Lage é dos nossos - e talvez por isso seja o certo, por Simão Santana

(Artigo da autoria do Sócio Simão Santana)Escrevo esta crónica a cinco dias da decisão do sucesso ou insucesso da época e por isso mantenho esta reflexão livre de condicionamentos momentâneos. É uma condição importante para atestar da nossa coerência - e sabemos bem que, no futebol ,a coerência muitas vezes depende de uma bola ao poste ou de um golo inesperado.  Olhando já para o dia seguinte ao derby de sábado, e independentemente do que vier a acontecer, devo dizer que o trabalho realizado por Bruno Lage e pela atual equipa técnica do Benfica merece a minha avaliação positiva. Bruno Lage tem sido - convém dizê-lo claramente - um treinador com pouca sorte - e isto não serve de desculpa antecipada para insucessos. Na realidade, com a exceção do Wolves, nunca teve uma época inteira para construir e concluir um projeto. Nem mesmo no Benfica, na sua primeira passagem, onde saiu antes da época terminar - e quem sabe vencer a Taça de Portugal, se lhe tivessem dado essa oportunidade. Essa instabilidade pode parecer um pormenor, mas não é. Sobretudo quando nos lembramos que, anos antes, o Benfica segurou Jorge Jesus após três temporadas sem vencer o campeonato. E fê-lo bem - porque o sucesso estava à vista. Chegou em 2013/2014, com um triplete inesquecível e presenças consecutivas em finais Europeias. Bruno Lage regressou ao Benfica com o mesmo cenário que encontrou em janeiro de 2019: uma equipa sem alma, sem identidade, sem chama competitiva. Nos três meses seguintes focou o seu trabalho na reconquista dos adeptos e dos próprios jogadores. O seu discurso e atitude puxaram a equipa para cima e quando finalmente alcançámos a liderança, tornou-se evidente que a equipa ainda estava frágil para ser capaz de assumir e manter a liderança do campeonato. Muitos viram nas derrotas com o Braga e com o Sporting as “machadadas finais” nas aspirações da temporada. Mas Bruno Lage não. E menos de um mês depois vencíamos esses mesmos adversários, com nota distintiva e levantávamos o primeiro troféu da época - a Taça da Liga. Foi aqui que Lage demonstrou uma qualidade essencial no desporto de alta competição e na vida profissional: a resiliência. Perdeu, caiu - mas não desistiu. Na Europa, é verdade que houve jogos em casa abaixo do exigido, como o empate com o Bolonha. Ainda assim, o Benfica foi capaz de competir com os melhores — e sinceramente, não vi muitas equipas a conseguirem o que nós conseguimos frente ao incrível Barcelona. Talvez com mais tempo e estabilidade, Bruno Lage pudesse ter ganho pelo menos um desses três confrontos com os catalães. E cá estamos nós em maio, como sonhamos a cada época: a disputar o campeonato, a depender apenas de nós para o vencer, e ainda com a possibilidade real de conquistar um triplete — 11 anos depois do último. Bruno Lage é o melhor treinador que passou pelo Benfica? Provavelmente não. Mas é, sem dúvida, um dos nossos. Sente o clube como nós, vive-o como qualquer benfiquista apaixonado. Em 2015, defendi que o clube devia manter Jorge Jesus a todo o custo (e fui contra o seu regresso em 2020 pelas razões que explico aqui). O Benfica precisava de uma linha desportiva estável, especialmente no desenvolvimento da academia. Um modelo de jogo que fosse ensinado desde os escalões de base até à equipa principal. Uma identidade tática “à Benfica”, que resistisse às trocas de treinador. Na altura, esse projeto ainda não existia. Mas em 2025 temos, finalmente, a oportunidade de o construir. Com Bruno Lage, com contratações que sirvam este modelo e com aposta firme na formação. Mesmo que sábado fiquemos afastados do título, mesmo que a Taça de Portugal escape no dia 25, para mim o essencial está claro: o futuro passa por manter este rumo. Trocar de treinador só servirá para adiar o inevitável: sem uma estratégia desportiva clara e contínua, não se constrói nada.   Rumo a tudo. Viva o Benfica.
 Simão Santana Sócio n.º 23.549/1

Mai 5, 2025 - 18:20
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Lage é dos nossos - e talvez por isso seja o certo, por Simão Santana

(Artigo da autoria do Sócio Simão Santana)


Escrevo esta crónica a cinco dias da decisão do sucesso ou insucesso da época e por isso mantenho esta reflexão livre de condicionamentos momentâneos. É uma condição importante para atestar da nossa coerência - e sabemos bem que, no futebol ,a coerência muitas vezes depende de uma bola ao poste ou de um golo inesperado.

