Uma escritora é internada

Na tarde de 20 de outubro de 2019, um domingo, a escritora Helena Lahis foi levada do apartamento onde morava até uma clínica psiquiátrica no Rio de Janeiro. Uma psiquiatra amiga da família entrou em seu quarto junto com dois enfermeiros, informou que ela apresentava sinais de transtorno mental e seria conduzida a uma ambulância. Lahis achou que, se conseguisse manter certa calma, resolveria a situação rapidamente. Quando chegou à clínica Espaço Clif, foi atendida por um residente em psiquiatria. Ficou nua, agachou três vezes, soprou um bafômetro, teve seus cabelos revistados, a bolsa retirada. Foi internada, com hipótese diagnóstica de hipomania (cujos sintomas são autoestima excessivamente elevada, agitação, aumento exacerbado de energia, de produtividade e de libido). The post Uma escritora é internada first appeared on revista piauí.

Abr 7, 2025 - 14:00
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Uma escritora é internada

Na tarde de 20 de outubro de 2019, um domingo, a escritora Helena Lahis foi levada do apartamento onde morava até uma clínica psiquiátrica no Rio de Janeiro. Uma psiquiatra amiga da família entrou em seu quarto junto com dois enfermeiros, informou que ela apresentava sinais de transtorno mental e seria conduzida a uma ambulância. Lahis achou que, se conseguisse manter certa calma, resolveria a situação rapidamente.

Quando chegou à clínica Espaço Clif, foi atendida por um residente em psiquiatria. Ficou nua, agachou três vezes, soprou um bafômetro, teve seus cabelos revistados, a bolsa retirada. Foi internada, com hipótese diagnóstica de hipomania (cujos sintomas são autoestima excessivamente elevada, agitação, aumento exacerbado de energia, de produtividade e de libido).

A internação involuntária foi feita com a participação de seu ex-marido, Paulo Henrique de Lima, presidente da Universal Music Brasil, de quem ela estava em processo de separação. Ele afirmou a amigos que Lahis havia sido vítima de um “trabalho espiritual” e que estava fora de si. O psicanalista que acompanhava a escritora na época – que também é psiquiatra – foi contrário e disse que sua paciente não tinha qualquer sinal de transtorno psiquiátrico. Mas um terceiro psiquiatra, contratado para acompanhá-la, resolveu mantê-la na clínica.

 

Lahis ficou 21 dias na Espaço Clif. Foi libertada com ajuda da mãe de uma adolescente também internada, que levou uma carta ao novo namorado da escritora. Em 10 de novembro, também um domingo, a Justiça expediu um habeas corpus pedindo a sua imediata liberação. No dia seguinte, ela foi a uma delegacia denunciar todos os envolvidos em sua internação involuntária.

Quando foi retirada do apartamento em que mo­rava com a família, percebeu que estava numa situação sem volta. “Ali, dentro da ambulância, eu já pensei: ‘Agora eu ganhei um carimbo. Isso não podia ter acontecido, isso é desu­mano e isso não pode ficar assim’”, ela contou a Angélica Santa Cruz na edição deste mês da piauí.

Cinco anos depois, a internação virou uma terra ar­rasada de contenciosos. Entre eles, há um processo penal, um cível e investigações sigilosas no Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro. Ao final da leitura de 4 317 páginas dos processos principais, aparece uma penosa cronologia.

 

O ex-marido falava em interná-la pelo menos um dia antes de procurar uma opinião médica e usava, como indicação de que o comportamento dela havia mudado, uma troca de mensagens privadas que encontrou entre ela e seu novo namorado — mas diz que só seguiu orientações dos psiquiatras. Os psiquiatras envolvidos no episódio dão voltas em torno da complexidade do diagnóstico de hipomania. No final, ninguém se responsabiliza pela internação involuntária que deixou consequências devastadoras na vida da escritora.

Assinantes da revista podem ler a íntegra da reportagem neste link.

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