Concentração das exportações portuguesas agravou-se numa década. 20 países pesam 85% do total
A mudança brusca na política comercial dos EUA colocou em evidência a necessidade de diversificar os destinos das exportações. No entanto, não tem sido esse o caminho feito por Portugal. De acordo com cálculos do ECO, os 20 países para os quais Portugal mais exportou em 2024 representaram 85% do valor total de vendas de […]


A mudança brusca na política comercial dos EUA colocou em evidência a necessidade de diversificar os destinos das exportações. No entanto, não tem sido esse o caminho feito por Portugal. De acordo com cálculos do ECO, os 20 países para os quais Portugal mais exportou em 2024 representaram 85% do valor total de vendas de bens ao exterior. Dez anos antes o peso não chegava aos 80%.
Os cálculos do ECO indicam que a concentração de exportações nos 20 maiores destinos agravou-se numa década. Se em 2014 o peso de duas dezenas de destinos de exportações era de 79,6% do valor total, em 2024 subiu para 85%. Uma tendência que também se verificou no peso dos cinco primeiros destinos. De 58% em 2014, aumentou para 61,7% em 2024.
O cenário apenas se inverte caso se analise o peso dos dez primeiros destinos, tendo o peso no total reduzido de 79% para 75,4%.
“50% do que exportamos em termos de bens tem somente três clientes: Espanha, Alemanha e França. E é fácil de perceber porquê: Espanha está mesmo já aqui ao lado. Ao passo que a Alemanha e a França são as duas maiores economias da União Europeia“, destaca Ricardo Ferraz, professor no ISEG e na Universidade Lusófona em declarações ao ECO
Nota: Se está a aceder através das apps, carregue aqui para abrir o gráfico.
Os países europeus são o destino preferencial dos bens vendidos ao exterior. Em 2024, por exemplo, no ‘top 10’ das exportações portuguesas, sete países eram europeus: Espanha, Alemanha, França, Itália, Países Baixos, Bélgica e Polónia. Este conjunto representava 83% do valor total exportado pelos 10 primeiros destinos de exportação nesse ano e 62,6% do valor total arrecadado pelo país em vendas ao estrangeiro.
Um retrato que o diretor do gabinete de estudos do Forúm para a Competitividade considera “preocupante“. Para Pedro Braz Teixeira, “existe um excesso de concentração das exportações portuguesas na UE, o que se agravou, segundo os dados do ECO”, alerta.
Em 2024, o peso das exportações para Espanha ascendeu a 25,9% do total da venda de bens de Portugal ao exterior, um aumento de 2,45 pontos percentuais (pp.) face a 2014. A tendência de subida, embora em menor dimensão (0,7 pp. e 0,3 pp.), também se verificou no caso das exportações para a Alemanha e para França, para 12,4% e 12,1%, respetivamente.
Pedro Braz Teixeira argumenta que a União Europeia “é das zonas mais anémicas do mundo em termos de crescimento e ter as exportações concentradas numa zona que cresce pouco não é bom para o país“, recordando que o Produto Interno Bruto (PIB) da região avançou 1% no ano passado.
“Há duas vertentes nesta questão: o tamanho da economia e o seu dinamismo. Interessa-nos estar nas economias maiores, porque o mercado desses países é muito grande, e depois porque lá entrando essa economia quase cresce por si. Ao fim de dez, cinco anos a diferença é gigantesca”, defende o economista, que aponta para a importância de apostar no comércio com potências como a China e a Índia.
Nota: Se está a aceder através das apps, carregue aqui para abrir o gráfico.
Ricardo Ferraz destaca que os mercados europeus são “mais atractivos para uma boa parte das nossas exportadoras, daí que em conjunto tenham um elevado peso“, o que considera “normal”. No entanto, considera que “isso não quer dizer que as empresas se devam acomodar e que não devam procurar conquistar novos mercados promovendo os seus produtos junto de novos clientes“.
“Diversificar é positivo”, afirma, acrescentando que, por exemplo, “dada a instabilidade e a imprevisibilidade que parecem nortear atualmente o rumo da política económica norte-americana, faz todo o sentido que as empresas que estão muito dependentes desse mercado procurem, se ainda não fizeram, conquistar novos mercados por forma a reduzir o risco“.
Um risco apontado por instituições como o Banco de Portugal. A instituição liderada por Mário Centeno estima que o impacto global da guerra de tarifas, e consequente aumento da incerteza, poderá levar a uma redução cumulativa do PIB português de cerca de 1,1% no final de três anos, com os efeitos concentrados nos dois primeiros anos. Neste cenário adverso, a economia portuguesa cresce apenas 1,4% este ano, ao invés dos 2,3% estimados no cenário base.
No “Boletim Económico de dezembro, a instituição já considerava “importante reforçar o apoio às empresas na procura de novos mercados, promover o investimento direto estrangeiro e continuar a flexibilizar a alocação de recursos na economia”.
Um dos destinos cujo peso tem crescido na canalização de bens portugueses pode representar agora um desafio. O peso das exportações para os Estados Unidos subiu de 4,4% em 2014 para 6,71% em 2024. No ano passado, entre os bens com maior representatividade destacaram-se os produtos farmacêuticos (22%), os combustíveis líquidos (20%), a borracha e artigos relacionados (7%) e o equipamento e maquinaria elétrica (6%).
No contexto europeu, Portugal é, ainda assim, um dos Estados-membros com menor nível de exposição à economia norte-americana, com 2,5% do PIB direta e indiretamente exposto à procura final nos EUA, recordou o Conselho das Finanças Públicas (CFP). A instituição liderada por Nazaré da Costa Cabral estima que, em conjunto, o impacto direto, sem contar com efeitos de confiança, poderá alcançar os -0,5% do nível do PIB.
Pedro Braz Teixeira realça que “os Estados Unidos estavam a ser um dos elementos de diversificação das exportações, pelo que este problema surgir agora não podia ser pior“.
No plano deste ano, a AICEP previa concentrar este ano a maior parte das ações de promoção externa nos Estados Unidos, estando previstas 15 ações em terras do Tio Sam, que rivalizam com as 12 previstas em França e dez na Alemanha. O plano tem contemplados 15 roadshows, sete missões empresariais, sete campanhas de promoções entre participações em feiras, fóruns, organização de eventos e feiras.