 Olhando já para o dia seguinte ao derby de sábado, e independentemente do que vier a acontecer, devo dizer que o trabalho realizado por Bruno Lage e pela atual equipa técnica do Benfica merece a minha avaliação positiva. Bruno Lage tem sido - convém dizê-lo claramente - um treinador com pouca sorte - e isto não serve de desculpa antecipada para insucessos. Na realidade, com a exceção do Wolves, nunca teve uma época inteira para construir e concluir um projeto. Nem mesmo no Benfica, na sua primeira passagem, onde saiu antes da época terminar - e quem sabe vencer a Taça de Portugal, se lhe tivessem dado essa oportunidade.

Essa instabilidade pode parecer um pormenor, mas não é. Sobretudo quando nos lembramos que, anos antes, o Benfica segurou Jorge Jesus após três temporadas sem vencer o campeonato. E fê-lo bem - porque o sucesso estava à vista. Chegou em 2013/2014, com um triplete inesquecível e presenças consecutivas em finais Europeias. Bruno Lage regressou ao Benfica com o mesmo cenário que encontrou em janeiro de 2019: uma equipa sem alma, sem identidade, sem chama competitiva. Nos três meses seguintes focou o seu trabalho na reconquista dos adeptos e dos próprios jogadores. O seu discurso e atitude puxaram a equipa para cima e quando finalmente alcançámos a liderança, tornou-se evidente que a equipa ainda estava frágil para ser capaz de assumir e manter a liderança do campeonato. Muitos viram nas derrotas com o Braga e com o Sporting as “machadadas finais” nas aspirações da temporada. Mas Bruno Lage não. E menos de um mês depois vencíamos esses mesmos adversários, com nota distintiva e levantávamos o primeiro troféu da época - a Taça da Liga. Foi aqui que Lage demonstrou uma qualidade essencial no desporto de alta competição e na vida profissional: a resiliência. Perdeu, caiu - mas não desistiu.

Na Europa, é verdade que houve jogos em casa abaixo do exigido, como o empate com o Bolonha. Ainda assim, o Benfica foi capaz de competir com os melhores — e sinceramente, não vi muitas equipas a conseguirem o que nós conseguimos frente ao incrível Barcelona. Talvez com mais tempo e estabilidade, Bruno Lage pudesse ter ganho pelo menos um desses três confrontos com os catalães.

E cá estamos nós em maio, como sonhamos a cada época: a disputar o campeonato, a depender apenas de nós para o vencer, e ainda com a possibilidade real de conquistar um triplete — 11 anos depois do último.

Bruno Lage é o melhor treinador que passou pelo Benfica? Provavelmente não. Mas é, sem dúvida, um dos nossos. Sente o clube como nós, vive-o como qualquer benfiquista apaixonado.

Em 2015, defendi que o clube devia manter Jorge Jesus a todo o custo (e fui contra o seu regresso em 2020 pelas razões que explico aqui). O Benfica precisava de uma linha desportiva estável, especialmente no desenvolvimento da academia. Um modelo de jogo que fosse ensinado desde os escalões de base até à equipa principal. Uma identidade tática “à Benfica”, que resistisse às trocas de treinador.

Na altura, esse projeto ainda não existia. Mas em 2025 temos, finalmente, a oportunidade de o construir. Com Bruno Lage, com contratações que sirvam este modelo e com aposta firme na formação.

Mesmo que sábado fiquemos afastados do título, mesmo que a Taça de Portugal escape no dia 25, para mim o essencial está claro: o futuro passa por manter este rumo. Trocar de treinador só servirá para adiar o inevitável: sem uma estratégia desportiva clara e contínua, não se constrói nada.

 

Rumo a tudo.

Viva o Benfica.

Simão Santana

Sócio n.º 23.549/1