Consumidor racional 2.0: Diferente da geração pós-2008
Opinião de Mário Barros, Cluster Operations manager da Ingka Centres para o Sudoeste da Europa.


Por Mário Barros, Cluster Operations manager da Ingka Centres para o Sudoeste da Europa e membro da direção da Associação Portuguesa de Centros Comerciais.
Os hábitos de consumo são fortemente influenciados pela inflação, pelas taxas de emprego, mas principalmente pelo rendimento disponível de cada consumidor.
Nos últimos anos, eventos como a pandemia, a crise do custo de vida e os diversos conflitos globais, tanto os que estão em curso, como os futuros – refiro-me à incerteza relativamente às tarifas que estão a ser aplicadas, bem como ao seu impacto na cadeia de consumo, além do efeito inflacionista que podem ter – têm gerado preocupações e tensões que afetam a economia e a atitude dos consumidores. Em tempos de crise, nós, consumidores, tendemos a ser mais prudentes com os gastos, preferindo produtos que ofereçam um custo-benefício melhor, ou oportunidades de compra com desconto.
Comparar a crise do subprime com a crise inflacionista atual pode ajudar-nos a identificar como diferentes contextos económicos podem influenciar o comportamento dos consumidores e o respetivo impacto no retalho.
Crise do subprime (2007-2008)
A crise do subprime foi desencadeada pela concessão de empréstimos hipotecários de risco elevado. Esta crise resultou numa recessão severa, com milhões de pessoas a perder o seu emprego e muitas empresas a falir. Portugal viu a sua taxa de desemprego subir até aos 17,5% (2012), vindo de uma taxa de desemprego estrutural entre 6 e 7% e o pior índice de confiança do consumidor desde 1990.
Impacto no retalho: redução do consumo. A recessão levou a uma queda significativa no consumo, só superada pelo Covid-19.
Crise inflacionista atual
Esta crise foi impulsionada por vários fatores globais, incluindo a pandemia de Covid-19, a guerra na Ucrânia, interrupções na cadeia logística e aumentos nos preços de energia. A inflação disparou em muitos países, incluindo Portugal, onde os preços dos alimentos aumentaram significativamente. No entanto, não vimos, pelo menos ainda, nenhum sinal forte de que a confiança do consumidor, a taxa de emprego ou ainda as vendas de retalho vão sofrer mudanças significativas no futuro próximo.
Impacto no retalho: aumento dos Preços. Embora a inflação tenha levado ao aumento nos preços dos produtos, as vendas do retalho continuaram a subir.
Se bem que o resultado final possa ser similar, com uma limitação do rendimento disponível, a mudança no comportamento do consumidor poderá ser bem diferente. Enquanto que na crise do subprime surgiu o cliente funcional, que priorizava o preço e a busca do menor valor possível, o que antevejo perante o cenário atual é um consumidor que, embora esteja muito mais sensível ao preço e procure economizar onde é possível, vai procurar valor e terá um processo de compra muito mais pensado.
Tal parece indicar também o white paper da Euromonitor “Top Global Consumer Trends 2025”, relativo a padrões de compra realizados em 2024, onde 57% dos consumidores pesquisaram exaustivamente os produtos antes de os comprar e apenas 18% admitiram fazer compras por impulso. Dentro das cinco tendências globais para 2025, a Euromonitor identificou as seguintes: Wiser Wallets, Healthspan Plans, Eco Logical, Filtered Focus e AI Ambivalent.
E como captar este cliente? Cada vez mais estruturado, com melhores ferramentas, sensível ao preço e focado no valor. E que procura aquele que para si é o melhor negócio (que poderá ser diferente para outro consumidor). Provavelmente dirigindo-nos a este consumidor falando também na qualidade do produto, da sua pegada ambiental e dos benefícios futuros que podem vir a ser proporcionados.
Um exemplo poderia ser a campanha global da Ingka Centres sobre o “sono”, onde pretendemos ancorar e promover a oferta dos nossos lojistas relativamente a artigos para o lar – nomeadamente para os quartos – mas partindo do valor da utilização desses produtos no dia-a-dia dos nossos clientes. O preço em si é relevante, mas o valor de uma noite bem dormida é priceless!
Tanto a crise do subprime quanto a crise inflacionista atual destacam algo muito simples: a grande importância de compreender o ambiente que nos rodeia, para que possamos adaptar-nos da melhor forma possível ao comportamento do consumidor.