Quando um evento exclui pessoas, ele fracassa como experiência
Eventos são espaços de conexão, negócios, cultura e inovação. Mas, quando não são acessíveis, eles falham no que deveriam ser: inclusivos, representativos e humanos. Não é somente sobre ser uma pessoa com deficiência. É sobre todas as pessoas que são sistematicamente excluídas de espaços, eventos, experiências que deveriam ser universais. Esse é o tema do capítulo que eu escrevi no livro: “Diversidade e Inclusão em eventos”, que está sendo lançado e que traz... O post Quando um evento exclui pessoas, ele fracassa como experiência apareceu primeiro em Meio e Mensagem - Marketing, Mídia e Comunicação.


(Crédito: Shutterstock)
Eventos são espaços de conexão, negócios, cultura e inovação. Mas, quando não são acessíveis, eles falham no que deveriam ser: inclusivos, representativos e humanos.
Não é somente sobre ser uma pessoa com deficiência. É sobre todas as pessoas que são sistematicamente excluídas de espaços, eventos, experiências que deveriam ser universais.
Esse é o tema do capítulo que eu escrevi no livro: “Diversidade e Inclusão em eventos”, que está sendo lançado e que traz uma reflexão importante sobre como a falta de acessibilidade pode levar à ruína um evento antes mesmo de começar.
Mesmo em eventos e espaços para onde sou convidada para debates, apresentações e onde minha presença deveria ser planejada, eu enfrento barreiras que ninguém percebe.
Ao circular por uma feira de negócios, eu quis entrar em um estande e não consegui porque havia um degrau. Inúmeras vezes, quando há rampas, ficam escondidas e ocupadas por outras pessoas para quem preciso sempre pedir licença para acessar.
De que adianta um estande incrível, cheio de telas de led, brindes tecnológicos e discursos sobre “futuro”, se não há uma rampa para que eu e tantas outras pessoas possam acessar? O que adianta um palco com keynote speakers falando de ESG, se não fazem autodescrição ou não há intérprete de Libras?
O que adianta um coffee break sofisticado se eu não consigo alcançar a mesa ou me servir sozinha? Não são detalhes. São o centro da experiência. E ignorá-los transforma o que poderia ser uma vitrine de inovação em um palco de discriminação.
Na maioria das vezes eu, uma mulher que fala de inclusão o tempo todo, desisto, porque ninguém deveria ter que se humilhar para acessar um espaço público de um evento.
O direito de acessar qualquer espaço em igualdade de condições com as demais pessoas está garantido na Lei Brasileira de Inclusão (Lei 13.146/2015). Ignorar esse direito não é só uma falta de empatia. É uma infração grave que pode resultar em multa, processo judicial e, principalmente, um dano irreversível à imagem da marca.
Certamente, em algum momento da vida, você já sentiu a sensação de “não pertencer”. Agora, imagine “não pertencer” o tempo todo, em todos os espaços. Essa é a realidade de nós, pessoas com deficiência. Pertencer é não precisar se esforçar para estar em um espaço. É viver uma experiência por inteiro, com liberdade, segurança, dignidade e autonomia.
A verdade é que incluímos intencionalmente ou excluímos consequentemente. Em eventos, congressos, estandes e ativações a falta de intenção de incluir fica muito evidente.
Quando alguém pensou em colocar uma máquina fotográfica para ativação de marca em um estande, para fotografar e imprimir fotos na hora, certamente não pensou: “vamos posicionar a câmera e a tela em uma altura que impeça pessoas que usam cadeira de rodas ou pessoas com nanismo de participar”. É claro que não! Porém, a pessoa que idealizou não pensou intencionalmente em incluir pessoas com deficiência, ela considerou “pessoas padrão”, aquelas que medem entre 1,50m e 1,80m — e, sem perceber, excluiu todas as outras. Daí, entendo que a mensagem que a marca ou o espaço traz é que esse espaço, essa experiência, não foi feita para mim.
Mesmo sem intenção, o fato é que me excluíram. Por isso, se não pensamos intencionalmente na pessoa com deficiência desde o planejamento inicial do evento, estamos automaticamente dizendo que as pessoas com deficiência não são bem-vindas.
Esses episódios, além de causar constrangimento, reforçam o estereótipo de “coitadinha”, “dependentes” e “incapazes” das pessoas com deficiência. A acessibilidade, para ser efetiva, precisa ser pensada de forma ampla e estratégica. A pessoa com deficiência deve conseguir acessar um estande, um palco de um evento; inscrever-se no site acessível do evento, circular com autonomia; compreender o conteúdo completo com audiodescrição, legendas ou recursos de comunicação adequados.
Caso contrário, o evento falhou em promover a inclusão real e em cumprir a legislação, que estabelece a acessibilidade como direito e obrigação, não como concessão ou esforço pontual.
Não é apenas rampa ou Libras no palco. O conceito é amplo, atua em diferentes dimensões. No livro “Acessibilidade e suas Dimensões”, Romeu Sassaki detalha as dimensões: arquitetônica, comunicacional, metodológica, instrumental, programática, atitudinal e natural. O mesmo autor destaca o conceito como não estático e em desenvolvimento constante, ou seja, o número de dimensões pode evoluir, principalmente com a rápida expansão da tecnologia e da inteligência artificial.
Um evento acessível requer: planejamento inicial; atração intencional de público com deficiência; inscrição inclusiva; infraestrutura que garanta que todas as pessoas possam entrar, circular e participar do evento com autonomia, conforto e segurança; comunicação para garantir acesso pleno à informação, ao conteúdo e à interação; equipe e operação preparada para acolher, orientar e agir com empatia e atitude inclusiva; segurança e emergência para garantir proteção de todas as pessoas em igualdade de condições, feedback e avaliação com o intuito de escutar, aprender e melhorar continuamente a experiência das pessoas com deficiência.
A acessibilidade ainda é cercada de mitos, como “custa caro”, “é difícil de implementar”, “quase ninguém usa”. Essas são frases comuns no universo dos eventos, muitas vezes usadas como justificativa para a ausência de ações concretas.
Acessibilizar é, sim, um processo que exige dedicação, esforço e investimento. Por isso, as desculpas para não fazer costumam ser recorrentes. Mas quando há convicção sobre a importância da inclusão, o que antes parecia obstáculo passa a ser entendido como parte do caminho, e os ganhos superam em muito os custos.
O mundo precisa de eventos mais acessíveis. E eventos acessíveis precisam de pessoas comprometidas. Gente que escolhe todos os dias repensar padrões. A minha experiência diz que é possível. Que com coragem institucional, escuta ativa e alianças consistentes, a transformação acontece. E que acessibilidade, quando colocada no centro do planejamento, deixa de ser obstáculo e vira diferencial competitivo, potência humana e legado de justiça social.
O post Quando um evento exclui pessoas, ele fracassa como experiência apareceu primeiro em Meio e Mensagem - Marketing, Mídia e Comunicação.