Filme de “Geni e o Zepelim” é acusado de transfobia e diretora pede debate

Anna Muylaert diz que personagem pode ter múltiplas leituras e se dispõe a repensar projeto se sociedade considerar que papel só pode ser interpretado por mulher trans

Abr 17, 2025 - 03:44
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Filme de “Geni e o Zepelim” é acusado de transfobia e diretora pede debate

Críticas à escolha de Thainá Duarte

A diretora Anna Muylaert se manifestou em suas redes sociais nesta quarta-feira (16/4) após a repercussão negativa da escolha da atriz Thainá Duarte para viver Geni no filme “Geni e o Zepelim”, inspirado na música de Chico Buarque.

Desde o anúncio da escalação, diversos internautas acusaram a equipe de transfobia por escalar uma atriz cis para o papel. Criada para a peça “Ópera do Malandro”, a personagem original é uma travesti que vive da prostituição no Rio de Janeiro e sofre com o preconceito. A escolha do elenco levou à acusação de transfake, prática em que atores cis interpretam papéis trans, limitando oportunidades para artistas transgêneros.

Justificativa da diretora

Muylaert, conhecida por filmes como “Que Horas Ela Volta?” e “A Melhor Mãe do Mundo”, afirmou que sua proposta se baseia em uma interpretação simbólica da canção, conectada ao conto “Bola de Seda”, de Guy de Maupassant.

“Durante o processo de criação deste filme, a gente entendeu que a letra do Chico e o conto do Maupassant poderiam ter várias leituras: poderia ser uma mulher trans; poderia ser uma mãe solteira; poderia ser a Fabiana Silva da Favela do Moinho, uma carroceira; poderia ser uma presidente tirada do poder sem crime de responsabilidade; poderia ser uma floresta atacada diariamente por oportunistas”, disse a cineasta.

Ela explicou que a personagem do filme é uma prostituta cis, moradora da Amazônia. “Por uma questão de lugar de fala, escolhemos fazer uma prostituta cis na Amazônia”, declarou.

Em seguida, propôs um debate público: “Diante da reação da comunidade trans, quero vir aqui abrir o debate e jogar a pergunta: essa letra do Chico, essa poesia, hoje em 2025, o mito Geni só pode ser interpretada como uma mulher trans? Se computarmos que hoje só se pode interpretar a Geni como trans, a gente vai repensar o nosso filme.”

Reações de artistas

Nos comentários da publicação de Muylaert, artistas trans e aliados reagiram à decisão de transformar Geni em uma mulher cis.

A cantora Liniker escreveu: “Todo respeito ao trabalho de Thainá Duarte, mas quando trazemos a reflexão em nossos textos desde que saiu essa matéria e nos posicionamos pelo apagamento, é por espaço e oportunidade que nos colocamos, por termos atrizes trans que poderiam sim dar vida a essa personagem tão icônica.”

A atriz Camila Pitanga ponderou: “Você pode fazer o filme que quiser, com certeza… mas pondero que esta interpretação serve, sim, ao apagamento doloroso de mulheres trans. São poucos personagens com esse protagonismo. É uma escolha que fere.”

Gabriela Medeiros, que viveu a personagem Buba no remake de “Renascer”, também se pronunciou: “Essa personagem é forte para nós. Sendo que ela é sim uma pessoa trans. Somos apagadas da cultura. E esse papel ser interpretado por uma de nós é uma retratação importante.”