Como a CFO da General Mills Driblou Barreiras para Assumir a Liderança

Forbes, a mais conceituada revista de negócios e economia do mundo. Incentivada pelos pais a focar nos estudos, executiva se formou em economia na USP e liderou gigantes como Amazon e P&G O post Como a CFO da General Mills Driblou Barreiras para Assumir a Liderança apareceu primeiro em Forbes Brasil.

Mai 5, 2025 - 09:01
 0
Como a CFO da General Mills Driblou Barreiras para Assumir a Liderança

Forbes, a mais conceituada revista de negócios e economia do mundo.

 

Liderar as finanças de gigantes multinacionais não estava nos planos de Elis Rodrigues há 30 anos, quando, aluna do primeiro ano de economia na USP (Universidade de São Paulo), ela dava os primeiros passos na carreira. “Na época, meu foco era simplesmente existir e ocupar meu espaço dentro do mundo corporativo”, diz a executiva, com passagens por Amazon e P&G, e que acaba de assumir como CFO da General Mills, empresa de alimentos americana dona das marcas Yoki, Kitano e Häagen-Dazs.

Nascida em São Paulo e criada por uma família mineira, Elis estudou em escola pública a vida toda e ouviu desde cedo dos pais a importância de focar na educação — e correr atrás. “Meu pai me ensinou a sonhar grande e minha mãe, a perseguir esse sonho.”

Mulher negra em um ambiente majoritariamente branco e masculino, enfrentou barreiras sociais e econômicas enquanto trilhava seu próprio caminho. “No início, parecia que a expectativa das demais pessoas era de que ‘eu não deveria estar ali'”, conta. “Tive que superar diferenças que se mostraram bastante desafiadoras e, muitas vezes, geraram barreiras inconscientes que precisei aprender a reconhecer e vencer.”

O ponto de virada veio após a licença-maternidade do segundo filho, quando percebeu que não precisava escolher entre o tempo com a família e uma carreira de sucesso. “Ter alta performance profissional faz parte da mulher que sempre quis ser e me faz ser mais completa em todos os diferentes papéis”, conta a executiva. Foram 21 anos na P&G, onde chegou à diretoria sênior de finanças, e depois quatro anos como CFO da Amazon Brasil.

A seguir, Elis Rodrigues, nova CFO da General Mills, compartilha os aprendizados, desafios e escolhas que moldaram sua trajetória — e como encontrou equilíbrio entre ambição, identidade e propósito ao longo do caminho.

Forbes: Quais foram os maiores desafios da sua carreira — e como eles te prepararam para esse novo momento?

Elis Rodrigues: Sou uma mulher negra e, no começo, era comum eu ter que me esforçar para me sentir parte. Ao longo da vida, vivenciei muitas situações em  que parecia que a expectativa das demais pessoas era de que “eu não deveria estar ali”. Isso começa ainda na infância, com amigos, e se estende a diversas outras experiências. Felizmente, meus pais souberam me impulsionar e acreditaram no papel transformador da educação. Eles me incentivaram a estudar, pois sabiam que isso tinha a capacidade de transformar a minha realidade. Costumo dizer que meu pai me ensinou a sonhar grande e minha mãe, a correr atrás desse sonho.

Na faculdade, abri meus horizontes. Sou graduada em economia pela Universidade de São Paulo e ter acesso a um altíssimo nível de formação me colocou em outra realidade, tanto com colegas que vinham de histórias de vida diferentes, como com professores renomados que fizeram parte da minha formação. Tudo isso foi transformando meu perfil e fui entendendo que sonhar, executar e ocupar meu espaço era possível.

Outro aprendizado importante foi a necessidade de desenvolver soft skills, à medida que o crescimento profissional começa a ocorrer. A parte comportamental, a inteligência emocional, gestão de pessoas, entre outras habilidades, são fatores que devem acompanhar o desenvolvimento técnico de um líder.

E quais os episódios mais decisivos e que mudaram o rumo da sua carreira?

Acredito que foram dois momentos. O primeiro quando retornei de licença-maternidade do meu segundo filho. Naquela época, eu ocupava o cargo de gerente financeira e me sentia realizada. Achava que havia atingido um bom limite para a minha carreira e deveria me estabilizar na posição. Quando retornei de licença, voltei com uma visão diferente: havia entendido que eu poderia sim ter tempo com a família, vida pessoal com qualidade e ao mesmo tempo almejar coisas mais amplas para a minha carreira. Isso me impulsionou a ocupar novas posições que me levaram a ser diretora.

