Acordos de GNL com os EUA colocam em risco metas de energia limpa na Ásia

Países asiáticos estão reavaliando suas estratégias energéticas em meio à possibilidade de firmar acordos de fornecimento de gás natural liquefeito (GNL) com os Estados Unidos. A iniciativa visa ajustar o equilíbrio comercial com Washington diante das tarifas impostas pelo governo norte-americano, segundo analistas do setor. Japão e Coreia do Sul avaliam a participação em um […] O post Acordos de GNL com os EUA colocam em risco metas de energia limpa na Ásia apareceu primeiro em O Cafezinho.

Abr 29, 2025 - 15:03
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Acordos de GNL com os EUA colocam em risco metas de energia limpa na Ásia

Países asiáticos estão reavaliando suas estratégias energéticas em meio à possibilidade de firmar acordos de fornecimento de gás natural liquefeito (GNL) com os Estados Unidos. A iniciativa visa ajustar o equilíbrio comercial com Washington diante das tarifas impostas pelo governo norte-americano, segundo analistas do setor.

Japão e Coreia do Sul avaliam a participação em um projeto de exportação de GNL no Alasca, estimado em US$ 44 bilhões, que conta com o apoio do ex-presidente dos EUA, Donald Trump. Outras economias da região, como Bangladesh, Índia, Vietnã e Filipinas, também estão em fase de negociações com empresas norte-americanas para a aquisição de GNL.

De acordo com relatório do think tank Ember, a Ásia é a região com maior exposição global ao impacto da dependência de combustíveis fósseis. Em 2022, cerca de um quarto dos países do mundo comprometeram mais de 5% de seu Produto Interno Bruto (PIB) com importações de petróleo, gás e carvão.

A análise da Ember aponta que tecnologias como veículos elétricos, energia solar, eólica e bombas de calor poderiam reduzir em até 70% a necessidade de importação de combustíveis fósseis por países asiáticos. No entanto, o avanço dessas alternativas pode ser impactado por mudanças na política comercial norte-americana.

Sam Reynolds, pesquisador do Instituto de Economia de Energia e Análise Financeira (IEEFA), alerta para os riscos de acordos de longo prazo com fornecedores dos Estados Unidos.

“Assinar compromissos de longo prazo para comprar GNL dos EUA seria um erro custoso. Os preços do GNL dos EUA já não são competitivos com outras fontes de energia e estão ficando mais caros a cada dia”, afirmou.

Reynolds acrescenta que os custos de liquefação nos EUA estão em elevação devido às tarifas aplicadas a insumos como aço e alumínio, o que encarece os novos projetos de exportação. Além disso, os preços do gás no Henry Hub, referência global do setor, também devem registrar alta nos próximos meses.

As tarifas norte-americanas em vigor incluem 25% sobre as importações de aço e alumínio, e 10% sobre diversos produtos. Novas tarifas, anunciadas recentemente, foram temporariamente suspensas por três meses, enquanto prosseguem as negociações comerciais com países afetados, entre eles vários da Ásia.

Segundo Reynolds, contratos com fornecedores dos EUA ampliariam a exposição de países do Sul e Sudeste Asiático à volatilidade dos preços do gás e à instabilidade da política comercial dos Estados Unidos. O pesquisador observa que o alto custo do GNL compromete o desenvolvimento da infraestrutura de distribuição e dificulta o crescimento da demanda.

Em alternativa aos contratos com os EUA, analistas sugerem que os países do Sudeste Asiático invistam na diversificação de suas matrizes energéticas. A recomendação inclui o aumento da geração a partir de fontes renováveis e o uso intensivo de tecnologias limpas, como energia solar e eólica.

Muyi Yang, analista sênior da Ember, afirma que a construção de uma infraestrutura energética baseada em fontes renováveis pode funcionar como proteção contra variações de preços de commodities e riscos cambiais.

“Esta é uma oportunidade para o Sudeste Asiático subir na cadeia de valor — de ser visto principalmente como montadores de baixo custo para se tornar líder no projeto e na construção de tecnologias de energia limpa mais avançadas”, declarou.

Yang defende o investimento em pesquisa e desenvolvimento de tecnologias de alto valor agregado, o que permitiria à região ocupar posição estratégica na transição global para fontes energéticas de baixo carbono. Segundo ele, a diversificação também poderia reduzir os impactos de restrições comerciais impostas pelos EUA.

O especialista acrescenta que, mesmo diante de possíveis interrupções nas exportações para os Estados Unidos, os países do Sudeste Asiático podem reorientar sua produção de equipamentos renováveis para mercados emergentes da África, Oriente Médio e América do Sul, além de mercados desenvolvidos com menor barreira comercial.

Outro caminho citado é o fortalecimento do mercado doméstico de energia limpa. A região dispõe de recursos naturais relevantes para expansão da geração renovável, como o potencial solar e eólico da Indonésia, Vietnã e Filipinas, segundo especialistas do setor.

Tim Daiss, fundador da APAC Energy Consultancy, avalia que o uso do GNL como fonte de energia pode dificultar as metas de descarbonização.

“Não seriam apenas países como Vietnã, Filipinas e Bangladesh que enfrentariam problemas, até mesmo o caminho da Índia para zero líquido se tornaria mais complicado”, disse.

Ele aponta ainda que empresas japonesas, que já investem significativamente em gás, podem destinar volumes adicionais de GNL dos EUA para mercados asiáticos, ampliando a oferta na região.

Relatório da Ember indica que a energia renovável possui maior potencial de expansão futura do que os combustíveis fósseis.

A Agência Internacional de Energia estima que, até 2030, países emergentes e em desenvolvimento representarão 70% do mercado de energia solar, 60% da energia eólica e 60% do armazenamento em baterias.

Na Tailândia, a diretora da Climate Finance Network, Sarinee Achavanuntakul, avalia que a estratégia de tornar o país um centro de GNL no Sudeste Asiático pode atender à demanda de curto prazo, mas envolve riscos de longo prazo.

Segundo ela, a infraestrutura de GNL corre o risco de se tornar inviável diante da queda dos custos das fontes renováveis e da tendência global de descarbonização.

Achavanuntakul afirma que “quase metade dos terminais de GNL atualmente em operação e propostos no mundo podem se tornar economicamente inviáveis no longo prazo”, citando estudo do IEEFA.

Ela também alerta que o governo tailandês pode ampliar suas importações de GNL como estratégia de barganha nas negociações com os EUA, o que pode agravar os riscos associados às tarifas e comprometer a competitividade da energia no país.

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