Entrevista: O Tronxo une psicodelia, rap e rock progressivo em EP com Fernando Catatau e Victor Xamã

Lançado no final de fevereiro, o trabalho conta com a participação de Fernando Catatau (Cidadão Instigado) e o rapper Victor Xamã contribuindo para expandir as fronteiras sonoras do grupo.

Abr 16, 2025 - 16:16
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Entrevista: O Tronxo une psicodelia, rap e rock progressivo em EP com Fernando Catatau e Victor Xamã

entrevista de Alexandre Lopes

Reinventar-se pode ser um caminho arriscado e desafiador para uma banda, mas quando o processo envolve novas colaborações, a transformação pode se tornar mais natural e até surpreendente. E foi justamente isso que o trio amazonense O Tronxo fez em seu novo EP, “Abismo” (2025). Lançado no final de fevereiro, o trabalho conta com a participação de Fernando Catatau (Cidadão Instigado) e o rapper Victor Xamã contribuindo para expandir as fronteiras sonoras do grupo.

As colaborações são um marco para a banda. Sobre a participação de Fernando Catatau, o guitarrista Rafa Borges recorda: “Aconteceu depois que estava tudo gravado, no momento em que estávamos tratando sobre a arte de capa do EP. Enviamos a faixa ‘Vértice’ sem mixagem para que ele pudesse ouvir, e  topou participar. Gravou quatro linhas de guitarra para que pudéssemos editar de acordo com o que melhor encaixasse na música”, lembra. “Fã de Cidadão Instigado há anos, não pensei que um dia o Catatau colaborasse em nosso trabalho. De fato, um marco na nossa trajetória e somos muito agradecidos por ele ter topado entrar nessa”.

Além de contribuir com as guitarras de “Vértice”, Catatau também assinou a arte de capa, ao lado de Ana Paula Ferrer, responsável pela direção de arte. Rafa explica que a ideia de convidá-lo surgiu de uma conversa com Ana. “Ela deu a ideia de entrar em contato com o Catatau, à princípio, sem tantas expectativas pois nunca haviam feito um trabalho em conjunto. Após o primeiro contato, ele foi super solícito e topou participar. Juntos, analisaram alguns desenhos que já estavam em processo de produção. No meio deles, havia um que era bem a cara d’O Tronxo, um ser torto em constante troca de informação consigo mesmo. Todos nós curtimos a ideia e assim fomos desenvolvendo juntos”.

O som do EP “Abismo” vai além das atmosferas densas e introspectivas pelas quais a banda já era conhecida. A colaboração com o rapper Victor Xamã, natural de Manaus como os integrantes do grupo, acrescenta uma nova camada ao trabalho, ao mesclar elementos do rock instrumental com o rap na faixa “Em Vós”. “Já colaborei em algumas faixas lançadas por ele, então sempre trocamos muitas figurinhas sobre música. O que era para ser somente um trecho, uma passagem da faixa, acabou se estendendo da metade até o final. Lembro que todos nós ficamos em estado de choque durante a gravação. Tinha ficado perfeito, além do que pensávamos. Victor possui uma lírica incrível e foi massa demais presenciar essa soma do nosso rock instrumental com seu flow visceral”, compartilha Rafa.

“Abismo” reúne duas faixas em 15 minutos de evolução da fusão de rock progressivo, post-rock e psicodelia que Rafa Borges (guitarra), Anastácio Júnior “AJ” (bateria) e Luiz Roberto Góes (baixo) vem explorando desde o álbum “Dança Cósmica” (2021), o EP “Devir” (2022) e o single “O Rio Que Corre ao Contrário” (2023). Agora, O Tronxo se reinventa como quarteto com a adição de Lucas Castro na segunda guitarra. Rafa fala sobre essa nova dinâmica: “Sempre fomos fãs do trabalho dele e falamos muito sobre ele participar de alguma produção d’O Tronxo. O EP de fato ficou mais imersivo com a participação do Lucas, uma mistura de feeling e técnicas musicais que fazem esse cara ser um alienígena das cordas”, explica Rafa.

Em segunda entrevista ao Scream & Yell (a primeira foi em 2022, quando foram um dos destaques do Festival Casarão, em Porto Velho), o guitarrista Rafa Borges compartilhou mais sobre o processo de criação por trás do EP e as colaborações que tornaram “Abismo” um trabalho tão especial. Ouça o EP, confira o papo na íntegra e fique ligado nas próximas apresentações da banda: 23/05 no Fffront (São Paulo/SP), 30/05 na Audio Rebel e 31/05 no Social Ramos Clube (Rio de Janeiro/RJ). Eles tocam ainda no Festival Casarão 2025: 18/6 em Porto Velho, 19/6 em Rio Branco.

