Giz Brasil exclusivo: brasileiro da missão DART fala sobre como desviar asteroide 2024 YR4

Gustavo Madeira participou da missão DART e explica como a humanidade faria para desviar o asteroide 2024 YR4. Confira! The post Giz Brasil exclusivo: brasileiro da missão DART fala sobre como desviar asteroide 2024 YR4 appeared first on Giz Brasil.

Mar 12, 2025 - 16:44
 0
Giz Brasil exclusivo: brasileiro da missão DART fala sobre como desviar asteroide 2024 YR4

Em fevereiro, o asteroide 2024 YR4 chegou a ter 3,1% de chances de cair na Terra em dezembro de 2032, levantando o questionamento sobre como iríamos desviar o impacto? Para isso, o Giz Brasil conversou com o astrônomo brasileiro Gustavo Madeira, que participou da missão DART.

A missão DART, da NASA, foi a primeira missão da história desviar um asteroide e é um marco da defesa planetária.

Falando em defesa planetária, desde janeiro, grandes telescópios começaram a coletar dados diários sobre o 2024 YR4 quando as chances de impacto subiram. Além disso, agências espaciais vinculadas à ONU começaram a planejar formas para evitar o impacto do asteroide.

Hoje, Apesar do risco atualmente ser zero, o 2024 YR4 foi o asteroide com maior chance de colidir com a Terra entre todos os asteroides descobertos até agora. O 2024 YR4 entrou no nível 3 da Escala de Turim.

Como informamos aqui no Giz, as chances de colisão eram de uma em 83, justificando a preocupação sobre o impacto. Um dos motivos da preocupação é que a passagem do asteroide ocorrerá em menos de uma década. Caso o risco aumentasse, o cenário seria pior.

As agências espaciais, governos e órgãos internacionais teriam que correr contra o tempo para encontrar uma forma de desviar, ou destruir, o 2024 YR4.

Desviar o 2024 YR4 para evitar colisão com a Terra: principais métodos

Gustavo Madeira, além da missão DART, trabalha na missão Hera, da ESA, que estudará o asteroide Dimorphus após o impacto da missão DART. Madeira é autor de vários estudos sobre o Dimorphus e o Didymos, tanto antes quanto após a missão.

Portanto, o astrofísico brasileiro do Instituto de Física de Paris tem propriedade no assunto, ainda mais porque existem semelhanças entre o Dimorphus e o 2024 YR4.

(Para saber mais sobre os trabalhos de Gustavo Madeira, confira aqui outra entrevista do astrofísico com o Giz.)

Gustavo Madeira explica ao Giz por que as probabilidades de impacto mudam

O paulista Gustavo Madeira participou da missão DART e da recém-lançada Hera. Imagem: Arquivo pessoal

Em menos de um mês, as chances de impacto do 2024 YR4 foram de “preocupantes” a “irrelevantes”. Mas por que isso acontece?

Giz: Por que é tão difícil calcular a probabilidade real de impacto de um asteroide? 

Gustavo Madeira: 

“A resposta é simples: o sistema é caótico. O movimento de todos os corpos de maneira geral são caóticos. Mas um corpo pequeno, como o 2024 YR4, é mais suscetível a outros efeitos, como a radiação solar, gravidade de outros corpos pequenos e o campo magnético de outros planetas. Essa infinidade de efeitos que existem no ambiente ao redor deste corpo [2024 YR4] fazem com que o seu movimento seja caótico.”

Mas, além da necessidade de modelar esses efeitos, já que essas modelagens não são perfeitas, “ainda há o fator do movimento ser intrinsecamente caótico”.

Segundo Madeira, é preciso fazer várias simulações numéricas para extrair as probabilidades de impacto com base no momento das observações. Em seguida, mais simulações numéricas são necessárias para computar essas probabilidades.

No entanto, o astrofísico ressalta que a coisa não para por aí.

“Depois de um tempo, você terá que medir como está aquele sistema novamente e ver o quanto ele diferiu de sua modelagem, assim como as simulações e a modelagem do corpo para obter novas probabilidades”.

E a probabilidade pode aumentar?

Conforme explica o brasileiro, toda vez em que astrônomos refazem simulações, as probabilidades serão diferentes. “O que podemos tirar de conclusão dessas probabilidades é o valor médio”, diz Gustavo sobre as observações do 2024 YR4, que alternaram entre 1 e 3%.

A cada medição, essa probabilidade vai mudar. Isto é um fato”, completa. E, realmente, a probabilidade mudou.

No dia 23 de fevereiro, após 60 dias de observações diárias e cálculos, as chances do 2024 YR4 cair na Terra ‘caíram’ para 0. Mas e se acontecesse o contrário? Como faríamos para desviar o 2024 YR4 e evitar uma possível colisão com a Terra?

O Giz Brasil conta com a expertise de Gustavo Madeira para responder a essa pergunta.

Conseguiríamos lançar uma nova missão DART para desviar o 2024 YR4?

No dia 12 de fevereiro, Robin George Andrews, jornalista e autor de um livro sobre defesa planetária e como evitar impactos de asteroide, publicou uma thread no X (antigo Twitter) explicando porque uma missão aos moldes da DART não funcionaria para desviar o asteroide.

Vale ressaltar que, à época, o 2024 YR4 ainda era motivo de preocupação.

Andrews baseia seu argumento no fato de que o impacto cinético da missão DART poderia não ser a solução para desviar o 2024 YR4 por ter sido um teste.

Mas será que o argumento está correto? A palavra fica com quem participou da missão DART.

Giz: Há outras formas seguras de desviar um asteroide além de um impacto cinético como a missão DART?

