Entrevista: Lúcio Ribeiro fala sobre o Circuito Nova Música, Popload Festival e mais
texto de Marcelo Costa foto de Douglas Mosh Jornalista de cultura pop e curador de shows e festivais, Lúcio Ribeiro começou 2025 com um

texto de Marcelo Costa
foto de Douglas Mosh
Jornalista de cultura pop e curador de shows e festivais, Lúcio Ribeiro começou 2025 com um projeto bem legal ao lado da turma do selo +um HITS (@maisumhits), o Circuito – Nova Música, Novos Caminhos, que busca a circulação e integração de artistas e bandas da nova cena musical brasileira. Na edição piloto, organizada em janeiro, Madre, Batata Boy e Supervão tocaram em quatro cidades paulistas em quatro dias seguidos, e a experiência foi bastante elogiada: “O projeto todo é muito massa. É um acerto muito grande esse festival itinerante”, contou um empolgado Leonardo, da Supervão, em entrevista ao Scream & Yell.
“Começamos todos estranhos ali, três artistas diferentes, e no fim estava todo mundo brother”, pontua Lúcio Ribeiro na conversa abaixo, em que ele não só relembra de uma viagem que fez para conhecer a cena musical alemã em 2023, e da qual trouxe as ideias que norteariam a criação do Circuito – Nova Música, Novos Caminhos, como comenta como chegou aos nomes da primeira edição do projeto, que reunirá Jadsa, Fausto Fawcet e Maré Tardia (mais nomes locais) passando por cinco cidades (Sorocaba, Campinas, Americana, Piracicaba e São Paulo) em cinco dias, entre 17 e 21 de abril (tudo aqui).
Na conversa, além de falar do Circuito – Nova Música, Novos Caminhos, Lúcio ainda festeja a volta do Popload Festival (“A gente fez uma escalação absurdamente feliz dentro de tudo que dá pra ser feito hoje em dia”, opina), que retorna ao calendário brasileiro após dois anos ausente, conta como foi chegar ao line-up dessa edição (o festival acontece 31 de maio no Parque Ibirapuera com Norah Jones, Kim Gordon, St. Vincent, Laufey, The Lemon Twigs, Terno Rei & Samuel Rosa, Tassia Reis e Exclusive os Cabide) e revela o que anda ouvindo e assistindo.
Como surgiu a ideia do Circuito – Nova Música, Novos Caminhos? Vocês já estavam planejando isso faz tempo?
Foi o seguinte… em setembro de 2023 eu fiz uma viagem para a Alemanha pruma parada de música que um órgão do governo alemão me convidou. Aquela coisa para divulgar a nova música (do país) e tal… e eu fui para Düsseldorf, que é uma cidade bem populosa e legal, e Colônia, que é uma cidadezinha menor, mas muito fofa, perto do Rio Reno, que tem uma atividade cultural muito legal também – lá eles usam muitos imóveis da velha Alemanha, no centro da cidade, como estações de trem, e ocupam com esses projetos. A gente visitou músicos, estúdios, escritórios de festivais, e, numa dessas, em Colônia, conhecemos uma galerinha que faz um festival de médio porte meio como o Popload, até o nome tinha algo com Pop. Esse Estado, o Nordrhein-Westfalen, que foi quem me convidou para essa viagem, tem Düsseldorf, que é uma das cidades mais populosas da Alemanha, Colônia e mais 21 cidades, muitas delas vilarejos. Esse cara do festival fez uma proposta para o governo, que queria ajudar e estar junto. Ele me disse: “Fiz um projeto em que ao invés de eu fazer só o meu festival em Colônia e esperar que todo mundo – das 21 localidades – viesse para cá, eu também poderia fazer eventos menores nesses lugares, levar essas bandas para essas regiões que não têm um fluxo de bandas indo para lá, tanto gringas quanto nacionais. Eu queria muito trabalhar essa descentralização, porque essas cenas são legais, tem uma molecada boa lá”.
