Período de eleições é mais propício à desinformação, dizem especialistas
Professores universitários e académicos da área da desinformação e comunicação política defendem que as campanhas eleitorais são ambientes mais propícios à circulação de desinformação, com mais investimento por parte de agentes desinformativos. Sara Pina, professora da Universidade Lusófona e Nova de Lisboa, explica que se vive uma quarta fase das campanhas eleitorais “baseada em dados […]


Professores universitários e académicos da área da desinformação e comunicação política defendem que as campanhas eleitorais são ambientes mais propícios à circulação de desinformação, com mais investimento por parte de agentes desinformativos.
Sara Pina, professora da Universidade Lusófona e Nova de Lisboa, explica que se vive uma quarta fase das campanhas eleitorais “baseada em dados das pessoas, em informações sobre os cidadãos”, sendo esta uma característica do fenómeno de “americanização”, em que o “nível da campanha é praticamente individualizado”.
Neste sentido, a docente defende que “a informação falsa é também feita desta forma micro individualizada (…), feita à medida de cada pessoa”.
Na mesma linha de pensamento, o professor João Pedro Batista, da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, considera que a desinformação em Portugal “acaba por ser mais frequente, nomeadamente durante as campanhas eleitorais”, notando neste período um maior investimento por parte dos agentes de desinformação, tendo “a corrupção como um elemento-chave por parte da desinformação”.
Por sua vez, a investigadora de comunicação política da Universidade de Lisboa Susana Salgado diz que “muitas vezes é difícil distinguir entre desinformação e propaganda, especialmente em contextos eleitorais quando circulam muitos conteúdos políticos, mais do que o habitual”.
A investigadora estabelece a diferença entre propaganda e desinformação, explicando que propaganda significa informação apresentada de forma tendenciosa, para passar uma imagem positiva de um partido ou candidato, enquanto a desinformação “são conteúdos falsos criados deliberadamente”, sendo que, “por vezes, é complicado distinguir entre uma da outra, especialmente quando a desinformação mistura conteúdos falsos com verdadeiros para ser mais credível”.
No caso português, a Susana Salgado menciona “a falta de meios dos jornalistas para desconstruir os conteúdos falsos e tendenciosos”, dizendo que a verificação de factos não é suficiente e por vezes acaba por ter um efeito oposto, acabando por dar mais visibilidade a falsidades.
Já o vice-reitor da Universidade Católica Portuguesa, Nelson Ribeiro, considera que anteriormente era necessário ter uma grande estrutura para produzir desinformação e, consequentemente, um grande investimento para que essa desinformação pudesse circular, sendo que atualmente “o ambiente digital é muito facilitador da circulação de desinformação“, nomeadamente em tempo de eleições.
Imigração e falsas sondagens destacadas por académicos como desinformação
Os académicos consideram também que, na atual campanha eleitoral, a imigração e a circulação de sondagens falsas são os principais temas de desinformação.
Susana Salgado verifica, na atual corrida eleitoral, “a circulação de sondagens falsas nas redes sociais, realizadas por empresas não credenciadas junto da ERC [Entidade Reguladora da Comunicação] e cuja metodologia poderá não ser fidedigna”.
A investigadora de comunicação política da Universidade de Lisboa acrescenta que “a produção de sondagens diárias também não é propriamente uma boa decisão editorial, uma vez que só por si pode ter esse efeito de manipulação (mesmo que não seja propositado)”.
Por seu turno, para João Pedro Batista o tema da imigração procura “normalizar ou legitimar determinados discursos, nomeadamente para criar ambientes de insegurança”, aproveitando este receio para influenciar a estabilidade dos portugueses, referindo que “a desinformação é muito oportunista, no que diz respeito aos temas, à cobertura que se faz e vive muito do momento e da situação”.
Também Sara Pina considera que, “em termos de mensagens recentes da campanha eleitoral, a imigração é um bom exemplo”, explicando que estabelecer uma correlação entre a imigração e o aumento da criminalidade é uma “avaliação causa-efeito ignorante, é errado, é falso, mas muito fácil de se fazer”.
Por sua vez, o vice-reitor da Universidade Católica Portuguesa, Nelson Ribeiro, explica que “há muito eleitorado que sente que o seu estilo de vida está ameaçado e, portanto, é preciso apresentar quem é que são os bodes expiatórios e tem de ser sempre alguém que seja facilmente identificável“, por exemplo os imigrantes.
Se as pessoas já sentem algum desconforto com tema, “mais facilmente vão acreditar em algum conteúdo falso que possa estar a circular”, dizendo “que, outros partidos, nomeadamente o PS e o PSD, durante vários anos ignoraram o tema”, contribuindo para o atual panorama.
“Havia, de facto, uma perceção social de que alguma coisa não estava bem com a imigração. E os dois maiores partidos durante muito tempo disseram: ‘não, está tudo ótimo, não há nenhum problema, está tudo controlado’. Portanto, a partir do momento em que se assume algum descontrolo, isso abre uma brecha para a circulação da desinformação”, disse Nelson Ribeiro.
O vice-reitor concluiu, dizendo que circulam sondagens “baseadas não em factos verdadeiros, mas em factos que são criados”, estando em cima da mesa material desinformativo, nomeadamente na atual campanha eleitoral.