Outro momento foi quando deixei a primeira empresa que trabalhei, pois sentia que não havia mais espaço para o meu crescimento. Entendi que meus planos pessoais já não tinham conexão com o momento da empresa e o que era possível para mim, pensando em projeção de carreira. Foram, de forma resumida, dois momentos de inquietação em que eu senti que não deveria limitar minhas expectativas e ambicionar, sim, crescimento e posições mais altas para a minha trajetória.

Você tinha a ambição de ser CFO de uma multinacional como a General Mills?

Não era algo que eu imaginava no início da carreira. Na verdade, quando comecei minha trajetória, tinha um foco maior em “existir”, isto é, ocupar meu espaço dentro do mundo corporativo. Sou mulher, negra. Não nasci em uma família rica, embora tenha tido muito apoio familiar no meu desenvolvimento educacional. Tive que superar diferenças sociais e econômicas que, especialmente no início, se mostraram bastante desafiadoras e, muitas vezes, geram barreiras inconscientes que precisei aprender a reconhecer e vencer.

A visão de que eu poderia ser mais ambiciosa foi algo que desenvolvi ao longo do tempo, e se confirmou a partir do nascimento do meu segundo filho. Foi neste momento que entendi que poderia ser a mãe que eu queria ser, estar sempre junto à minha família. E ter alta performance profissional faz parte da mulher que sempre quis ser e me faz ser mais completa em todos os diferentes papéis.

Como uma mulher negra em posição de liderança, quais mudanças você percebeu no ambiente corporativo ao longo da sua trajetória profissional?

Vejo algumas evoluções importantes. Por muito tempo, as pessoas tinham medo de se referir a mim como uma pessoa negra. Ouvia comentários como “mas você tem a pele mais clara”, “você não é tão negra”. Parece que eu era mais aceitável assim. É o que chamamos “passabilidade”, quando uma pessoa é considerada membro de um grupo com características identitárias diferentes das suas. Isso mudou, pois hoje fala-se mais abertamente sobre questões raciais e representatividade. Existe consciência sobre o tema.

No entanto, mudanças ainda precisam ser realizadas. A presença de pessoas negras no mundo corporativo, mas principalmente em cargos de liderança, ainda é muito baixa. Precisamos criar políticas públicas para reverter este cenário. Sou uma grande entusiasta de cotas, por exemplo, pois acho que são mecanismos válidos para aceleração da implementação de práticas de correção de injustiças raciais históricas. Acredito muito no poder da mentoria: ajudar pessoas de forma customizada, compartilhando experiências, tem um papel de gerar confiança, aumentar a autoestima e evitar que elas se sintam como eu me sentia no começo da carreira: “Alguém que não deveria estar ali”. Isso precisa mudar e as conexões entre quem trilhou o caminho e quem está iniciando pode gerar grandes frutos neste sentido.

Qual a a importância da representatividade na liderança?

Existem estudos que demonstram que representatividade e diversidade de perfis têm impactos positivos sobre a tomada de decisões e gestão de negócios. Debates, projetos e iniciativas que contam com pessoas de históricos de vida, perfis e personalidades diferentes — além de diversidade de gênero, raça e orientação sexual — costumam ter um olhar muito mais amplo, considerando mais fatores e levando a decisões mais assertivas. No fim do dia, isso gera melhores produtos, uma gestão mais eficiente e mais resultados.

Como você vê a evolução do papel do CFO nas empresas hoje e como pretende imprimir sua marca nessa função?

Embora seja natural que um CFO necessite ter profundo conhecimento técnico sobre finanças, acredito que esse profissional também precisa entender tudo que se relaciona com o business. A posição já te permite um diferencial, quando comparada a outras lideranças executivas, que é acessar todas as informações da empresa. Ter acesso irrestrito ao P&L permite entender o passado, o presente e ajustar rotas e aprendizados para evitar que erros se repitam. Isso deve estar diretamente acompanhado de trabalhar bem com outros líderes. Entender como as finanças podem estar bem integradas com áreas como marketing, supply chain, logística e P&D.

O que espero para a minha gestão é deixar processos muito bem organizados, com implementação de disciplina, mas principalmente com clareza de objetivos. Quero desenvolver pessoas para potencializar suas capacidades, entendendo que elas devem crescer junto com o negócio para ter uma performance de alto nível e que elas possam dar continuidade ao trabalho iniciado em minha gestão.

