Novo papa deve manter o espírito reformador, diz Dom Raymundo Damasceno

Ao CB.Poder, dom Raymundo Damasceno frisa que legado de Francisco, de uma "Igreja em saída", não tem que retroceder

Abr 23, 2025 - 12:09
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Novo papa deve manter o espírito reformador, diz Dom Raymundo Damasceno

O novo papa tem tudo para manter o espírito reformador da Igreja Católica Apostólica Romana — de acolhimento e de diálogo, marcas do pontificado de Francisco. É o que estima o cardeal arcebispo emérito de Aparecida, dom Raymundo Damasceno Assis, que em entrevista, ontem, ao CB.Poder — uma parceria entre o Correio Braziliense e a TV Brasília —, frisou que as mudanças promovidas por Francisco não têm como retroceder.

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"A Igreja está a serviço do mundo e das pessoas, não o mundo a serviço da Igreja. "Não há como regredir. A linha do papa Francisco é inspiradora. É um processo que se iniciou, mas não se chegou a uma conclusão, e que, certamente, o outro papa levará à frente. Cada um tem suas características, mas deve-se prosseguir", lembrou dom Damasceno, na conversa com as jornalistas Denise Rothenburg e Edla Lula.

Para o cardeal, o maior legado do papa recém-falecido está na construção de uma Igreja missionária, uma "Igreja em saída", que vai até à população, está aberta ao diálogo com as periferias e com as pessoas excluídas socialmente. Uma instituição secular que procura, até mesmo, com líderes de outras religiões.

"Ele (Francisco) comparava a Igreja com um hospital de campanha, que acolhe os feridos, os excluídos", disse o religioso.

Encíclicas

Dom Damasceno enfatizou que o legado do papa tem como pilares as encíclicas Laudato Si' e Fratelli Tutti, que abordam, respectivamente, o cuidado com o meio ambiente e a fraternidade entre os povos. Para concretizar aquilo que propunha, Francisco reformou a estrutura da Igreja por meio dos sínodos — assembleias periódicas em que se discutem assuntos considerados de fundamental importância para a instituição.

"É uma partilha muito maior justamente em função da palavra sínodo: caminhar juntos. O que é a Igreja? A Igreja é o povo de Deus", explicou dom Damasceno, acrescentando que a participação, até então inédita, de leigos, mulheres e representantes de outras religiões, foi fundamental para a construção dessa Igreja do acolhimento deixada por Francisco.

Dom Damasceno não arrisca previsões sobre de onde virá o próximo papa, nem antecipa que tipo de perfil terá. Mas lembrou que embora os cardeais italianos ainda sejam maioria, não têm os dois terços necessários para eleger o pontífice.

Na entrevista, dom Damasceno destacou a profunda relação entre Francisco e o Brasil, especialmente durante a Conferência de Aparecida, em 2007. À época, ainda como cardeal Jorge Mario Bergoglio, Francisco presidiu a comissão de redação do documento final do encontro, texto que, segundo dom Damasceno, serviu de base para o programa de governo do pontífice.

"O primeiro documento do papa Francisco, a Evangelii Gaudium, está todo inspirado em Aparecida. É um documento programático", afirmou o cardeal.

A Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e Caribenho de 2007, realizada no Santuário Nacional de Aparecida, reuniu cerca de 200 bispos do continente. Segundo dom Damasceno, Francisco demonstrava dedicação e simplicidade — trabalhava até tarde, pedia refeições leves e se mostrava atencioso com todos.

"Ele era o último a chegar no hotel, por volta das 11h da noite, e só pedia uma sopa. No jantar de despedida dos bispos argentinos, estava me esperando na porta", lembrou.