Geração Z em modo slow: um novo consumo com propósito
Opinião de Mariana Santos, Marketing & Strategy Manager e formadora em marketing digital e estratégia.


Texto de Mariana Santos, Marketing & Strategy Manager e formadora em marketing digital e estratégia.
Durante anos, associámos juventude a rebeldia, noites longas e uma certa dose de excessos. Hoje, o paradigma está a mudar e a transformação está a ser liderada por uma geração inesperadamente consciente: a Geração Z. Nascidos entre meados dos anos 90 e o início da década de 2010, estes jovens estão a reposicionar o bem-estar no centro das suas vidas. E com isso, estão também a reescrever as regras do consumo e do papel que as marcas devem desempenhar nas suas rotinas.
Se, outrora, a produtividade incessante era o grande símbolo de sucesso, hoje, o novo luxo é desacelerar. A Geração Z cresceu num contexto de crise climática, instabilidade económica e excesso de estímulos digitais. Resultado? Um constante estado de cansaço: físico, mental e emocional. Este esgotamento coletivo gerou um novo tipo de aspiração: viver com mais equilíbrio.
Os novos rituais de equilíbrio da Geração Z: a prioridade do bem-estar
Segundo o relatório “The Future 100”, da Wunderman Thompson, esta geração procura cada vez mais experiências sensoriais, slow living e micro-rituais de autocuidado. Surgem, assim, tendências como as soft mornings: manhãs calmas com rituais lentos, onde o skincare, um chá quente ou um momento de journaling se tornam protagonistas. As apps de meditação, como a Calm, Headspace ou a mais recente Balance, lideram o ranking de saúde mental nas app stores nos EUA e Reino Unido, refletindo uma procura crescente por pausas digitais e bem-estar emocional.
Também nas redes sociais, o outrora conteúdo mais performático dá, agora, lugar à estética do acolhimento – mais do que aceitável, é expectável que tudo aconteça em modo slow. O ritual tornou-se mais importante do que o produto, e o modo como consumimos mais relevante do que o que compramos – algo que as marcas não podem descurar.
É neste contexto que hábitos antes considerados de nicho ganham uma nova força. Os run clubs, por exemplo, estão a tornar-se novos espaços de socialização urbana. Em vez de noites de dança, esta geração prefere encontrar-se, agora, em plena luz do dia, colecionando kms nas sapatilhas – e com direito a DJ e copos (de smoothies) no final. Correr em grupo virou uma forma de conexão e, principalmente, de pertença. A tendência é tão visível que, segundo o “Pinterest Predicts 2024”, termos como hot girl walk e run clubs registaram um aumento de mais de 260% nas pesquisas globais, especialmente entre Gen Z e Millennials.
Outro reflexo desta mudança é a adoção de comportamentos mais conscientes: menos junk food, mais receitas plant-based; menos álcool, mais smoothies e “sobriedade intermitente”. De acordo com a NielsenIQ, 45% dos membros da Geração Z com idade legal para consumo (21 anos ou mais) afirmaram nunca ter consumido álcool e demonstram uma inclinação por bebidas com baixo teor alcoólico, sem álcool e kombuchas alcoólicas. Também segundo o mesmo estudo, a vendas de cervejas, vinhos e bebidas espirituosas não alcoólicas aumentou 35% em relação ao ano anterior.
O que significa tudo isto para as marcas?
As marcas que querem comunicar com a Geração Z precisam de entender uma verdade fundamental: já não basta vender um bom produto, é preciso vender uma boa rotina. Isto implica sair da lógica da conversão direta e começar a pensar na marca como parte do “bem-estar expandido” dos consumidores.
Esta é uma geração que cuida e que quer ser cuidada. Não admira que marcas como a Rhode Skin (Hailey Bieber), Fenty Skin (Rihanna), ou a francesa Typology, estejam a conquistar um lugar de destaque entre a Geração Z: comunicação leve, foco em rotinas simplificadas, transparência de ingredientes e rótulos minimalistas, além de uma estética visual limpa e intencional, bem alinhada com o conceito de slow beauty. Tudo pensado ao detalhe para entrar na rotina do consumidor como um pequeno respiro. Não é só sobre vender skincare; é sobre reduzir estímulos e oferecer um microambiente de autocuidado.
A campanha “You Time” (2023), da Glossier, assentou na ideia de criar espaço num mundo hiperconectado, posicionando o autocuidado não apenas como indulgência, mas como uma “forma de resistência pessoal”, nas palavras da marca, especialmente em resposta à fadiga digital.
Também no universo das bebidas, verificamos uma adaptação clara: além das já tradicionais cervejas sem álcool, vemos marcas como a Gordon’s, Martini, Beefeater ou a portuguesa Somersby a apostar na suas versões 0.0%. Marcas como a Lyre’s (bebidas espirituosas sem álcool) ou a inglesa Caleño (bebidas sem álcool inspiradas na América do Sul) apostam fortemente em eventos alcohol-free e colaborações com espaços de fitness e yoga. No TikTok, a estratégia de ambas as marcas é baseada em criadores de conteúdo focados em sobriedade consciente e rituais saudáveis de convívio, saúde mental e autocuidado.
Esta mudança implica um reshift para as marcas, que alargam os seus raios de atuação no cruzamento com novas audiências. Como não recordar a colaboração entre a marca desportiva Gymshark e a aplicação de encontros Bumble, que revelou, através de um estudo feito conjuntamente pelas duas marcas, que mais de um em cada cinco membros da Geração Z e da Geração Y praticou exercício físico num primeiro encontro. Além da muito bem conseguida campanha “For dates that workout”, a parceria incluiu marcadores de interesse como levantamento de peso, HIIT e musculação, com base nas preferências dos clientes da Gymshark, que podiam ser adicionados aos perfis do Bumble.
Em suma: menos hype, mais harmonia
Estaremos perante uma mudança estrutural ou uma tendência passageira? A Geração Z está a redefinir o que é aspiracional: não é ter mais, mas sim viver melhor. Viver bem não é um extra, mas sim um ponto de partida. Não é correr para consumir, é consumir para respirar: com consciência, tempo e propósito. E as marcas que quiserem fazer parte deste novo mundo precisam de aprender a sussurrar, onde antes gritavam.
Talvez o maior luxo desta geração seja mesmo o de querer e poder abrandar. E as marcas que compreenderem isso terão mais do que clientes: terão uma comunidade.