa parceria vigente na América do Norte. Carney, sem sombra de temor reverencial ao inquilino da Casa Branca, enfrentou estas ameaças à soberania e à economia do seu país com palavras vigorosas e contundentes, despertando o nacionalismo canadiano que parecia adormecido: «Trump will never break us.» Enquanto o seu rival conservador Pierre Poilièvre, próximo de Trump em termos ideológicos, ia titubeando. Quando tentou reagir, já era tarde. Mais de 60% dos canadianos passaram a boicotar os produtos importados dos EUA. Valia muito mais do que uma sondagem, como se viu. Trump, com a sensibilidade de um rinoceronte, conseguiu num par de meses afundar a maré conservadora e oferecer de bandeja o triunfo eleitoral aos liberais, que no início do ano nenhum analista político antevia. Carney emerge das urnas, nestas legislativas de 28 de Abril, como justo e categórico vencedor. Foi a primeira derrota geopolítica do sucessor de Joe Biden, empossado há cem dias. Está muito longe de ser a última.

Mai 1, 2025 - 11:27
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A primeira derrota de Donald Trump

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Há quatro meses, o Partido Liberal - que dominou o panorama político do Canadá durante mais de dois terços do século XX - parecia irremediavelmente condenado ao desaire eleitoral. A 6 de Janeiro, demitiu-se o primeiro-ministro Justin Trudeau, no cargo desde 2015. Em quebra drástica de popularidade, foi substituído pelo economista Mark Carney, antigo presidente do Banco do Canadá e do Banco de Inglaterra. Já em cenário pré-eleitoral, num momento em que as sondagens atribuíam uma vantagem de 25 pontos percentuais ao Partido Conservador, histórico rival dos liberais.

Os dados pareciam lançados. Até Donald Trump entrar em cena. Mal tomou posse a 20 de Janeiro, na senda do que já afirmara durante a corrida eleitoral norte-americana (quando chamava «governador Trudeau» ao chefe do Governo), ameaçou anexar a nação vizinha, transformando-a no «51.º estado dos EUA». E decretou pautas aduaneiras de 25% às importações de produtos deste país. Quebrando uma longa, estável e frutuosa parceria vigente na América do Norte.

Carney, sem sombra de temor reverencial ao inquilino da Casa Branca, enfrentou estas ameaças à soberania e à economia do seu país com palavras vigorosas e contundentes, despertando o nacionalismo canadiano que parecia adormecido: «Trump will never break us.» Enquanto o seu rival conservador Pierre Poilièvre, próximo de Trump em termos ideológicos, ia titubeando. Quando tentou reagir, já era tarde.

Mais de 60% dos canadianos passaram a boicotar os produtos importados dos EUA. Valia muito mais do que uma sondagem, como se viu.

Trump, com a sensibilidade de um rinoceronte, conseguiu num par de meses afundar a maré conservadora e oferecer de bandeja o triunfo eleitoral aos liberais, que no início do ano nenhum analista político antevia. Carney emerge das urnas, nestas legislativas de 28 de Abril, como justo e categórico vencedor.

Foi a primeira derrota geopolítica do sucessor de Joe Biden, empossado há cem dias. Está muito longe de ser a última.