Papa Francisco: O influencer inesperado que transformou o branding do Vaticano
Os media chamaram-lhe "Papa do Povo", uma marca que também circulou nas redes sociais para transformar o Papa Francisco num ícone que simbolizava os ideais progressistas da cultura popular dos anos 2010.


Das selfies papais às imagens virais de IA generativas com um casaco elegante, o Papa Francisco tornou-se, ao longo do seu papado, uma figura proeminente da cultura popular.
Os media chamaram-lhe “Papa do Povo”, uma marca que também circulou nas redes sociais para transformar o Papa Francisco num ícone que simbolizava os ideais progressistas da cultura popular dos anos 2010.
A eleição em 2013 foi significativa por muitas razões, incluindo o facto de se ter tornado o primeiro jesuíta e o primeiro papa da América Latina. A ascensão ao papado representou uma tentativa da Igreja Católica de se reinventar através da imagem pública “progressista” de Francisco.
A Igreja Católica, enquanto marca institucional, tem estado no centro de inúmeros escândalos e controvérsias após ter cometido graves injustiças durante gerações. O Papa Francisco, por outro lado, tornou-se aquilo a que o especialista em branding Douglas Holt chama de “marca icónica”. São entidades que servem como símbolos poderosos que refletem mitos e ideais culturais.
Tal como os políticos ou as celebridades, os papas também precisam de branding para desenvolver as suas identidades públicas.
Os pontífices sempre foram alvo de branding, o que os torna objetos únicos de fascínio público e cultura popular. As decisões sobre que sapatos usar e que nome papal adotar são, na verdade, atos de branding.
O Papa Francisco escolheu o seu nome papal para se alinhar com São Francisco de Assis. Escolheu também usar uma batina branca simples para a sua primeira aparição pública na varanda da Basílica de São Pedro. Estas decisões foram estratégias de branding.
O uso das redes sociais por Francisco levou o papado a uma nova era digital. Isto deu-lhe uma plataforma para construir a sua marca de forma semelhante à dos políticos.
A sua adoção da tecnologia fez com que parecesse “cool”, o que resultou numa década de publicações virais e memes nas redes sociais. A primeira selfie papal, tirada em 2013 com peregrinos adolescentes a visitar o Vaticano, tornou-se viral no Twitter.
As marcas icónicas não podem agir sozinhas para manter o estatuto cultural. Como explica Holt, dependem de “coautores” para criar mitos que ligam as marcas com o público. Os coautores são textos de media ou grupos culturais que fazem circular histórias que dão significado a marcas icónicas.
Desde o início que os meios jornalísticos foram parte integrante da construção da imagem do papa. Francis foi eleito Personalidade do Ano 2013 pela revista Time e fez capa da Rolling Stone.
Era praticamente desconhecido no mundo inteiro antes de se tornar papa. A cobertura mediática desempenhou um papel importante na apresentação da sua marca ao público global, uma vez que as notícias sugeriam que a humildade, a compaixão pelos pobres e a abordagem radical de Francisco ao papado transformariam a Igreja Católica.
Poucos dias após a sua eleição, o The Washington Post rotulou Francisco de “o Papa do Povo”. Este título ligou Francisco a figuras como a Princesa Diana, uma figura icónica semelhante conhecida por desafiar o protocolo e o seu trabalho de caridade progressista.
Depois de os meios de comunicação tradicionais terem reforçado a sua marca icónica como “o Papa do Povo”, o Papa Francisco reforçou esta mensagem através de ações estratégicas e seletivas. Tornou-se papa durante a presidência de Barack Obama nos Estados Unidos e ambos partilhavam algumas semelhanças, incluindo a representação de diferentes “primeiras vezes”.
Francisco estava consciente da sua marca icónica como “o Papa do Povo”. Tal como a Princesa Diana, esta marca permitiu-lhe atrair um público global, independentemente da filiação religiosa. A sua primeira viagem oficial foi à ilha mediterrânica de Lampedusa, onde celebrou uma missa para requerentes de asilo e migrantes.
A resposta de “quem sou eu para julgar?” a uma pergunta dos media sobre a posição da Igreja Católica em questões 2SLGTBQ+ ganhou uma cobertura positiva dos media.
Em 2015, Francisco publicou a sua primeira encíclica papal focada na ligação entre as alterações climáticas e a pobreza global. O Papa desenvolveu uma marca icónica que se conectou com o público durante uma década definida pelos ideais progressistas, uma vez que o legado e as redes sociais trabalharam em conjunto como coautores na construção da sua identidade.
As marcas icónicas podem transformar as instituições que representam. A imagem de Francisco demonstra como a marca papal não é diferente das outras formas de marca. Depende de diferentes dinâmicas se reunirem no momento certo para formar mitos para a conexão pública.
O pontífice que se segue entrará num cenário cultural diferente do do Papa Francisco, mas as estratégias para criar uma marca icónica permanecem as mesmas.