“Foi claramente uma chantagem”
A relação de exames, consultas, terapias e cirurgias que os planos de saúde precisam cobrir é elaborada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). É uma relação aberta de procedimentos, que não desobriga as empresas de cobrirem também os que não constam da lista. No jargão do mercado, se diz que a ANS faz um “rol exemplificativo”. Os planos de saúde nunca engoliram essa determinação da lei. Preferem uma lista fechada, que elimina a cobertura do procedimento se ele não constar da relação. É o que o mercado chama de “rol taxativo”. The post “Foi claramente uma chantagem” first appeared on revista piauí.

A relação de exames, consultas, terapias e cirurgias que os planos de saúde precisam cobrir é elaborada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). É uma relação aberta de procedimentos, que não desobriga as empresas de cobrirem também os que não constam da lista. No jargão do mercado, se diz que a ANS faz um “rol exemplificativo”.
Os planos de saúde nunca engoliram essa determinação da lei. Preferem uma lista fechada, que elimina a cobertura do procedimento se ele não constar da relação. É o que o mercado chama de “rol taxativo”.
Até 2019, o Superior Tribunal de Justiça, corte que julga os temas da saúde privada, tinha um entendimento inequívoco a esse respeito, fazendo valer o “rol exemplificativo”. Mas os planos de saúde acabaram levando o caso à Justiça – e o STJ deu ganho de causa aos planos de saúde, fazendo valer a lista fechada.
Seguiu-se uma ampla mobilização dos usuários dos planos para pressionar os congressistas. Em 2022, a Câmara e o Senado votaram a favor do restabelecimento da lista aberta.
Pouco depois que os planos de saúde foram derrotados no Congresso, os usuários começaram a comer o pão que o diabo amassou. Em 2023, o volume de reclamações de clientes recebidas pela ANS atingiu um recorde histórico: 370 mil, um crescimento de 44% em relação a 2022. No ano passado, novo recorde: 378 mil.
Um levantamento feito a pedido da piauí pelo jornalista e consultor de dados Marcelo Soares, diretor do estúdio de inteligência de dados Lagom Data, mostra que houve uma disparada nas reclamações de cancelamento entre abril e maio de 2024: passou de 2,4 mil para 2,8 mil.
As queixas mais frequentes são a falta de acesso a atendimentos, a recusa de reembolso, a negativa de cobertura, os cortes na rede conveniada e o cancelamento unilateral do plano.
A campeã nacional de rescisões unilaterais de contrato é a Amil, seguida da Unimed e da SulAmérica. “Sempre houve rescisão unilateral. A concentração nesses meses foi claramente uma chantagem ou recado das operadoras”, diz o professor Mario Scheffer, coordenador do Observatório de Judicialização da Saúde Suplementar, da Universidade de São Paulo (USP).
O mesmo movimento aconteceu nos tribunais. Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), as novas ações na saúde suplementar chegaram a 300 mil no ano passado, um número inédito. Mais uma vez, o pico aconteceu em abril de 2024, com 28 mil.
No dia 28 de maio de 2024, a onda de cancelamentos chegou ao Congresso. O deputado Arthur Lira recebeu as principais empresas do setor para uma reunião fechada em sua residência oficial. O estranho no ninho naquele QG da saúde privada era o deputado Duarte Júnior (PSB-MA), relator de um projeto que muda a Lei dos Planos de Saúde, em vigor desde 1998.
O encontro durou uma hora, com a boa nova de que as empresas haviam se comprometido a suspender o cancelamento em massa. Era um truque. Duarte Júnior conta que, a certa altura da reunião, propôs que a proibição de cancelamento unilateral constasse em lei. Os empresários reagiram. “Eles disseram que, entrando na lei, não poderiam rescindir contratos dos usuários com alta sinistralidade”, ele conta a Breno Pires, na edição deste mês da piauí, referindo-se aos clientes cuja saúde demanda mais gastos do que o normal.
O deputado ficou surpreso: “Até então, os empresários falavam que não faziam rescisão unilateral. De repente, eles admitiam a prática e, ao mesmo tempo, selavam um acordo dizendo que iam suspender os cancelamentos, mas que isso não podia ser definitivo, não podia estar em lei?” O deputado Duarte Júnior conclui: “É por isso que o tema é grave. Parece que há uma estratégia para apequenar os direitos dos usuários.”
Assinantes da revista podem ler a íntegra da reportagem neste link.
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