“Sim, existem outras formas de desviar um objeto que não sejam por impacto cinético como foi o caso da DART, embora a DART, mesmo sendo um experimento, foi o único teste de uma tecnologia [desvio por impacto cinético] feito até então. Há outros planos [de formas para desviar asteroides], mas que não foram testados”, afirma Gustavo Madeira.

Como o próprio diz – e em consonância com o argumento de Andrews – a DART foi um teste, mas um teste bem-sucedido. Sobre alternativas, Gustavo Madeira cita que “instalar propulsores em um asteroide” é uma opção.

“A energia liberada pelos propulsores daria impulso ao asteroide, que trocaria de rota. No entanto, essa opção não foi testada”. 

Novamente, assim como Andrews, que sugere que um dos métodos seria usar uma ogiva nuclear para explodir o 2024 YR4, Gustavo Madeira enxerga essa alternativa como possibilidade.

No entanto, Madeira cita que essa opção seria para um cenário mais exagerado. E há ressalvas.

“Em um cenário mais exagerado, a opção seria, de fato, explodir esse objeto [2024 YR4]. Colocar uma bomba nuclear, ou algo do tipo [no asteroide]. O problema é que explodir um objeto resulta em centenas de estilhaços e pedaços [no espaço] e consequentemente fornecerá energia e velocidade para esses pedaços. Dependendo das condições, essa opção pode acabar sendo mais catastrófica [que o impacto do 2024 YR4 na Terra] porque você terá um objeto menor, mas muito mais acelerado, com mais energia. Portanto, ele pode causar danos maiores”, destaca Madeira, alertando que essa opção precisa ser minuciosamente calculada por simulações.

Cenário exagerado: como seria uma missão da Terra para desviar o 2024 YR4

A próxima ‘visita’ do YR4 2024 ocorrerá em 2028 e, certamente, resultará em novas probabilidades pelas observações. A visita mais próxima será daqui a sete anos, em dezembro de 2032.

Mas, se as observações de 2025 colocassem a possibilidade de impacto no nível 5 da Escala de Turim, que sugere planos de contingência por parte de governos, será que o tempo estaria ao nosso lado para desviar o 2024 YR4?

O Giz Brasil levanta o questionamento com base na missão DART.

Giz: Quanto tempo levou para planejar, construir e lançar a missão DART?

“A DART começou a ser pensada nos anos 2000, mas a missão foi aprovada apenas em 2011, quando começaram os trabalhos. Ou seja, foram mais de dez anos de preparação e, apesar da tecnologia já ter sido testada, a preparação não deve ser muito mais rápida”. 

De fato, a gênese da DART começou em 2003, quando o matemático Andrea Milani criou o conceito de uma missão para desviar asteroides via impacto cinético.

A DART aconteceu somente em 2022, ou seja: 19 anos depois do conceito de Milani (que não pôde ver o resultado, falecendo quatro anos antes). Veja:

Giz: Para desviar efetivamente o 2024 YR4, precisaríamos de quanto tempo para lançar uma missão?

“Mesmo com a tecnologia já existente, você ainda precisa preparar uma nave e realizar todos os cálculos. Então, a estimativa é em torno de 10 anos. Talvez, em um cenário muito extremo, cinco anos”. 

Ainda bem que a probabilidade diminuiu porque o Brasil poderia ser afetado.

Giz: O Brasil está entre os países que seriam afetados pelo impacto do 2024 YR4 na Terra, conforme uma lista que circulou online. Essa lista é real? Se sim, já é possível prever quais países seriam atingidos com base na trajetória atual do asteroide?

“Eu não conheço a lista, mas a última medição [antes de 26 de fevereiro] mostrava que o asteroide poderia cair entre o Chile e a Argentina. Pela trajetória, ele iria subindo, passando pelo norte do Brasil, pelo oceano. A maior probabilidade [à época] é cair no oceano [Atlântico] porque a maior sombra está no Oceano. Mas, sim, o Norte do Brasil está na área de impacto do oceano”.

Gustavo Madeira afirma que os países afetados na América do Sul seriam Chile, Argentina e Brasil e, talvez, Equador e Suriname.

Brasil e defesa planetária

Por fim, perguntamos ao astrofísico brasileiro se o nosso país participa de algum programa de defesa planetária. Infelizmente, tendo em vista o risco do Brasil ser atingido se o 2024 YR4 colidisse com a Terra, a resposta é “não”.

Para Gustavo Madeira, essa situação é “preocupante porque o Brasil é um país de dimensões continentais”.

“Pelo que ouço, não há perspectiva alguma de o Brasil participar de um programa de defesa planetária”, afirma.

“O Brasil nunca firmou uma colaboração de tal nível, que demanda muito dinheiro e capital, tanto político quanto científico, com outra agência espacial. Nenhuma dessas missões são feitas por uma única agência. A DART, mesmo sendo da NASA, foi feita em conjunto com a ESA. Esses programas não são de um único país, mas o Brasil nunca participou de uma iniciativa assim”.

Giz: Existem algumas colaborações, programas ou iniciativas que possam incluir o Brasil? Por exemplo, algo com os países do BRICS, já que Rússia, China e Índia têm programas espaciais estabelecidos, ou até mesmo qualquer outro tipo de aliança geopolítica?

“Pelo que vejo, há sim. Várias agências são favoráveis à colaboração com o Brasil. A ESA é a favor de uma colaboração [com o Brasil], as agências espaciais indiana e chinesa também. A NASA, com Trump no poder, já não sei mais. Mas, na verdade, o que falta é iniciativa por parte do Brasil. A FAPESP já entrou em grandes iniciativas, como de grandes telescópios, mas o MCTI (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações) nunca participou de algo grandioso”, finaliza.

Assine a newsletter do Giz Brasil

The post Giz Brasil exclusivo: brasileiro da missão DART fala sobre como desviar asteroide 2024 YR4 appeared first on Giz Brasil.