Pecadores | Crítica

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Abr 16, 2025 - 22:04
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Pecadores | Crítica

Poltrona Nerd ~

O livro Drácula, de Bram Stoker, lançado em 1897, consolidou a figura do vampiro na cultura popular. Desde então, as criaturas da noite apareceram de inúmeras formas na cultura pop e conquistaram o grande público. Pecadores chega aos cinemas na próxima quinta-feira trazendo mais desses seres que se alimentam da essência vital de criaturas vivas, mas em uma história muito estranha e diferente de tudo que já vimos antes, repleta de ação, terror, crítica social e comédia.

No longa, o ator Michael B. Jordan aparece em dois papéis, interpretando os irmãos gêmeos Fumaça e Fuligem. Ambos retornam para casa no no Mississippi após anos de serviço militar e envolvimento com gângsteres em Chicago – onde pareceram ter enganado a máfia. A ideia é abrir uma espécie de bar/casa de shows com muito blues e bebidas em um celeiro velho e decadente comprado de um sujeito branco (claramente um racista, supostamente membro da Ku Klux Klan). Elegantemente vestidos com trajes chiques de cidade grande, ambos se destacam a quilômetros de distância na cidade segregada e miserável. Também geram muito entusiasmo na população local para a grande inauguração.

O primo deles, “Pastorzinho” Sammie (o estreante Miles Caton), recém-saído da adolescência, mas já um músico incrivelmente talentoso, junta-se aos dois para a grande abertura. Isso vai contra seu pai, que o repreende após saber que ele tocou blues em uma boate de má reputação – “continue dançando com o Diabo, um dia ele vai te seguir até em casa”, o pastor Jedidiah (Saul Williams) avisa Sammie profeticamente. Com a ajuda da ex mulher de Fumaça, Annie (Wunmi Mosaku), uma cozinheira e sacerdotisa, prestativamente versada em tradições sobrenaturais, da ex de Fuligem, Mary (Hailee Steinfeld), uma mulher branca e abastada, de luto pelo término e pela morte de sua mãe e do músico Delta Slim (Delroy Lindo), tudo está em ordem para a noite que vai abalar as estruturas da pequena cidade.

Após os preparativos darem certo em tão pouco tempo e a noite de abertura estar sendo um sucesso, os vampiros, liderados por Remmick (Jack O’Connell), chegam, e tudo vai direto para o inferno. Remmick é um personagem complexo, ele é charmoso e tentam humanizá-lo como mais uma vítima do colonialismo e da religião forçada, mas ele agora tenta a mesma apropriação com os negros trabalhadores de fazendas de algodão que estavam tentando ter uma noite de diversão.

Até então, a trama seguia em um ritmo mais lento e ensolarado. O roteirista e diretor Ryan Coogler (Pantera Negra) demora para chegar ao derramamento de sangue. Os relacionamentos de Fumaça e Fuligem — um com o outro e com outras pessoas na cidade — são explorados com calma na primeira metade do filme. Afinal, quando você se importa com essas pessoas, é ainda mais terrível ver algumas delas serem abatidas pela mordida de um vampiro. Mas, quando Remmick entra em cena, Pecadores muda completamente seu ritmo e somos levados para algo frenético.

Isso se dá início com um número musical totalmente fora do comum, que faz uma grande mistura de gêneros e celebra a criatividade negra do passado e presente de forma audaciosamente impactante. Um momento catártico e de liberdade para pessoas oprimidas. Segundo as lendas apresentadas no longa, alguns músicos podem evocar espíritos do passado e do futuro através de suas canções — rompendo o véu entre a vida e a morte, curando comunidades, mas também atraindo o mal. E é isso que atrai os vampiros para o local. Ilustrações dessa força mística remontam à África Ocidental ancestral, à Irlanda pré-colonial e à tradição tribal Choktaw, que prenuncia a presença das três culturas na história.

Nesta sociedade desigual, aqueles que são musicalmente ou metafisicamente talentosos correm o risco de serem reduzidos a uma predação monstruosa. Remmick chega oferecendo uma fuga da crueldade desumanizadora para uma irmandade que oferece uma vida eterna de liberdade e iluminação, algo um tanto quanto tentador. Os vampiros de Pecadores compartilham uma espécie de mentalidade coletiva. Em meio a todo o racismo e outras razões sem sentido pelas quais os humanos se voltam uns contra os outros – com as quais esses personagens estão especialmente familiarizados, dado onde vivem – Remmick oferece uma sociedade que superou esse ódio mesquinho. Se você é um vampiro, você é aceito, independentemente da cor da sua pele. No entanto, ao oferecer aos personagens essa liberdade, Remmick, na verdade, está apenas fornecendo uma mentalidade coletiva que nivela as identidades individuais e culturais de todos sob sua autoridade.

Coogler usa como ferramentas extraordinárias para comunicar a trilha sonora repleta de blues de Ludwig Göransson e também as histórias (muitas vezes traumáticas) que os personagens estão narrando, sem mostrar flashbacks ou imagens correspondentes. Ouvimos, em vez de ver, suas experiências enquanto eles falam, o que fortalece a narrativa e dá ao filme um toque de estilo. Ryan Coogler criou um filme comovente e envolvente, com muito a dizer e a capacidade de dizê-lo com beleza e coerência. A música por si só, desde as canções tocadas pelos personagens até a trilha sonora, eleva o filme a outro nível. Não dá para dizer que este filme é um musical – ninguém canta e dança espontaneamente para se expressar  – mas a música é peça central da trama.

O elenco todo está muito bem. Michael B. Jordan sempre dá tudo de si em seus papéis e agora faz isso duplamente, dando a cada um dos gêmeos suas próprias personas, auxiliadas por dicas visuais (como diferenças no figurino). Wunmi Mosaku e Hailee Steinfeld também mostram um ótimo trabalho, assim como o restante do elenco de apoio. O novato Miles Caton, dono de uma voz poderosa e de um papel de destaque, esteve ao lado de um elenco tão talentoso e experiente e não perdeu o ritmo.

Com inspiração em clássicos como Um Drink no Inferno e Os Vampiros de Salem, Ryan Coogler faz sua de estreia no terror um ótimo trabalho, que coloca vampiros em uma trama inteligente, que chega a ser poética em alguns momentos e que tem muito a dizer sobre raça e liberdade. Um filme tocante, emocionante, sexy e sangrento que é diferente dos outros trabalhos do diretor e dos outros filmes de vampiros já feitos – merece ser visto na telona. Ah, uma dica: não saia da sala quando os créditos começarem a rolar! Pecadores não tem uma cena pós-créditos propriamente dita, é o seu final que é apresentado enquanto as letrinhas ainda rolam na telona.

Pecadores chega aos cinemas em 17 de abril, com distribuição da Warner Bros. Pictures.

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