E eu sempre pensei que, dentro do desenvolvimento de cena da música brasileira, precisa ter as turnês! Uma banda precisa ter a coisa do ‘on the road’, de entrar numa van e sair tocando por aí. E eu lembro que a única coisa mais perto que eu achava disso era, sei lá, quando a banda ia para o Festival Bananada (em Goiânia) e depois ia tocar em Brasília, Uberaba e Uberlândia. Você conseguia, como banda independente, fazer quatro shows numa tacada só, aproveitando de um convite de algum festival, porque era muito foda você sair daqui – e ainda é até hoje! E quando eu vi isso lá em Colônia, pensei: “É isso o que a gente precisava, alguma iniciativa dessas”. Aí corta, eu voltei da viagem, e quando cheguei aqui, fui procurado por essa galera do interior, da +um HITS, que estava querendo entrar nesse rolê da música, e me chamou para pensar algo com eles. Eles têm a gravadora, três bandas, e me disseram que a cena do interior estava muito legal – e estava mesmo! Eu já pirava na cena do interior de São Paulo, que é um lugar super rico, com uma galera forte, e sempre pinta uma bandinha daqui ou dali, que é do interior, e essas cenas não estão representadas (ou tem que acabar vindo pra São Paulo). Então, falei pra eles: “Já que vocês são do interior, que tal a gente fazer mais ou menos isso e aquilo”, já desenhando o Circuito, que ainda não tinha esse nome nem essa pegada de nova música, novos caminhos, mas fomos ajustando, ajustando, ajustando, até chegarmos nesse formato. O Gustavo Barba, que é de Americana, e o José Guilherme, que também é de Americana, que foi quem me procurou para tentar fazer alguma coisa diferente na música, abraçaram a ideia logo no começo e estamos todos juntos agora.
Qual o seu balanço da primeira edição? Como foi acompanhar essa turma – Madre, Batata Boy (feat. Luiza de Alexandre) e Supervão – tocando em várias cidades por dias seguidos?
Nessa conversa com o Gustavo e o José Guilherme, eu falei para eles que até para a gente conseguir apoio, conseguir uma possível marca que patrocine, conseguir expandir o Circuito, porque a nossa ideia é ir para outros lugares, é fazer outras regiões, virar um negócio que ajude a cena brasileira a ter essas turnês, a gente precisava existir. Projeto legal todo mundo tem, ideia boa todo mundo tem, mas a gente precisa saber as dificuldades, precisa estar na rua para entender, a gente precisava existir. Então a gente fez o primeiro, que a gente chama de Zero Zero, exatamente para existir, e existimos, e rolou legal pra cacete, rolou bacana, porque o Circuito é muito mais do que só a banda e só o palco, faz o show e acabou… Tem todo um entorno que você agrega, de como você está ajudando a cena, de como você está integrando elementos, jornalistas para o seu rolê, caras de arte para o seu rolê, caras de rádio, que me procuraram… Não é só a banda e não é só o palco! A ideia é exatamente gestar toda uma cultura em torno disso. Por exemplo, quando a gente vai fazer o Circuito no Bar do Zé, em Campinas, o Bar do Zé tem uma puta história de 30 anos, a gente tem que contar essa história, e não só, tem que contar a história da galera que vai junto, dos jornalistas, dos admiradores, do cara que é fotógrafo e quer fazer fotos, da integração entre os artistas que estão no Circuito, que eu acho que é importante para cacete! Só para você ter uma ideia, o Circuito 00 começou no Bar Alto, em São Paulo, e marcamos ao meio-dia de se encontrar no dia seguinte e ir para Sorocaba. Até então eram três bandas, artistas que não se conheciam, que não tinham cruzado caminhos, e começaram a estar juntos no rolê. No primeiro dia de viagem, já fizeram uma amizadezinha. Daí fomos para um sítio, promover essa integração mesmo, esse relacionamento de bandas com a gente, e no último dia já estavam todos muito brothers! O Supervão foi no estúdio gravar com a Madre no dia seguinte, e o Batata Boy falou que ia fazer alguma coisa com a Madre na banda que ele ia montar, sabe. Começamos todos estranhos ali, três artistas diferentes, e no fim estava todo mundo brother! Essa é a ideia que o Circuito também pode gerar além de banda e palco.
De 17 a 21 de abril começa uma nova etapa do Circuito. Como foi para chegar nesses nomes: Jadsa, Fausto Fawcett e Maré Tardia?