Como tem sido o processo de adaptação para o novo cargo?

Em alguns aspectos, a General Mills se assemelha a outras empresas que trabalhei, principalmente no foco no consumidor ou cliente, e nas decisões de longo prazo para um negócio sustentável. As diferenças estão mais relacionadas às características do setor de cada empresa.

Trago comigo as habilidades desenvolvidas ao longo da minha trajetória. Da P&G, que foi a minha primeira escola, levo o foco no desenvolvimento de pessoas e processos bem estruturados. Na Amazon, eu aprendi a tomar decisões baseadas em dados, mas, principalmente, a balancear a análise de dados e o tempo de resposta, dado que o varejo muda rápido e as decisões não podem esperar.

Como você busca equilíbrio entre a alta demanda profissional e a vida pessoal?

Busco ter as minhas prioridades muito claras e definidas. Acredito que não existe vida pessoal e profissional, é uma coisa só. Minha família é prioridade número um, mas ser bem-sucedida me torna uma mãe e uma esposa melhor, então há uma relação direta entre as duas coisas. Como não consigo estar em todos os temas, busco ser uma líder que dá autonomia aos meus times, delego bastante, pois sei da capacidade das minhas equipes de trabalhar bem e de não necessitarem de microgestão. Isso é chave para que eu tenha equilíbrio com outras coisas que julgo importantes.

Quais aprendizados do início da sua trajetória ainda te acompanham no dia a dia?

Principalmente questões como saber reagir com agilidade, ter foco nas pessoas, entender que o resultado vem em equipe, com os times, os pares e as demais áreas do negócio. Ninguém trabalha sozinho e o espírito colaborativo, integrando opiniões, visões e estratégias, é crucial para a boa tomada de decisões.

Acredito que cada líder deve buscar entender seus colaboradores para extrair o que cada um deles tem de melhor para contribuir com os resultados. Com o crescimento ao longo da carreira, passamos a lidar com times cada vez maiores, e essa prática se potencializa. Imagine conseguir explorar bem o potencial de cada pessoa em times numerosos? É desafiador, mas tem um impacto muito positivo em impulsionar e direcionar uma empresa para grandes resultados.

Quais habilidades você precisou desenvolver (ou aprimorar) para assumir posições de alta liderança em empresas globais?

A principal é a escuta. Ser um bom líder está conectado a saber escutar e permitir que a opinião e experiência dos outros mudem a decisão. A escuta real permite que você tenha um entendimento mais amplo de todas as questões e consiga tomar decisões mais assertivas. A outra é a habilidade de nunca se acomodar, isto é, estar sempre atualizando conhecimentos técnicos e comportamentais.

No caso de finanças, os conceitos básicos se aprendem logo no início da carreira, mas é necessário estar em constante atualização para se conectar com as mudanças econômicas, comportamentais e tecnológicas. Ainda existem muitas oportunidades, como o uso de IA, a automação e as ferramentas para integração de equipes. Essa inquietação de sempre buscar algo para melhorar aquilo que já está bom ou precisa de atenção é muito enriquecedora no longo prazo.

Tirando o crachá, quem é a Elis?

Sou uma pessoa simples, muito apaixonada pela família. Gosto de passar o tempo com quem amo, minha família é muito unida. Passamos muito tempo juntos, jogando beach tennis, indo à praia, praticando atividade física ou apenas estando juntos em casa. Meu filho mais velho agora vive em outro município e, sempre que posso, busco viajar para estar com ele também. Isso me define: viver bons momentos com quem amo é grande parte de quem sou.

Também sou muito organizada com pessoas e família. Faço planos para minha vida e trabalho com metas e meios de atingi-los – sei bem o que quero daqui cinco e dez anos. Gosto de brincar que sou inquieta e incansável, mas, ao mesmo tempo, acho que podemos ter ambição e trabalhar para atingir objetivos com leveza, pois no final das contas, as pessoas são a parte mais importante de tudo o que vivenciamos.

Se pudesse dar um conselho para a Elis do início da carreira, o que diria?

Não gaste tanto tempo pensando no que os outros vão pensar de você, muito menos gaste sua energia tentando agradar. Seja quem você é.

A trajetória de Elis Rodrigues, CFO da General Mills

Formação

Economia na Universidade de São Paulo

Primeiro emprego

Estágio na Telesp

Tempo de carreira

+ de 25 anos

O post Como a CFO da General Mills Driblou Barreiras para Assumir a Liderança apareceu primeiro em Forbes Brasil.