Família de motorista morto em acidente que matou 39 receberá R$ 570 mil

Motorista trabalhava na empresa de transportes havia 21 dias quando aconteceu o acidente que matou 39 pessoas; indenização foi definida pela Justiça do Trabalho

Abr 28, 2025 - 15:50
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Família de motorista morto em acidente que matou 39 receberá R$ 570 mil

A Justiça do Trabalho de Caratinga, em Minas Gerais,  publicou duas sentenças envolvendo o acidente que matou 39 pessoas na BR-116, em dezembro de 2024. Nas duas ações, o juiz Guilherme Magno Martins de Souza determinou a indenização de familiares do motorista morto na tragédia.

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O magistrado reconheceu a responsabilidade objetiva da empresa EMTRAM – Empresa de Transportes Macaubense Ltda, com base na natureza de risco da atividade de transporte rodoviário de passageiros, nos termos do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil.

O juiz determinou, no primeiro processo, movido por dois filhos menores do motorista morto, representados pelas mães, indenizações no total de R$ 360 mil, além de uma pensão mensal.

Já a segunda decisão envolveu os pais e três irmãos do motorista. Nesse caso, o julgador fixou o total de R$ 210 mil em indenizações. Ainda que o laudo da Polícia Rodoviária Federal (PRF) tenha apontado falhas graves por parte do caminhão envolvido, como excesso de carga, pneus desgastados e velocidade acima do permitido, o magistrado entendeu que esses fatores não afastam a obrigação da empresa de ônibus de indenizar os familiares do motorista morto, pois fazem parte dos riscos previsíveis da atividade.

Quando o acidente aconteceu, o motorista trabalhava na empresa há apenas 21 dias. 

Na sentença, o juiz do Trabalho explicou que os motoristas de ônibus, especialmente aqueles que operam em linhas interestaduais, percorrendo longos trajetos, como era o caso da vítima, estão expostos a um risco elevado de acidentes de trânsito, superior à média dos motoristas comuns.

“Isso ocorre porque, em sua rotina diária, enfrentam diversas situações desfavoráveis relacionadas às condições de tráfego, às pistas de rolamento frequentemente em más condições, ao clima e ao comportamento imprudente de outros condutores e pedestres”, enfatizou o julgador.

Mesmo com o reconhecimento da culpa do motorista da carreta, o juiz entendeu que a empresa empregadora do motorista de ônibus morto deve responder objetivamente, pois o transporte rodoviário é atividade de risco, o que atrai o dever de indenizar, independentemente de culpa direta.

No primeiro processo, movido por dois filhos menores do motorista morto, de 9 e 17 anos, o juiz fixou a indenização de R$ 120 mil para cada filho por dano moral em ricochete (sofrimento pela perda do pai), R$ 120 mil por dano-morte, quantia a ser dividida entre os dois filhos menores do motorista morto e pensão mensal correspondente ao valor da última remuneração da vítima até que os menores completem 24 anos de idade, com garantia por constituição de capital.

Segundo o magistrado, os valores das indenizações deverão ser depositados em caderneta de poupança, assegurando a proteção financeira dos beneficiários. A justiça gratuita foi concedida e a empresa também foi condenada a pagar os honorários dos advogados dos autores.

A segunda decisão envolveu os pais e três irmãos do motorista morto, o juiz reconheceu o dano moral indireto. O julgador fixou os valores de R$ 30 mil para cada irmão e R$ 60 mil para o pai e R$ 60 mil para a mãe do trabalhador falecido, totalizando R$ 210 mil.

A decisão destacou o abalo emocional causado pela tragédia, especialmente por ter ocorrido às vésperas do Natal, e considerou os vínculos afetivos comprovados entre os autores e o motorista morto. A justiça gratuita foi concedida e a empresa foi condenada a pagar os honorários dos advogados dos autores.

O acidente

A tragédia ocorreu na madrugada do dia 21 de dezembro, quando o ônibus da empresa Emtram colidiu com a carreta, que transportava um bloco de granito e vinha no sentido contrário. O coletivo havia saído de São Paulo com destino à Bahia e transportava 45 passageiros. Um carro de passeio que vinha atrás bateu na traseira do caminhão.

O motorista da carreta, que fugiu do local, alega que o pneu do coletivo estourou e a perda de controle do veículo causou o acidente. Ele se entregou à polícia dois dias depois da ocorrência, em 23 de dezembro, na sede do 15º Departamento de Polícia Civil, em Teófilo Otoni, acompanhado de advogados, e foi liberado em seguida. Segundo a defesa, o condutor deixou o local sem prestar socorro por ter entrado em estado de pânico.

Durante o depoimento, a perícia da Polícia Civil coletou amostras de urina para realização de exames clínicos. Os resultados apontaram o uso de álcool e drogas. Entre elas, cocaína e ecstasy. Além disso, a investigação apontou que, em ocasiões anteriores, ele foi abordado por policiais e demonstrava sintomas de embriaguez.

A defesa do motorista nega que ele tenha feito o uso de drogas e promete questionar essa prova da Polícia durante o processo judicial. No entanto, segundo o juiz Danilo de Mello Ferraz, da 1ª Vara Criminal da Comarca de Teófilo Otoni, a prisão foi determinada por outros fatores como ausência do motorista no local do acidente, o sobrepeso da carga da carreta, a ausência de conferência das condições de transporte da carga pelo motorista, o excesso de velocidade do veículo, a jornada exaustiva de viagem, a falta de descanso adequado.

Motorista e empresa responderão por homicídio

Em fevereiro, a Polícia Civil concluiu o inquérito sobre o acidente e indiciou o motorista da carreta que carregava os blocos de granito e o dono da empresa de transportes por homicídio. Segundo o delegado Amaury Albuquerque, as investigações constataram que o caminhão que transportava granito carregava 103 toneladas, o que representa 77% de sobrepeso permitido para o semirreboque. Além disso, o caminhão estava a 97 km/h, muito acima do ideal, de 60 km/h, conforme informado pelos policiais.

Além desses fatores, a modificação estrutural do veículo também contribuiu para o sinistro. O delegado compara a dimensão da tragédia com um acidente de avião, que pode deixar muitas vítimas. Segundo Amaury, crianças e bebês morreram, assim como outras que sobreviveram, perderam os pais, intensificando o empenho da PCMG nas investigações.

O delegado César Cândido Neves Júnior informou que o motorista vai responder por dolo eventual, isto é, pelo homicídio de 39 pessoas, lesão corporal simples de 11 pessoas e lesão corporal grave de três pessoas, fuga do local e omissão de socorro. Ele não foi indiciado por uso de drogas psicoativas, pois, embora tenha sido comprovado por testes toxicológicos, isso entrará como agravante nos demais crimes. Já o dono da empresa também vai responder por homicídio, lesão corporal simples e grave, além de delito por falsidade ideológica, uma vez que documentos foram falsificados.