Cadeia de suprimentos de tênis esportivos vira ponto sensível na guerra tarifária de Trump
O Vomero 18, novo tênis de corrida lançado pela Nike, pode ser encontrado nas lojas dos Estados Unidos com solado espesso, etiqueta de US$ 150 e uma pequena inscrição na língua do calçado: “Feito no Vietnã”. Este último detalhe tornou-se um problema para os planos de recuperação da empresa, agora sob o comando do CEO […] O post Cadeia de suprimentos de tênis esportivos vira ponto sensível na guerra tarifária de Trump apareceu primeiro em O Cafezinho.

O Vomero 18, novo tênis de corrida lançado pela Nike, pode ser encontrado nas lojas dos Estados Unidos com solado espesso, etiqueta de US$ 150 e uma pequena inscrição na língua do calçado: “Feito no Vietnã”. Este último detalhe tornou-se um problema para os planos de recuperação da empresa, agora sob o comando do CEO Elliott Hill. O modelo foi criado para reconquistar o público que migrou para marcas concorrentes, mas a escolha do Vietnã como base de produção coloca a Nike no centro da mais recente rodada de tarifas punitivas anunciadas pelo presidente Donald Trump.
Trump afirma que quer trazer de volta a produção para o território americano. No entanto, analistas apontam que o resultado mais imediato será o aumento dos preços ao consumidor, já que os Estados Unidos não possuem fábricas equipadas com a tecnologia necessária nem trabalhadores treinados para a produção especializada de calçados esportivos.
A Nike iniciou suas operações no Vietnã em 1995, por meio de cinco fábricas contratadas, sendo uma das primeiras multinacionais a investir no país e contribuindo para o crescimento de sua economia e exportações. Nos anos seguintes, a empresa expandiu rapidamente sua rede de fornecedores, atraída pela mão de obra mais barata.
Atualmente, a Nike conta com 130 fábricas fornecedoras no Vietnã, responsáveis pela produção de calçados, vestuário e equipamentos. O país responde por metade da produção global de calçados da marca. A Adidas, concorrente alemã da Nike, obtém 39% de sua produção de calçados da mesma região do Sudeste Asiático.
A nova tarifa de Trump, de 46%, incidirá sobre os produtos vietnamitas, somando-se aos 20% já aplicados sobre calçados esportivos com cabedais têxteis, de acordo com a Associação Americana de Vestuário e Calçados. A mudança ameaça toda a estrutura de fornecimento da indústria.
Especialistas dizem que, embora seja possível mudar as fábricas para outros países, relocalizar cadeias de produção de calçados pode levar até dois anos. Chris Rogers, chefe de pesquisa de cadeias produtivas da S&P Global Market Intelligence, afirma que empresas costumam planejar tais mudanças em ciclos de cinco anos.
Adam Cochrane, analista do Deutsche Bank, indica que países como México, Brasil, Turquia e Egito poderiam se tornar alternativas ao Vietnã. No entanto, contratos de fornecimento de longo prazo dificultam alterações imediatas. Qualquer mudança significativa levaria de 18 a 24 meses para se concretizar.
Além disso, as chamadas tarifas de reciprocidade de Trump, com taxa mínima de 10%, foram impostas a praticamente todos os parceiros comerciais dos EUA. Para centros produtores como China e Indonésia, os novos encargos são mais de três vezes maiores.
“Encontrar um mercado mais barato sem sair do planeta vai ser difícil”, disse David Marcotte, vice-presidente sênior de varejo da consultoria Kantar.
A Nike não respondeu aos pedidos de comentário. Em relatório trimestral divulgado na quinta-feira, a empresa afirmou: “Estamos enfrentando vários fatores externos que geram incerteza e volatilidade no ambiente operacional, incluindo dinâmicas geopolíticas, novas tarifas, regulamentações fiscais e variações cambiais”.
A nomeação de Hill como CEO no ano passado ocorreu após uma queda nas vendas da Nike, causada pela ascensão de concorrentes como On e Hoka, que ganharam fatia de mercado. Nesta semana, as ações da Nike caíram para o menor valor em quase oito anos, refletindo o temor dos investidores diante dos custos adicionais impostos pelas novas tarifas.
Para marcas de calçados, há basicamente três opções para lidar com o aumento de custos, segundo Dylan Carden, analista da William Blair: tentar negociar com fornecedores para reduzir preços, repassar os custos aos consumidores ou absorver o prejuízo.
Cochrane estima que Adidas e Puma, também alemãs e com forte presença produtiva no Vietnã, terão que aumentar os preços em cerca de 20% nos Estados Unidos para manter suas margens de lucro. No entanto, as empresas podem distribuir esse aumento gradualmente para minimizar perdas de mercado.
Adidas estaria melhor posicionada para lidar com a situação, segundo Felix Dennl, analista do banco Metzler, graças à força de sua marca tanto nos segmentos de estilo de vida quanto de performance. Já a Puma teria mais dificuldade em repassar os custos, pois seus esforços para se reposicionar como marca premium não decolaram, um dos fatores que levaram à substituição do CEO Arne Freundt na quinta-feira.
Com o cenário atual, fabricantes devem revisar seu portfólio de produtos nos Estados Unidos, eliminando os itens menos lucrativos, avalia Dennl. A Adidas optou por não comentar. A Puma declarou ter uma “estratégia de múltiplas origens” e que muitos dos seus fornecedores têm capacidade de produção em diversos países.
O Vietnã recebeu uma nova onda de investimentos industriais durante o primeiro mandato de Trump, quando o republicano iniciou uma guerra comercial com a China que levou empresas a transferirem sua produção para fora do território chinês. No Vietnã, os fornecedores da indústria de calçados incluem empresas locais, coreanas e taiwanesas.
Esse movimento resultou em um superávit comercial do Vietnã com os EUA de US$ 123,5 bilhões no ano passado, o terceiro maior, atrás apenas de China e México. A Casa Branca usou esses dados de balança comercial para definir as tarifas “recíprocas”.
Cochrane, do Deutsche Bank, afirmou que as marcas de calçados podem ter de reduzir pedidos e redirecionar seus produtos para regiões como Europa, Oriente Médio e China, o que poderá aumentar a competição nesses mercados.
Nos Estados Unidos, onde 99% dos calçados são importados, Carden alerta que o mercado pode se transformar, lembrando o passado soviético: “Estamos atrás da Cortina de Ferro”, disse, referindo-se ao tempo em que russos pagavam preços altos por jeans Levi’s trazidos do exterior.
Autores: Gregory Meyer (Nova York), A. Anantha Lakshmi (Jacarta) e Florian Müller (Frankfurt)
Data de publicação: 6 de abril de 2025
Fonte: Financial Times
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