O EP novo traz algumas participações: Fernando Catatau na faixa “Vértice”, Victor Xamã em “Em Vós” e guitarras extras de Lucas Castro. Como essas colaborações aconteceram? As composições foram escritas em parceria com esses convidados ou elas já estavam prontas quando eles se juntaram às gravações?
Foram três casos um pouco diferentes entre si. No caso do Catatau, a participação dele aconteceu depois que estava tudo gravado, no momento em que estávamos tratando sobre a arte de capa do EP. Enviamos a faixa “Vértice” sem mixagem para que ele pudesse ouvir, e ele topou participar. Gravou quatro linhas de guitarra, entre elas, dobras e camadas de efeitos, e nos enviou para que pudéssemos editar de acordo com o que melhor encaixasse na música. Lembro de ter recebido as linhas gravadas por ele e pensado o quão isso parecia distante de acontecer. Fãs de Cidadão Instigado há anos, não pensei que um dia o Catatau colaborasse em nosso trabalho e conseguimos, aquelas linhas inconfundíveis estavam fazendo parte do EP Abismo. De fato, um marco na nossa trajetória e somos muito agradecidos por ele ter topado entrar nessa. Já no caso do Victor Xamã, somos conterrâneos. Os laços com o Victor já vinham sendo fortalecidos por termos nos conhecidos no cenário musical. Já colaborei em algumas faixas lançadas por ele, como “Desastre” e “Contraste”, então sempre trocamos muitas figurinhas sobre música. A ideia da participação dele surgiu do Luiz Góes, baixista d’O Tronxo, durante sua chegada em São Paulo para realização de uma mini turnê e gravação de “Abismo”. Foram dois dias de gravação. Após o primeiro dia, já tínhamos as estruturas das músicas prontas, então exportamos o trecho de “Em Vós” no qual pensamos que ele entraria com seu rap. No segundo dia, o Victor chegou com uma ideia escrita, e, depois de trocar ideias com a banda, a letra ganhou mais algumas boas linhas, tudo sendo moldado naquele momento por ele. O que era para ser somente a gravação de um trecho, uma passagem da faixa, acabou se estendendo da metade até o final. Lembro que todos nós ficamos em estado de choque durante a gravação. Tinha ficado perfeito, além do que pensávamos. Victor possui uma lírica incrível e foi massa demais presenciar essa soma do nosso rock instrumental com seu flow visceral. Por fim, a participação do Lucas. Sempre fomos fãs do trabalho dele. AJ e Luiz já o conheciam há mais tempo e falavam muito sobre ele participar de alguma produção d’O Tronxo. Como atualmente mora em São Paulo (SP), participou das captações, gravando linhas adicionais de guitarra, o que acabou trazendo mais qualidade ao produto final com a utilização de efeitos e frases harmônicas. O EP Abismo de fato ficou mais imersivo com a participação do Lucas, uma mistura de feeling e técnicas musicais que fazem esse cara ser um alienígena das cordas.

O Fernando Catatau inclusive é responsável pela arte da capa, juntamente com Ana Ferrer. Como aconteceu isso?
A Ana já havia participado da direção de arte do álbum “Dança Cósmica”, nosso primeiro trabalho oficial de estúdio. Igualmente fã do Catatau e sua arte, tanto visual, como musical, já havia trocado alguma ideia com ele via redes sociais. Durante o processo de gravação de “Abismo”, desde sua concepção, eu (Rafa) e Ana já vínhamos conversando sobre quem poderia produzir a arte de capa do EP, então ela deu a ideia de entrar em contato com o Catatau, à princípio, sem tantas expectativas pois nunca haviam feito um trabalho em conjunto. Após o primeiro contato, ele foi super solícito e topou participar. Juntos, analisaram alguns desenhos que já estavam em processo de produção. No meio deles, havia um que era bem a cara d’O Tronxo, um ser torto em constante troca de informação consigo mesmo. Todos nós curtimos a ideia e assim foram desenvolvendo juntos, adicionando o nome da banda, nome do EP e finalizando com a digitalização da arte.

Lucas Castro participou das gravações do novo EP e agora também é um membro efetivo d’O Tronxo. Como vocês se conheceram e o que acham que muda na dinâmica da banda, agora contando com duas guitarras?
Como comentei anteriormente, AJ e Luiz já eram amigos do Lucas, tendo participado do mesmo projeto, a Coyotes Voadores, sempre estando no radar no quesito “amizade que destrói tudo musicalmente”, no melhor sentido, claro. De fato, com a entrada do Lucas, O Tronxo agora pode explorar novas sonoridades com dinâmicas diferentes, já que cada um tem várias influências distintas e assim podemos deixar o som mais rico, sempre focando em temas musicais que dizem sobre a essência do nosso projeto, que são sonoridades que nos fazem sentir informações do nosso interior, então vamos conseguir expressar melhor essas sensações.

