O Almirante
Henrique Gouveia e Melo deu uma entrevista à Rádio Renascença em que anuncia o lançamento formal da sua candidatura a Presidente da República para o próximo dia 29. Desatou tudo aos gritos na tribo comentadeira. Porque esse anúncio «perturba a campanha eleitoral» em curso. Gritam até os membros dessa tribo que passam os dias a clamar contra a campanha, brindada com epítetos pejorativos - "vazia", "inútil", "folclórica", "nada esclarecedora", etc. Ontem nem faltou quem se alarmasse com a data, associando-a ao 28 de Maio de 1926, algo que roça o delírio conspiranóico. Oiço e leio coisas como estas e concluo, cada vez com menos dúvidas cinco anos depois da pandemia: o covid-19 causou sérios transtornos à saúde mental dos compatriotas. Enquanto rasgam as vestes perante o lacónico anúncio de Gouveia e Melo, não esboçam o menor reparo ao pré-candidato presidencial Marques Mendes por fazer declarações quase diárias sobre a situação política. Parecem incapazes de reparar na evidente duplicidade de tratamento mediático: chumbo para um, afago para outro. É tiro que faz ricochete: sem querer, estes comentadores ampliam a popularidade do visado. Enquanto lhe recomendam, com soberba intelectual, que leia a Constituição da República, sobretudo no capítulo dos poderes do Chefe do Estado. Como se ele precisasse. Iludidos com a espuma dos dias, mostram-se incapazes de vislumbrar o essencial: o quadro contemporâneo, português e mundial, favorece mutações no xadrez político. Se os actuais impasses persistirem, uma candidatura vitoriosa do Almirante propiciará a formação de um partido presidencial a partir do Palácio de Belém. Não faltam precedentes, nacionais e estrangeiros. Ramalho Eanes fez o mesmo na recta final do seu mandato, na década de 80, entre acusações de bonapartismo que hoje já quase ninguém recorda. Em 2017 Macron protagonizou, com sucesso, algo semelhante em França. A propósito, convém prevenir os mais distraídos: as mudanças no quadro partidário português estão em marcha há uma década. Mais de um quarto dos actuais deputados (27,3%) integram forças políticas de formação recente. Apertem os cintos de segurança. Pode haver muita turbulência.

Henrique Gouveia e Melo deu uma entrevista à Rádio Renascença em que anuncia o lançamento formal da sua candidatura a Presidente da República para o próximo dia 29. Desatou tudo aos gritos na tribo comentadeira. Porque esse anúncio «perturba a campanha eleitoral» em curso. Gritam até os membros dessa tribo que passam os dias a clamar contra a campanha, brindada com epítetos pejorativos - "vazia", "inútil", "folclórica", "nada esclarecedora", etc.
Ontem nem faltou quem se alarmasse com a data, associando-a ao 28 de Maio de 1926, algo que roça o delírio conspiranóico. Oiço e leio coisas como estas e concluo, cada vez com menos dúvidas cinco anos depois da pandemia: o covid-19 causou sérios transtornos à saúde mental dos compatriotas.
Enquanto rasgam as vestes perante o lacónico anúncio de Gouveia e Melo, não esboçam o menor reparo ao pré-candidato presidencial Marques Mendes por fazer declarações quase diárias sobre a situação política.
Parecem incapazes de reparar na evidente duplicidade de tratamento mediático: chumbo para um, afago para outro.
É tiro que faz ricochete: sem querer, estes comentadores ampliam a popularidade do visado. Enquanto lhe recomendam, com soberba intelectual, que leia a Constituição da República, sobretudo no capítulo dos poderes do Chefe do Estado. Como se ele precisasse.
Iludidos com a espuma dos dias, mostram-se incapazes de vislumbrar o essencial: o quadro contemporâneo, português e mundial, favorece mutações no xadrez político. Se os actuais impasses persistirem, uma candidatura vitoriosa do Almirante propiciará a formação de um partido presidencial a partir do Palácio de Belém.
Não faltam precedentes, nacionais e estrangeiros. Ramalho Eanes fez o mesmo na recta final do seu mandato, na década de 80, entre acusações de bonapartismo que hoje já quase ninguém recorda. Em 2017 Macron protagonizou, com sucesso, algo semelhante em França. A propósito, convém prevenir os mais distraídos: as mudanças no quadro partidário português estão em marcha há uma década. Mais de um quarto dos actuais deputados (27,3%) integram forças políticas de formação recente.
Apertem os cintos de segurança. Pode haver muita turbulência.