Pinto da Costa: o criador de campeões que não queria nada com a História

“História não é para mim. História é para os historiadores", dizia o ex-presidente do FC Porto. Em definitivo, a sua história como dirigente confunde-se com o percurso de sucesso de um clube que fez da região Norte a sua identidade e que a expandiu a cada canto do mundo onde se fala português. Faleceu este sábado aos 87 anos.

Fev 15, 2025 - 21:34
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Pinto da Costa: o criador de campeões que não queria nada com a História

Polémico e provocador para quem não gosta do FC Porto; aglutinador, carismático e vencedor para quem ama os “azuis e brancos”. O que une estes dois públicos tão díspares? O facto de nenhuma destas audiências ficar indiferente ao dirigente com maior longevidade do futebol mundial. O melhor elogio que se pode fazer a Jorge Nuno Pinto da Costa é que transformou os “dragões” num clube de eleição em Portugal e na Europa. Em definitivo, a sua história como dirigente confunde-se com o percurso de sucesso de um clube que fez da região Norte a sua identidade e que a expandiu a cada canto do mundo onde se fala português.

Chegar, ver e vencer

Nascido a 28 de dezembro de 1937 no emblemático bairro da Cedofeita, no Porto, Jorge Nuno Pinto da Costa foi o quarto filho de José Alexandrino Teixeira da Costa e de Maria Elisa Bessa de Lima Amorim Pinto. A sua vida (e o destino dos “azuis e brancos”) mudou radicalmente quando foi convidado por Américo de Sá para dirigir as secções de hóquei em patins, hóquei em campo e boxe, corria o ano de 1976. Daí para o futebol foi um instante e em 1978, o primeiro sinal de que algo estava a mudar no panorama do futebol em Portugal: o FC Porto quebrava um longo jejum e reconquistava o campeonato 19 anos depois. “Inesquecível”, foi assim que Pinto da Costa apelidou a “dobradinha” que acabou com a seca de títulos e que iria marcar o ressurgimento do FC Porto como equipa temível no futebol em Portugal.

Impacto nacional… e europeu

A dimensão que os “dragões” atingiram com a chegada de Pinto da Costa está bem espelhada no antes e depois do homem que marcou a diferença no FC Porto. Antes do lendário presidente, o FC Porto conquistara quatro campeonatos de Portugal, sete campeonatos nacionais, quatro Taças de Portugal e uma Supertaça. E quanto à dimensão europeia, esta nem sequer existia. Entre 1959 e 1976, o FC Porto foi a imagem de um clube onde a instabilidade dominava: cinco presidentes, mais de 20 treinadores e apenas uma Taça de Portugal.

Na época de 1976/77, Pinto da Costa escolheu José Maria Pedroto para operar uma revolução no futebol em Portugal. Depois de Pedroto, outros treinadores acompanharam Pinto da Costa neste percurso vitorioso e o grito do Norte fez com que o FC Porto passasse de sete para 29 campeonatos (e o único penta da história do futebol português entre 1995 e 1999); de quatro para 17 Taças de Portugal; de uma a 22 Supertaças; da inexistência europeia a duas Ligas Europa, duas Ligas dos Campeões e uma Supertaça Europeia. E tudo isto sem contar com o impacto que Pinto da Costa teve na formação e em modalidades como o andebol, basquetebol, hóquei em patins, etc. O mais titulado presidente do mundo foi também o obreiro do Estádio do Dragão, do Dragão Arena e do Museu do clube. “Para mim, se não fosse presidente e tivéssemos ganho tudo, estava contente na mesma. Não fui eu que ganhei esses títulos, fomos todos. Foi o clube, através dos jogadores e dos treinadores”, referiu Pinto da Costa após mais uma conquista.

Guerra a Lisboa

Ao longo das décadas em que liderou os destinos do FC Porto, Pinto da Costa alimentou e deixou que fosse alimentado um permanente clima de conflito direcionado sobretudo com os grandes de Lisboa: SL Benfica e Sporting CP. Ao longo do tempo em que foi presidente aproximou-se e afastou-se dos presidentes dos rivais, num balanço difícil entre a amizade, a cordialidade e a picardia permanente. Entre “águias” e “leões”, conheceu 21 presidentes dos rivais em mais de 40 anos. Cumpriu 42 anos na presidência do FC Porto, entre 1982 e 2024, tendo sido destronado por André Villas-Boas nas eleições que se realizaram em abril deste ano.

A contas com a Justiça

Mas nem só de títulos desportivos foi preenchida a vida do mais bem-sucedido dirigente de um clube a nível mundial. Ao longo de 15 mandatos consecutivos como líder dos dragões (quatro décadas no cargo) e com a hegemonia no futebol português do FC Porto vieram a público os episódios que pareciam “desaguar” na mesma conclusão: Pinto da Costa era o verdadeiro “dono disto tudo” no futebol em Portugal, com repercussões também noutros campos da sociedade. Das acusações de corrupção, às suspeitas de mandar agredir responsáveis políticos e até ex-jogadores do FC Porto, tudo foi analisado pela Justiça portuguesa e sempre com o mesmo carimbo: “absolvido”. “Nunca fui condenado por um juiz”, lembrava Pinto da Costa há alguns anos. Culpado ou inocente, a verdade é que as acusações no âmbito do processo “Apito Dourado” nunca mais largaram o presidente mais emblemático da história do futebol em Portugal: estas suspeitas, que remontam à época 2003/04, sugeriam que o presidente do FC Porto comprava árbitros e que esses pagamentos seriam feitos com recurso a serviços de prostituição. As escutas no âmbito deste processo, ainda hoje disponíveis no YouTube, terão sido obtidas de forma ilegal e por isso não produziram efeitos em sede de julgamento.

Questionado sobre se a sua vida iria naturalmente confundir-se com a história do FC Porto, Pinto da Costa sublinhou: “História não é para mim. História é para os historiadores. Tenho é de ter o pensamento no que temos que ganhar. O presente é de resolver os problemas, mas o futuro é que tem que preocupar a todos”.