Um ano com D. Dinis (21)
Devido à sua política de centralização de bens na Coroa, D. Dinis teve muitos problemas com a nobreza e o clero. Um prelado que exerceu forte oposição foi D. Vicente, bispo do Porto, por sinal, padrinho do Rei Trovador. Aqui, uma cena do meu romance: Em finais de Junho, Dinis deslocou-se ao Porto, onde o bispo D. Vicente o recebeu no seu Paço, no ponto mais alto do burgo sobranceiro ao rio Douro. O rei tentava contemporizar, mas o velho bispo mostrava-se intransigente. O monarca comprometera-se a não levantar obstáculos aos eclesiásticos no que se referia a adquirirem bens de raiz e, entretanto, já havia promulgado duas leis de desamortização dos bens do clero. Era um escândalo, declarava D. Vicente furioso. E não estava sozinho. Junto com os bispos D. João Martins da Guarda, D. Egas de Viseu e D. João de Lamego preparava um libelo com mais acusações contra a Coroa, a fim de o enviar ao papa. Dinis pretendia evitar tal procedimento a todo o custo: - Estou certo de que conseguiremos resolver o assunto entre nós. - Não vejo como, Alteza. Se, passados três anos sobre a Concordata, ainda nos encontramos neste ponto, dificilmente a situação se modificará. O velho clérigo, ao abrigo da sua idade e da sua experiência, não se deixava intimidar. Fizera frente ao pai e nada o impedia de o fazer ao filho. Dinis insistiu: - Presumo que não estareis interessado num novo interdito, depois do trabalho que deu levantá-lo. Seria uma desgraça para o reino. Vós, como homem da Igreja, vedes certamente ainda mais desvantagens nisso do que eu… - Como homem da Igreja, D. Dinis, estou preparado para aceitar qualquer castigo que o pontífice resolva impor. O reino sobreviveu a mais de vinte anos de interdito e não deixou de ser cristão. Se for essa a única maneira de acabar com as inquirições abusivas e as escandalosas leis de desamortização, que seja! D. Vicente era um osso duro de roer. E Dinis estava cheio do Porto, nunca achara grande beleza no cinzentismo das construções de granito e do próprio Douro, entalado naquele desfiladeiro. E não se livrava da humidade peganhenta. Mesmo agora, no pino do Verão, chovia quase todos os dias.

Devido à sua política de centralização de bens na Coroa, D. Dinis teve muitos problemas com a nobreza e o clero. Um prelado que exerceu forte oposição foi D. Vicente, bispo do Porto, por sinal, padrinho do Rei Trovador. Aqui, uma cena do meu romance:
Em finais de Junho, Dinis deslocou-se ao Porto, onde o bispo D. Vicente o recebeu no seu Paço, no ponto mais alto do burgo sobranceiro ao rio Douro. O rei tentava contemporizar, mas o velho bispo mostrava-se intransigente. O monarca comprometera-se a não levantar obstáculos aos eclesiásticos no que se referia a adquirirem bens de raiz e, entretanto, já havia promulgado duas leis de desamortização dos bens do clero. Era um escândalo, declarava D. Vicente furioso. E não estava sozinho. Junto com os bispos D. João Martins da Guarda, D. Egas de Viseu e D. João de Lamego preparava um libelo com mais acusações contra a Coroa, a fim de o enviar ao papa.
Dinis pretendia evitar tal procedimento a todo o custo:
- Estou certo de que conseguiremos resolver o assunto entre nós.
- Não vejo como, Alteza. Se, passados três anos sobre a Concordata, ainda nos encontramos neste ponto, dificilmente a situação se modificará.
O velho clérigo, ao abrigo da sua idade e da sua experiência, não se deixava intimidar. Fizera frente ao pai e nada o impedia de o fazer ao filho.
Dinis insistiu:
- Presumo que não estareis interessado num novo interdito, depois do trabalho que deu levantá-lo. Seria uma desgraça para o reino. Vós, como homem da Igreja, vedes certamente ainda mais desvantagens nisso do que eu…
- Como homem da Igreja, D. Dinis, estou preparado para aceitar qualquer castigo que o pontífice resolva impor. O reino sobreviveu a mais de vinte anos de interdito e não deixou de ser cristão. Se for essa a única maneira de acabar com as inquirições abusivas e as escandalosas leis de desamortização, que seja!
D. Vicente era um osso duro de roer. E Dinis estava cheio do Porto, nunca achara grande beleza no cinzentismo das construções de granito e do próprio Douro, entalado naquele desfiladeiro. E não se livrava da humidade peganhenta. Mesmo agora, no pino do Verão, chovia quase todos os dias.