Considerando que “Dança Cósmica” foi lançado em 2021 e sucedido por um single e depois EP, a banda não pensa mais em explorar o formato de álbum cheio?
Durante o lançamento de “Abismo”, pensamos muito nisso. Após esse EP, certamente virá um álbum, pelo menos é o que queremos fazer. Não sei se muitas pessoas imaginam, mas gravar um álbum de alta qualidade tem um custo bastante elevado, e, como os valores dos editais dos quais participamos após o lançamento de “Dança Cósmica” eram mais reduzidos e com menos tempo de execução até a entrega final, optamos por lançar trabalhos menores. Mas, sim, podem esperar que novas músicas já estão em processo de criação.

O Tronxo é de Manaus, mas recentemente o Rafael estava morando em São Paulo e lembro que a banda contou com participações especiais no baixo em shows por aqui. Como está funcionando o esquema de ensaios e shows dessa forma? A banda considera se mudar integralmente para São Paulo?
No momento, mudar integralmente para São Paulo não é uma realidade da banda. Porém, com um de nós na capital paulista, facilita a criação de conexões com bandas de todo o Brasil, principalmente locais, e casas de shows, abrindo espaços para que possamos expandir nosso som. Sobre a questão de criação musical, conseguimos realizar à distância, enviamos ideias uns aos outros, gravamos guias e vamos lapidando. Com a distância geográfica entre os membros nos últimos dois anos, temos nos programado para realizar shows em outras cidades e trabalhar em novas músicas. Em 2023, fizemos dois shows em São Paulo. Neste ano, o Luiz (baixista) não pôde comparecer, então Rei Baleia, amigo de Boa Vista (RR) que mora em SP, somou forças para que acontecessem as primeiras apresentações da banda na cidade. Já em 2024, Luiz compareceu, juntamente de AJ, e fizemos shows em São Paulo (SP), Goiânia (GO), Palmas (TO) – no PMW Rock Festival – e finalizamos a mini turnê em Manaus (AM). Dessa forma, pretendemos seguir, com membros fixos e força total.

Parte das músicas disponíveis da banda foram financiadas por leis de incentivo, como a Aldir Blanc e Paulo Gustavo. Como aconteceu isso e qual o conselho que vocês dariam para músicos e artistas que ainda não conseguiram acesso a esse tipo de subsídio?
Em certo momento na trajetória da banda, sentimos que precisávamos profissionalizar nosso som, e para isso, ou você investe seu próprio dinheiro ou tenta captar incentivo governamental para realizar seu objetivo, que foi o que fizemos. Em 2020, durante a pandemia, participamos do primeiro edital da vida da banda. Como a ideia de projeto musical já vinha sendo amadurecida há anos com início em 2013, neste ponto, já tínhamos embasamento o suficiente para ter mais força em editais, além de contar com portfólio de peso dos nossos integrantes que dedicaram grande parte da vida à música. Com todo o suor dessa dedicação, conseguimos aprovação no primeiro edital do qual participamos, o que de fato foi um dos passos mais importantes para nós, tendo recursos necessários para a nossa primeira produção. Portanto, o conselho que fica é de que é preciso amadurecer a ideia do seu projeto. Não espere vir um edital para organizar as informações, fortaleça a base antes. Mas, mesmo que você não tenha feito isso, é preciso tentar. Existem editais que abrem espaço para novos artistas. Mesmo que você não consiga na primeira tentativa, com certeza terá mais confiança para o próximo.

Além dos shows marcados em São Paulo e Rio de Janeiro em maio, quais os próximos planos da banda?
Após o lançamento do EP “Abismo”, pretendemos passar por algumas cidades levando nosso som instrumental. Além de São Paulo e Rio de Janeiro, também confirmamos show no Festival Casarão 2025, que foi o primeiro festival do qual participamos em nossa trajetória. Para este ano, levaremos novas músicas que lançamos desde então. E, aproveitando a reunião geográfica da banda no meio deste ano, trabalharemos em músicas novas para que o quanto antes tenhamos material suficiente para o próximo álbum. Aguardem! Em breve, compartilharemos nossa agenda de próximos shows. Quem puder, compareça pra conhecer um pouco da música produzida no Amazonas. O norte do Brasil tem muitos artistas impecáveis, que cada vez mais estão chegando aos ouvidos e olhos do resto do país.

– Alexandre Lopes (@ociocretino) é jornalista e assina o www.ociocretino.blogspot.com.br