A gente vai meio trombando no caminho. Eu comecei pensando assim: a gente tem três bandas viajando, quem que seria legal estar junto? Quem está fazendo alguma coisa relevante agora ou vai fazer em breve, tem uma diversidade legal, sonora? Para essa edição 01, a primeira ideia que eu tive foi chamar a Maré Tardia, que conheci num evento (o Formemus) no Espírito Santo, de onde eles são, e achei legal. Fiz uma amizade com o Gustavo (guitarra e voz), e ele começou, por conta dele, a ficar me mandando demo, um material bem cru, e eu fui curtindo, achei com muito potencial – o disco deles, ““Sem Diversão Pra Mim”, vai sair agora dia 30 de abril pela Deck. Depois, fui em um evento com bandas cariocas em São Paulo, um que tocou a Vera Fischer Era Clubber, que é uma das minhas novas obsessões, e o Fausto Fawcett ia fechar essa noite. Eu tinha visto ele no C6 e também no Bar Alto, mas não estava pensando na possibilidade de chamá-lo, porque o Circuito tem essa coisa de Nova Música, Novos Caminhos, e ele é um veterano da cena, só que esse show foi tão mágico e foi tão legal, que eu fiquei louco, louco, louco! Algo moderno, diferente, uma coisa meio camaleão, ele vai mudando o negócio com uma roupagem tão nova que parece uma nova música. Ele é super nova música! Então decidi chamá-lo e ele topou. Já a Jadsa, eu cruzo muito o caminho de várias bandas porque tenho muitos projetos, tem a curadoria da Latam, o Popload, que é festival, gigs e é site, tem a parceria com a Heineken, e eu amei o primeiro disco da Jadsa. Achei foda! Fui em alguns shows dela, e queria muito ter ela nesse projeto, porque além de tudo isso, ela está com disco novo. Mas tinha que ser um projeto mais enxuto, porque o Circuito são quatro shows por noite, contando as bandas locais. Tem que ser um show mais enxuto. E a Jadsa topou também. Pra mim, ficou um line-up perfeito.
De um evento para outro: mês que vem, dia 31 de maio, temos uma nova edição do Popload Festival. Como anda o coração poploader por ai? Como você vê essa edição?
O coração está bem legal! Eu acho que a gente fez uma escalação absurdamente feliz dentro de tudo que dá pra ser feito hoje em dia. O Popload Festival não aconteceu em 2023, depois em 2024 quase aconteceu, mas aí rolou aquela dificuldade, 800 festivais, disputa de line-up, de artista, de headliners, tudo embolando, embolando… A engenharia pra fazer um festival como o Popload, na T4F, que tem o festival, não é mais o esqueminha indie, o pensamento logístico é bem diferente. Dito isso, não é uma questão simples de sentar e pensar em line-up. Tem toda uma implicação administrativa pra montar um negócio que seja relevante, que seja diferente, que tenha a cara de Popload, e tenha espírito Popload. Então, quando se começou a falar no Popload, mirando 2025 – o festival não acontecia desde 2022 – a gente começou a esmiuçar, a atirar num lugar e acertar em outro, e o line-up foi se formando, formando, formando, e a gente acertou muito. Se você começa a pensar banda por banda, tem umas ali que não tem muito a cara Popload, mas que no pôster faz total sentido. Pelo momento, pela fase da Popload, pelo jeito da Popload de pensar as coisas, eu acho que é uma escalação absurda de legal. Por isso, o coração está batendo forte e feliz por, primeiro, ter Popload Festival. E segundo por saber que a gente já vai ter o de 2026… “pé de pato mangalou três vezes”, mas acho que vai rolar mesmo. Enfim, já estou feliz pelo line-up dessa edição 2025 e simplesmente pelo Popload Festival existir.
Saindo um pouco dos eventos, o que anda rolando no som de Lúcio Ribeiro? O que está difícil para de ouvir?
Eu tenho um jeito meio pulverizado de ouvir as coisas, então eu nunca ouço muito uma coisa só, mas se for para citar nomes do que eu tenho ouvido ultimamente hoje – e com certeza amanhã eu vou mudar ou vou lembrar de outra coisa – eu tenho ouvido muito Terno Rei, e eu acho que um momento interessante de entender o Terno Rei, não pelas músicas em si, mas pela banda, pela história que eles construíram, o caminho que eles estão chegando nesse disco… isso é uma das coisas que eu mais gosto em crítica musical, muito menos a opinião se a música é boa ou se a faixa 3 é legal, a faixa 4 é interessante e a faixa 5 representa o retrocesso, isso para mim tudo é bullshit. (Me interessa) Localizar o lançamento dentro da cena em que ele está sendo lançado, entender um pouco historicamente, muito mais do que dar a minha opinião se a música é boa ou não. E, dito isso, eu acho interessante esse novo disco do Terno Rei. Com esse mesmíssimo ângulo, estou ouvindo o novo das Wet Leg, que vai sair em julho… Aconteceu uma coisa legal vendo o Coachella, por exemplo. Duas coisas legais na verdade. Primeiro o show da Charli XCX, que eu adoro, adoro o disco dela, o “Brat”, tudo o que deriva do “Brat” como instituição cultural, acho bizarro e engraçado. E o The Dare, que é amigo da Charli XCX, e tocou no Coachella. Achei o show espetacular e fui ouvir o álbum… de novo.
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.