Lembra-se do filme “Ex Machina”? 10 anos depois do lançamento, os erros e acertos sobre a IA
Há uma década, em 2015, estreava "Ex Machina", um thriller de ficção científica que, à luz dos desenvolvimentos recentes na inteligência artificial (IA) e no comportamento das figuras mais proeminentes das gigantes tecnológicas, parece ter sido mais do que apenas ficção.


Há uma década, em 2015, estreava “Ex Machina”, um thriller de ficção científica que, à luz dos desenvolvimentos recentes na inteligência artificial (IA) e no comportamento das figuras mais proeminentes das gigantes tecnológicas, parece ter sido mais do que apenas ficção.
Escrito e realizado por Alex Garland, o filme apresentava-nos Nathan Bateman (Oscar Isaac), um CEO excêntrico que representa uma versão primitiva do atual “tech bro” alimentado por IA. Bateman convida Caleb (Domhnall Gleeson), um jovem programador da sua empresa, para participar numa experiência com Ava (Alicia Vikander), uma andróide criada com o objetivo de passar um Turing test, ou seja, um teste para determinar se uma máquina poderia exibir comportamentos semelhantes ao da inteligência humana.
Na altura da estreia, o filme conquistou o Óscar de Melhores Efeitos Visuais e uma nomeação para Melhor Argumento Original. Dez anos depois, continua a ser uma das obras de ficção científica mais relevantes para compreender a relação atual entre humanos e inteligência artificial.
IA antes da IA
Muito antes de ChatGPT, Gemini ou Claude, já Garland escrevia sobre linguagem estocástica — o mecanismo que permite respostas variáveis e mais “naturais” nos chatbots atuais. Em 2015, essa abordagem ainda não era dominante, mas foi precisamente essa a tecnologia que Bateman escolheu para Ava.
Hoje, os assistentes de IA não se parecem com Ava, mas falam como ela. O retrato de Bateman como um CEO megalómano, eticamente questionável chegou muito antes das críticas à masculinidade tóxica de Elon Musk ou da perda de reputação de Mark Zuckerberg.
Ao contrário do Zuckerberg antisocial, mas funcional apresentado em The Social Network (2010), Bateman é apresentado como um sociopata sem escrúpulos, que utiliza dados sem consentimento, testa IA sem supervisão e cria apenas andróides femininas com base em perfis de pornografia — como é revelado no filme.
Tudo isto se torna menos ficção e mais real quando olhamos para os últimos anos, em que se somaram escândalos como o da Cambridge Analytica, os processos legais contra a OpenAI e a crescente vigilância dos reguladores sobre empresas que treinam modelos com dados protegidos por direitos de autor.
A questão da personificação das inteligências artificiais, antes confinada a salas de cinema ou seminários de filosofia, tornou-se também, nos últimos anos, um debate real. Ava, ao longo do filme, questiona a legitimidade de seres humanos decidirem sobre se a devem ou não desligar. Mas Garland não pinta um retrato otimista: Ava manipula, escapa, mata Bateman e deixa Caleb preso.
Em 2015, comparar um CEO de uma gigante tecnológica a Oppenheimer parecia exagerado. Mas será que poderíamos associar, por exemplo, Bateman a Sam Altman? Garland foi pioneiro na crítica à indústria e na antecipação de um cenário onde IA, poder e falta de ética caminham de mãos dadas.
Uma década depois, Ex Machina continua a ser um filme visionário e mais atual do que nunca.